Supremo Tribunal de Justiça manda libertar ex-administrador Paulo Guichard
Caso BPP
14 de out. de 2021, 16:08
— Lusa/AO Online
"Pelo
exposto, acordam os juízes desta secção criminal do Supremo Tribunal de
Justiça em deferir a providência de 'habeas corpus' formulada por
António Paulo de Araújo Portugal Guichard Alves", lê-se na decisão
divulgada pelo Supremo Tribunal de Justiça. O
ex-administrador do BPP Paulo Guichard foi detido na quinta-feira da
semana passada no aeroporto do Porto vindo do Brasil. Desde então está
detido no estabelecimento prisional de Custóias, em Matosinhos, no
distrito do Porto.No próprio dia deu entrada na Justiça a petição de 'habeas corpus' da sua defesa, considerando que a detenção é ilegal. Segundo
o pedido de 'habeas curpus', a que a Lusa teve acesso na semana
passada, no decurso do caso do Banco Privado Português (BPP), Guichard
“viveu no Brasil sempre com o conhecimento das autoridades judiciárias",
que foram "sempre informadas do seu paradeiro”.Já
após se conhecer a fuga de João Rendeiro (outro arguido do caso BPP), e
perante a ordem da juíza titular do processo para Guichard se
apresentar em tribunal, disse a defesa que o antigo administrador
“decidiu regressar a Portugal” e que isso mesmo anunciou.Considerou
a defesa que "a decisão condenatória que impôs ao requerente esta pena
privativa não transitou em julgado, motivo pelo qual a privação da
liberdade a que o requerente se encontra neste momento sujeito é
manifestamente ilegal”, pelo que pedia a "imediata" libertação. Em
causa estão os recursos de Guichard alegando dupla condenação (na parte
da contraordenação e na parte criminal), estando de momento pendente um
recurso de constitucionalidade da decisão condenatória no Tribunal
Constitucional. Hoje, na audição sobre o
'habeas corpus' no Supremo Tribunal de Justiça, o advogado de Guichard,
Nuno Brandão, defendeu que a "prisão é manifestamente ilegal", por estar
"pendente um recurso para o Tribunal Constitucional e de acordo com a
Constituição um arguido presume-se inocente até a decisão se tornar
definitiva", segundo declarações prestadas à Lusa. Assim, havendo ainda um recurso que será apreciado não pode Paulo Guichard ser detido, acrescentou.Nuno
Brandão afirmou também que a decisão do Supremo Tribunal de Justiça
"tem uma importância que transcende este arguido", pois terá um caráter
referencial para o futuro.Segundo o
advogado, em casos semelhantes no passado, o Supremo entendeu que
havendo recurso para o Constitucional ainda não decidido que não há
trânsito em julgado da pena, pelo que, caso decidisse diferente tal iria
"dar sinal a todos os tribunais de que a jurisprudência mudou".A
decisão do Supremo Tribunal de Justiça, hoje divulgada, diz que neste
processo "tudo está em saber quando transita ou se transitou em julgado a
decisão condenatória do arguido/requerente do 'habeas corpus'" e que "o
trânsito em julgado das decisões penais condenatórias apenas tem lugar
quando as mesmas já não são passíveis de recurso ordinário ou de
reclamação", sendo que sem isso a "prisão é ilegal".Neste
caso concreto, afirma o Supremo, "ainda está pendente a reclamação para
o Tribunal Constitucional", ou seja, "o requerente foi preso em
cumprimento de pena, tendo ainda pendente uma reclamação para o Tribunal
Constitucional" respeitante a um recurso para o que ainda não foi
decidido."Enquanto estiver pendente
recurso ou reclamação da decisão penal condenatória, esta não se pode
considerar transitada", pelo que a "prisão do peticionante foi ordenada
no âmbito de uma decisão que não era ainda exequível", tratando-se por
isso de uma "prisão ilegal", referem os juízes Maria do Carlos Silva
Dias, Cid Geraldo e António Clemente Lima.Guichard,
com 61 anos, de nacionalidade portuguesa e que vivia há vários anos no
Rio de janeiro (Brasil), foi condenado a uma pena única de quatro anos e
oito meses de prisão efetiva pela prática de seis crimes de falsidade
informática e um crime de falsificação de boletins, atas ou documentos. O
colapso do BPP, banco vocacionado para a gestão de fortunas,
verificou-se em 2010, já depois do caso BPN e antecedendo outros
escândalos na banca portuguesa.O BPP
originou vários processos judiciais, envolvendo crimes de burla
qualificada, falsificação de documentos e falsidade informática. Entre
os condenados em processos relacionados com o BPP estão os
ex-administradores Paulo Guichard, Salvador Fezas Vital, Fernando Lima e
João Rendeiro, que fugiu para o estrangeiro e está em paradeiro
incerto. Guichard, Fezas Vital e Fernando Lima expressaram publicamente repúdio pela fuga de João Rendeiro à Justiça.