TC declara inconstitucional lei do direito de preferência dos inquilinos
10 de jul. de 2020, 09:24
— LUSA/AO online
Segundo o acórdão a que a agência Lusa teve
acesso, os juízes do Tribunal Constitucional concluem que o regime
especial de preferência “sacrifica excessivamente o direito à livre
transmissibilidade do prédio, sem satisfazer o objetivo da estabilidade
habitacional”.“Trata-se, pois, de uma
intervenção legislativa que, nos seus efeitos restritivos ou lesivos,
não se encontra numa relação proporcional ou razoável – de justa medida –
com os fins prosseguidos”, defende.A nova
lei, que visava o “exercício efetivo do direito de preferência pelos
arrendatários na alienação do locado”, foi promulgada pelo Presidente da
República em 12 de outubro de 2018, após a apresentação de uma segunda
versão do diploma pelo parlamento, na sequência do veto presidencial da
primeira versão.No final de outubro de
2018, CDS-PP e PSD apresentaram o pedido de fiscalização sucessiva da
constitucionalidade do diploma, no caso, o n.º 8 do artigo 1091.º do
Código Civil, considerando o então líder parlamentar centrista, Nuno
Magalhães, que as normas que tinham entrado em vigor violavam
“princípios constitucionais fundamentais previstos na Constituição da
República Portuguesa”, nomeadamente o direito à propriedade privada, os
princípios da proporcionalidade e o direito à justa indemnização.Esta
norma refere que, “no caso de contrato de arrendamento para fins
habitacionais relativo a parte de prédio não constituído em propriedade
horizontal, o arrendatário tem direito de preferência nos mesmos termos
previstos para o arrendatário de fração autónoma”, a exercer em
determinadas condições.Após esta
declaração de inconstitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional
agora conhecida, o BE já anunciou, à agência Lusa, que vai voltar a
apresentar o projeto original que tinha entregado na Assembleia da
República e que desencadeou o processo legislativo, “incluindo a
referência à divisão prévia em propriedade horizontal, que acabou por
não vingar no processo parlamentar”. "Esta
é uma decisão incompreensível, porque parece sobrepor os interesses dos
proprietários, na esmagadora maioria dos casos fundos imobiliários que
promovem a especulação, ao princípio constitucional do direito à
habitação. Mas o Tribunal Constitucional dá também a entender que, se
existir a divisão prévia em propriedade horizontal, estarão
ultrapassados os problemas de constitucionalidade”, refere a deputada
bloquista Maria Manuel Rola.De acordo com a
decisão dos juízes, “a intervenção na propriedade excede a medida
constitucionalmente adequada da vinculação social”.“Chegamos
assim à conclusão, e decerto não podia ser outra, de que a
possibilidade da preferência numa quota do prédio não permite alcançar
os objetivos que estão na sua base, pois dessa forma o inquilino não
acede de imediato à propriedade da habitação, nem se consegue eliminar a
eventual especulação imobiliária”, considera o Tribunal Constitucional.Segundo
o acórdão, “a transformação do arrendatário em comproprietário pode
criar uma situação de maior ‘instabilidade habitacional’”.O
Tribunal Constitucional considera que a norma viola o artigo 62.º da
lei fundamental do país, o qual diz que “a todos é garantido o direito à
propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte”,
conjugado com o n.º 2 do artigo 18.º. Este último refere que “a lei só
pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos
expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições
limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses
constitucionalmente protegidos”.Esta
decisão do Tribunal Constitucional não foi tomada por unanimidade e teve
votos vencidos de três juízes que apresentam uma declaração de voto –
além de um quarto voto vencido de um juiz que, entretanto, cessou
funções - ficando sem efeito a lei.A
segunda versão da lei, agora declarada inconstitucional, foi aprovada em
21 de setembro de 2018 pela Assembleia da República, com votos contra
de PSD e CDS-PP e a favor de PS, BE, PCP, PEV e PAN, introduzindo as
propostas do PS e do PSD relativamente ao requisito de “local arrendado
há mais de dois anos”, para que os arrendatários possam exercer o
direito de preferência em caso de compra e venda ou dação das
habitações.