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“Se nascesse de novo, seria do Bom Pastor contemplativo e estava neste Santuário”

Irmã Jacqueline Mendes. Aos 18 anos decide abraçar a Congregação das Irmãs do Bom Pastor. Esteve nos EUA, França e Canadá. Em 2019 vem para Portugal e desde 2022 que é guardiã do Santo Cristo. Diz que a sua missão é “saber escutar com os ouvidos de Deus, com o coração de Deus e com o olhar de Deus”



Autor: Susete Rodrigues

Natural de São Luís do Maranhão, nordeste do Brasil, a irmã Jacqueline Mendes cresceu num ambiente religioso, “muito próxima dos meus avós, que eram pessoas ligadas à comunidade, aos agentes pastorais daquela época”, conta-nos. Fruto do ambiente religioso em que viveu, a irmã Jacqueline Mendes sentia que tinha “que fazer alguma coisa por Deus. Isso aconteceu logo após a minha primeira comunhão. 

Depois do Crisma foi mais forte porque já tinha uma visão mais ampla da realidade social e fui entusiasmando-me e pela adoração a Deus”. No entanto, naquela altura “não sabia ainda qual era o caminho, só aos 18 anos, depois de uma caminhada vocacional, é que fui despertando, com a ajuda espiritual que era a vida religiosa”, afirmou para acrescentar que a vida religiosa tinha “outros aspetos que fui descobrindo, que era a vida da missão da igreja, que chamamos de vida contemplativa e a Congregação das Irmãs do Bom Pastor, com a dimensão contemplativa, foi a que abracei e onde estou há quase 40 anos”. 

A reação dos pais ao facto de querer seguir a vida religiosa não os surpreendeu, apenas lhe perguntaram “o porquê de estar a escolher aquela missão, mas eles compreenderam e apoiaram-me”.

Aos 18 anos entrou na Congregação das Irmãs do Bom Pastor, tem formação superior em Ciências Religiosas e Filosofia e ainda tirou “administração e gestão de pessoas e empresa já no convento”.

Mais tarde, deixa o Brasil e foi para os Estados Unidos da América “estudar línguas para então partir para uma missão. Tive de aprender francês para ir para uma missão em França e depois fui para o Canadá, onde estive sete anos. Só vim para Portugal em 2019, estive no Porto até chegar aos Açores”.

Foi no Canadá, após três anos de lá estar em missão, que a irmã Jacqueline Mendes fez “uma especialização de formação humana integral para poder ajudar um pouco mais as famílias emigrantes que acompanhava diariamente. Aqui também ajudo nesse sentido”, disse.

Foi precisamente a sua missão no Canadá que a marcou muito, porque existiam “muitas pessoas de outros países em busca de um futuro melhor e eles encontravam dificuldades com o idioma, com os documentos”. “Marcou-me muito porque era um esforço muito grande, havia famílias de três a quatro pessoas e uma pessoa que chega de um país que não fala a mesma língua é um desafio”.

Chega aos Açores em 2022, juntamente com as irmãs, Juana Salvatierra e Magdalena Pico, para serem as novas guardiãs da Imagem do Senhor Santo Cristo dos Milagres. 

Questionada se tinha algum conhecimento dos Açores antes de vir para São Miguel, a irmã Jacqueline Mendes refere que “tinha ouvido - muito vagamente - sobre as devoções das ilhas, mas não imaginava que era um arquipélago”, sublinhando que quando “cheguei aqui senti o impacto da religiosidade, a devoção das pessoas, a fé. Contagiou-me muito a devoção das pessoas, fiquei impressionada pelo amor que as pessoas têm pelo Senhor, logo a seguir foram as festas e foi muito bonito”. Diz ainda que é “uma grande responsabilidade, ser guardiã da Imagem do Senhor Santo Cristo. Digo sempre que o coração das ilhas está aqui”.

Recorda que chegaram por ocasião da pandemia, por isso, naquela altura “não havia visitas, mas disseram-nos que as pessoas vinham visitar o Senhor. Também contaram que a capa do Senhor saía do Convento quando pediam”. Depois da pandemia essas atividades foram retomadas, “as pessoas podem entrar no Convento, uma vez por dia, para irem ver bem de perto o Senhor Santo Cristo dos Milagres”.

A sua missão no Convento da Esperança não é só de olhar pela Imagem do Senhor Santo Cristo, é também “escutar as preocupações das pessoas, escutar a esperança. Isso toca a alma e o coração, estamos aqui para isso, a missão é esta. É saber escutar com os ouvidos de Deus, com o coração de Deus e com o olhar de Deus. Eu sei que não sou a salvadora, o Senhor é que salva, somos intermediárias, abrimos as portas para que as pessoas entrem no caminho espiritual e isso impacta muito”, afirmou.

Uma tradição muita antiga e que se mantém é o envio de cartas. A irmã Jacqueline Mendes refere que “continuamos a receber as cartas e muitas pessoas deixam as cartas na roda. Todas as sextas-feiras coloco as cartas - que vamos recebendo - junto da Imagem do Senhor. Esta semana, (anterior às festas) a cesta está bem cheia de intenções, de desejos e tenho o cuidado de ler cada uma das cartas”.

O que procuram as pessoas nas cartas que escrevem ao Senhor Santo Cristo ou quando visitam o convento? A irmã Jacqueline diz que “vêm em busca do sagrado, em busca de Deus, querem aliviar a sua alma, o seu espírito por conta de qualquer perturbação, seja de saúde, de relacionamento, de emprego...”. Destaca também que “nós, seres humanos, somos seres vulneráveis e precisamos de nos agarrar a alguma coisa, uns é a Deus, outros é a outras coisas que pode até ser uma flor, uma planta, mas quando nos agarramos a Deus, Ele dá-nos mais força, sentimo-nos mais estáveis, mais firmes... o ser humano é assim, somos carentes de Deus... e de certeza que estas pessoas têm muita fé, porque só vem aqui quem tem fé, mesmo os que dizem que não acreditam em Jesus Cristo, mas então porque veio? Alguma coisa lhe trouxe...”.

As festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres são vividas com muita alegria no Convento da Esperança. De acordo com a irmã Jacqueline “parece que o coração fica maior, a ilha parece que cresce, o Santo Cristo parece mais luminoso. Sinto muita alegria interior e muita paz”.

Gostaria de fazer “movimentos com jovens, uma pastoral vocacional, incutir nos jovens que Deus precisa continuar a sua missão”, disse a irmã, frisando que “preocupo-me em deixar para as novas gerações esse legado da missão contemplativa aqui no Santuário, embora já tenhamos a pastoral juvenil que trabalha muito neste sentido”.

Refere ser uma pessoa feliz e não mudava nada no seu percurso, “se nascesse de novo, seria do Bom Pastor contemplativo e estava neste Santuário. Deus sabe o que faz, quando ele chama, chama desde o ventre...”.

A finalizar a irmã Jacqueline deixa um apelo “para que as pessoas venham ao Santuário porque estamos no ano Jubilar, o ano da esperança e a esperança não dececiona”.