Sem testagem sistemática é “muito mais difícil” monitorizar
Covid-19
20 de out. de 2022, 16:33
— Lusa/AO Online
“Não
fazendo uma testagem sistemática é muito mais difícil acompanhar de
forma realista o que se passa em termos de contágios”, disse à agência
Lusa o investigador Miguel Castanho, do Instituto de Medicina Molecular
(iMM) da Universidade de Lisboa.Segundo
disse, com a redução dos testes, “só se toma conhecimento das infeções
que correspondam a casos de doença que justificaram a procura de
assistência médica”, o que faz com que deixe de ser uma amostra
representativa das infeções no país e passe a “ser algo muito específico
de um subgrupo de infetados”.“A monitorização que tinha vindo a ser seguida até aqui deixa de ser comparável com a que podemos fazer agora”, afirmou.No
final de setembro, o Governo decidiu não renovar a situação de alerta,
tendo cessado a vigência de diversas leis, decretos-leis e resoluções
aprovadas no âmbito da pandemia, alterações que, segundo a Direção-Geral
da Saúde e o Instituto Ricardo Jorge, vão “influenciar a vigilância de
base populacional e consequente interpretação dos indicadores” da
covid-19.Na prática, além de o isolamento
ter deixado de ser obrigatório, os testes à covid-19 deixaram de ser
prescritos através do SNS24 e passaram a ser comparticipados mediante
prescrição médica, à semelhança de outras análises e meios
complementares de diagnóstico.Agora os testes à covid-19 só são comparticipados a 100% quando prescritos por uma unidade do Serviço Nacional de Saúde.De
acordo com os últimos dados divulgados na sexta-feira, verificou-se uma
nova redução do número de testes efetuados nas últimas semanas, que
passaram de 88.527 para 72.133, “devido à alteração legislativa”
efetuada.Segundo Miguel Castanho, a
redução da testagem, apesar de não comprometer a monitorização da
evolução do coronavírus SARS-CoV-2, faz com que fique “dificultada”
porque o número de amostras é mais reduzido.“A
deteção de novas variantes tende a ser mais tardia, falando de forma
probabilística”, adiantou o investigador, para quem deveria “ter sido
mantido o mesmo sistema de monitorização” para se poder “ter a
capacidade de analisar toda a evolução da pandemia, desde o início até à
certeza do seu final”.Para o professor da
Faculdade de Medicina de Lisboa, neste início do outono/inverno,
período mais favorável às infeções respiratórias, foi criada uma
“descontinuidade que não facilita a análise da evolução da pandemia”.Perante
isso, Miguel Castanho considerou importante reforçar a mensagem de que
devem ser mantidas atitudes individuais para evitar contágios, como o
isolamento em caso de doença, uso de máscara em locais fechados com
muita gente e o arejamento de espaços interiores.“Independentemente das regras, o bom senso deve falar mais alto”, alertou o especialista.Já
para Henrique Oliveira, matemático do Instituto Superior Técnico e um
dos responsáveis pelo Indicador de Avaliação da Pandemia (IAP),
elaborado em conjunto com a Ordem dos Médicos, os dados atuais da
incidência da covid-19 “são muito pouco fiáveis”.Isto
porque “a covid-19 saiu do radar e apenas quando é grave é que se
regista. A única forma fiável é seguir a mortalidade por covid”,
salientou o especialista em sistemas dinâmicos do Técnico.Os
internamentos e a mortalidade por covid-19 mantêm-se estáveis em
Portugal, indicou o relatório sobre a pandemia divulgado na sexta-feira,
mas que admite ser necessário mais tempo para avaliar a transmissão do
vírus, devido às recentes alterações nas regras da testagem.O
relatório adiantou que o número de novas infeções por 100 mil
habitantes, acumulado a sete dias, foi de 66 casos a nível nacional e o
índice de transmissibilidade (Rt) do SARS-CoV-2 estava nos 0,65 a nível
nacional, tendo baixado significativamente em todas as regiões de
Portugal continental.“No entanto, estas
variações podem não indicar um decréscimo do número de casos, dada a
alteração legislativa que implicou uma redução da testagem. Será
necessário um período de tempo mais longo para avaliar a evolução do
Rt”, reconheceram a DGS e o INSA.