Sindicato dos inspetores do SEF diz que Marcelo "extrapolou competências"
14 de dez. de 2020, 17:43
— Lusa/AO Online
Em conferência de
imprensa, o presidente do Sindicato da Carreira de Investigação e
Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SCIF/SEF), Acácio
Pereira, disse pretender “deixar claro, bem claro, que o episódio
sinistro que levou à morte de um cidadão [ucraniano] no aeroporto de
Lisboa – assim como outros casos de abuso de poder que possam ter
existido – são, em todo o caso, exceções ínfimas no trabalho global do
SEF e dos seus inspetores”.“Dizer isto não
é minimizar nem retirar gravidade ao que se passou!”, enfatizou Acácio
Pereira, acrescentando: “Pelo contrário! Estamos aqui a reafirmar, olhos
nos olhos, que é grave e que não pode voltar a acontecer!” Nas
suas palavras, o que o sindicato dos inspetores do SEF está a afirmar e
garantir aos portugueses “é que não se trata de qualquer problema
sistémico – para utilizar a expressão do Senhor Presidente da República –
mas sim de casos isolados!”“Perante estes
casos isolados, o que é imprescindível é que a Direção Nacional [do
SEF] promova as ações necessárias para que factos idênticos nunca mais
voltem a ocorrer”, vincou. Segundo Acácio
Pereira, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ao falar
sobre o SEF, a sua reestruturação e da eventual existência de um
problema sistémico naquele órgão de polícia criminal “extrapolou as suas
competências”, justificando que talvez tenha sido por causa da questão
eleitoral, mas que o SEF e os seus inspetores merecem respeito.
Insistindo que o caso do ucraniano morto nas instalações do aeroporto
de Lisboa, em março, se tratou de um caso isolado numa imensidão de
milhões de diligências que o SEF realiza anualmente, o presidente do
sindicato salientou que “os problemas não se resolvem com mudanças de
ministro, mas com mudanças de atitude”.
Acácio Pereira referia-se a pedidos por parte de partidos políticos da
oposição para que o ministro que tem a tutela do SEF, Eduardo Cabrita,
se demita.“Criar instabilidade num serviço
de segurança não é ponderado, não é razoável”, disse ainda Acácio
Pereira, quando questionado se o ministro Eduardo Cabrita devia ser
afastado do cargo de ministro da Administração Interna.
O dirigente sindical revelou que não manteve qualquer contacto
recentemente com o ministro e disse desconhecer em absoluto o teor do
alegado plano de reestruturação ou eventual extinção do SEF, criticando
duramente que esta última opção possa vir a ser tomada pelo poder
político e legislativo do país. Em sua
opinião, tais questões como a reestruturação do SEF têm que ser
analisadas de forma ponderada, porque a “pressa é má conselheira” em
matérias tão delicadas e de “tanta importância”.Ainda
acerca da morte do ucraniano Ihor Homeniuk, e dos consequentes pedidos
para o afastamento do ministro da Administração Interna, o dirigente
sindical considerou que o trágico incidente ocorrido no aeroporto de
Lisboa se “transformou num caso politico”, ao responder se esta questão
está a ser também utilizada como “arma de arremesso politico”, consoante
os interesses partidários. Falando
sobre o futuro do SEF, Acácio Pereira realçou que o que “é
imprescindível” é que o Governo dote o SEF com os meios necessários para
prosseguir a sua missão e inverta a “trajetória de degradação de
condições de trabalho” que “tem marcado” este órgão de polícia criminal
nos últimos anos. Dirigindo-se diretamente
aos deputados, primeiro-ministro, ministros e ao Presidente da
República, Acácio Pereira defendeu que se deve dotar o SEF, reorganizar o
SEF”, mas “não acabar com o SEF”, “nem tirar competências” a este
serviço que em 2019 atendeu mais de 20 milhões de pessoas e tratou de
mais de 600 mil casos de cidadãos estrangeiros, num “trabalho
incomportável” para qualquer outro órgão de polícia criminal.
Assim, no entender do dirigente sindical, colocar as competências do
SEF noutras polícias – “as quais não têm nem a vocação do SEF, nem a
preparação do SEF, nem a experiência do SEF, nem as competências do SEF –
é deitar borda fora um bom serviço e complicar, e muito, a vida às
outras forças e serviços de segurança”. A
este propósito, alegou ainda : “Não há nenhuma outra polícia – à exceção
talvez da Polícia Judiciária – que tenha tão bons pergaminhos como o
SEF em termos de Direitos Humanos e em matéria de combate ao racismo e à
xenofobia”. Por tudo isto, Acácio Pereira
sustentou que “mutilar o SEF, partir o SEF, destruir o SEF, é estar a
destruir a única polícia portuguesa que é filha legítima da democracia”,
pois só surgiu após o 25 de Abril de 1974.
“É isto que os deputados têm de ter em conta. É isto que o Governo tem
de ter em conta. É isto que o Presidente da República tem de ter em
conta. Há, seguramente, problemas no SEF que têm de ser resolvidos, mas
não é estragando ou destruindo o que de melhor se construiu em Portugal
em termos de segurança depois do 25 de Abril que irá resolver seja o que
for”, concluiu.O SEF tornou-se notícia
quando, em 12 de março, o cidadão ucraniano Ihor Homeniuk morreu nas
instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no aeroporto de
Lisboa.O cidadão terá sido vítima do crime
de homicídio por parte de três inspetores do SEF, já acusados pelo
Ministério Público, com a alegada cumplicidade de outros 12 inspetores. O
julgamento deste caso terá início em 20 de janeiro.Noves
meses depois do alegado homicídio, a diretora do SEF, Cristina Gatões,
demitiu-se na semana passada, após alguns partidos da oposição terem
exigido consequências políticas deste caso. Cristina Gatões tinha dito
em novembro que a morte do ucraniano foi o resultado de "uma situação de
tortura evidente".