Sujeitar presidente de Figueiró dos Vinhos a julgamento foi “penosidade imerecida”
Pedrógão Grande
26 de mai. de 2022, 11:19
— Lusa/AO Online
“A
presença neste julgamento do arguido Jorge Abreu [presidente da Câmara],
em infindáveis sessões que correram em período quase semanal,
diariamente, durante interruptos 12 meses, constituiu, só por si, a sua
sujeição a uma penosidade imerecida, arguido que demonstrou possuir uma
especial sensibilidade no cuidado a ter com a floresta e prevenção do
fogo”, afirmou o advogado Ferreira da Silva, nas alegações finais do
julgamento que hoje continuam no Tribunal Judicial de Leiria.Jorge
Abreu foi acusado e pronunciado por dois crimes de homicídio e um de
ofensa à integridade física grave, todos por negligência.Ao
arguido, enquanto responsável pela gestão da via onde se registaram
duas mortes e um ferido, são imputadas responsabilidades por não ter
procedido, “por si ou por intermédio de outrem, ao corte/decote das
árvores e vegetação existentes nos terrenos” que a ladeava, “em
conformidade com o legalmente estipulado”, omitindo os procedimentos
elementares necessários à criação/manutenção da faixa de gestão de
combustível naquela via”.Em sede de
alegações finais, o Ministério Público pediu a absolvição do autarca,
considerando que “não foi a falta de gestão de combustíveis que
determinou a morte destas vítimas”, porquanto “as chamas não as
atingiram”.O advogado Ferreira da Silva
salientou que “os elementos e factos objetivos constantes do inquérito
apontavam já para que o arguido Jorge Abreu não fosse acusado e muito
menos pronunciado”.Explicando como estavam
as imediações da Estrada Municipal (EM) 521 (campo agrícola cultivado e
verde e do outro lado talude superior xistoso) onde as vítimas, que
morreram de intoxicação por monóxido de carbono associada à inalação de
gases quentes, foram encontradas, e a viatura em que se fizeram
transportar (não sofreu ação direta do fogo), o causídico frisou que
“não houve ali fogo, incêndio ou chamas”.Ferreira
da Silva frisou que “não se provou” que o arguido não tenha
providenciado pela criação e manutenção da faixa de gestão de
combustível na EM 521, esclarecendo que o concelho tinha Plano Municipal
de Defesa da Floresta contra Incêndios, aprovado em fevereiro de 2016,
que estava em execução e “tinha a previsão de criação e manutenção da
faixa de gestão de combustível nessa via apenas para o ano de 2019”.Depois,
lembrou que a atividade de um presidente de Câmara não é “livre,
discricionária”, mas “está vinculada ao cumprimento da lei”.Por
isso, Jorge Abreu “não podia sequer” ir para além, “no que respeita à
criação e manutenção da faixa de gestão de combustível do que lhe foi
estipulado” pela Câmara e pela Assembleia Municipal, “no cumprimento do
Plano de Defesa da Floresta que tinha sido aprovado” e no cumprimento do
Orçamento e Plano de Atividades.“O
arguido só podia ser responsabilizado criminalmente se, razoavelmente,
lhe pudesse ser exigido outro comportamento, o que, como se demonstrou
no presente caso, não acontece”, declarou.Rejeitando
a existência de nexo de causalidade entre os fogos de Pedrógão Grande
em junho de 2017 e a morte de duas pessoas e ofensas corporais noutra em
Figueiró dos Vinhos, Ferreira da Silva sustentou que se impõe a
absolvição do autarca, como pedido pelo MP, sendo que sem
responsabilidade criminal também não pode ser responsabilizado
civilmente, pelo que “devem também os pedidos de indemnização cíveis
contra si deduzidos serem julgados totalmente improcedentes”.Em
causa neste julgamento estão crimes de homicídio por negligência e
ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves. No
processo, o Ministério Público contabilizou 63 mortos e 44 feridos
quiseram procedimento criminal.