Relator da ONU para defensores do ambiente alerta para maiores pressões na Europa
2 de out. de 2023, 15:30
— Lusa
“Os
defensores de direitos, no seu conjunto, enfrentam uma série de grandes
desafios e riscos em muitos países, incluindo na Europa, mas aqueles
que atualmente pagam o preço mais elevado são precisamente os defensores
do ambiente e as pessoas que tentam defender as suas terras e o clima”,
afirmou Michel Frost, em entrevista à Lusa.O
mandatário da ONU, o primeiro relator do mundo a dedicar-se aos
defensores do ambiente, esteve hoje em Portugal para participar na
conferência internacional da Plataforma dos Direitos Humanos, a decorrer
na Fundação Gulbenkian, em Lisboa, e confessou à Lusa não compreender
as motivações que levam a este aumento da pressão.“Não
entendo a razão, mas o facto é que há cada vez mais políticos em mais
países a comparar pessoas que são, na verdade, manifestantes pacíficos,
com terroristas sangrentos”, adiantou, referindo ver isso “em Espanha,
nos Países Baixos, na Dinamarca, no Reino Unido, na Alemanha e na
Suíça”.A questão preocupa-o muito,
reconheceu, até porque, em vários países, estão a ser utilizadas
diferentes formas de atacar os ativistas.“Fiz
uma digressão por mais de 20 países da União Europeia (UE) para me
encontrar com ativistas e com Governos, convidando-os a descreverem a
atmosfera que enfrentam nos seus países, e posso garantir que a situação
está a ficar muito, muito, muito tensa”, avançou, lembrando que
Governos como os de França ou da Áustria classificam estes ativistas
como “eco-terroristas ou talibãs verdes”.À
Lusa, Michel Forst explicou que está a trabalhar atualmente com um
grupo de organizações não-governamentais (ONG) “para tentar compreender
melhor o que está a acontecer na Europa, com vista a orientar os
Governos da UE sobre como responder à desobediência civil”.Sublinhando
que a desobediência civil é regulada pelo direito internacional dos
direitos humanos, o responsável da ONU reconheceu ter ficado alarmado
quando se encontrou com juízes de Espanha, de França ou da Alemanha e se
apercebeu que eles “não compreendiam de todo o direito internacional
dos direitos humanos”.Os ativistas que
praticam desobediência civil “não devem ser penalizados”, mas, na
verdade, vemos que “juízes e Governos não cumprem as obrigações
internacionais”, apontou Michel Forst.Por
isso, explicou, o seu objetivo para já é fornecer documentos e
orientações para os Estados garantirem um melhor cumprimento das suas
obrigações internacionais.“Alguns Estados
têm sido muito recetivos, como é o caso da Irlanda e da Noruega, mas
muitos outros não”, denunciou, nomeando o exemplo do Reino Unido e
acrescentando que, em alguns casos, as polícias infiltram-se em grupos
para conhecer o que está a ser preparado e conseguir controlar melhor os
ativistas.“Temos agora provas de que
alguns [defensores do ambiente] foram colocados sob vigilância severa,
com os telefones ‘hackeados’ [sob escuta] e os computadores a serem
gravados”, contou o mandatário nas Nações Unidas.Para Michel Forst, os defensores do ambiente não são diferentes dos que lutam pelos direitos humanos.“É a mesma coisa”, sublinhou, explicando que os defensores do ambiente estão apenas a ganhar mais visibilidade.“Estão
a usar novas formas de mobilização que outros não usaram, como colar as
mãos no chão ou algemá-las a uma barreira ou arrombar portas para
cortar milho geneticamente modificado”, enumerou.A
sua crescente visibilidade leva-os a enfrentar aquilo que os defensores
de direitos humanos já enfrentavam, ou seja, o facto de “o espaço
cívico estar a diminuir na Europa”, considerou o relator, referindo que a
avaliação não é só sua, mas também do Conselho da Europa ou da Agência
dos Direitos Fundamentais da UE.E contra isso, Michel Forst só espera uma coisa: “Uma forte reação dos cidadãos”.Em relação às autoridades, o relator especial da ONU também expôs as suas expectativas.“Precisamos
ver os resultados [das orientações que serão dadas] e depois pedir aos
Governos mais recetivos para explicarem aos outros porque é que é
necessário fazer melhor para proteger os ativistas ambientais”,
concluiu.