PS deveria ter candidato às presidenciais que "conseguisse federar à esquerda", diz Ana Gomes

8 de mar. de 2020, 18:05 — AO Online/ Lusa

“Mário Soares daria uma volta ao túmulo se o PS nada fizesse e deixasse Marcelo Rebelo de Sousa ultrapassar os tais 70% com que foi eleito Mário Soares em 1991”, sublinhou Ana Gomes, em entrevista ao Diário de Notícias e à TSF, publicada hoje.A antiga eurodeputada considerou que não tem “dúvidas nenhumas de que o Presidente Marcelo vai recandidatar-se e que ganhará” as próximas eleições presidenciais, mas reafirmou que o “PS deveria ter um candidato que conseguisse federar à esquerda”.“Não concordo com a tese construída, abstrusamente suponho, no tempo de [José] Sócrates, de que o PS não tem de ter um candidato às presidenciais. Bom, o resultado dessa tese foi pôr lá Cavaco Silva e depois Marcelo Rebelo de Sousa”, explicou, acrescentando que não aceita que o PS, “não tendo posição, se preste a pôr-se a jeito para favorecer aquilo que inevitavelmente Marcelo Rebelo de Sousa, num segundo mandato, quererá: favorecer o ‘centrão’, um entendimento do bloco central”.Para a antiga eurodeputada, isso “é altamente negativo para a democracia” em Portugal.Questionada sobre a possibilidade de voltar a haver dois candidatos presidenciais que possam dividir os eleitores socialistas, Ana Gomes vincou que “esse é outro aspeto ainda mais perverso deste ‘não ter posição’ ou apoiar frouxamente um ou outro candidato”.Por essa razão, a comentador considera inconcebível “que o PS não tenha posição” definida nas próximas eleições presidenciais.Questionada também sobre uma eventual candidatura à Presidência da República, Ana Gomes optou por dizer que “a questão das eleições é daqui a quase um ano”.“Nem a fecho [a porta a uma candidatura] nem a deixo aberta. Não estou aí. Estou a fazer o meu trabalho. O importante é discutir o que tem de ser discutido hoje e não o que se vai passar daqui a uns meses”, realçou.Contudo, a antiga eurodeputada mostrou-se “muito preocupada por ver que a oposição” a Marcelo Rebelo de Sousa “vá ficar nas mãos de um indivíduo oportunista, arrivista, sem escrúpulos, como André Ventura”.O líder do Chega e deputado único do partido na Assembleia da República apresentou formalmente a candidatura a Belém em 27 de fevereiro, em Portalegre.Ana Gomes disse ainda que acompanha as declarações do atual chefe de Estado de que o princípio da legislatura “não pode ter o sabor de fim”.“Infelizmente é isso que temos. Fui uma das vozes que defendiam que este Governo, depois das últimas eleições, devia ter trabalhado para uma geringonça dois, portanto, para um acordo que desse estabilidade e perspetivas de haver consenso para se fazer as reformas de fundo de que o país precisa”, prosseguiu a comentadora.Ana Gomes afirmou que o primeiro-ministro, António Costa, “escolhe não o fazer, porque prefere a negociação à queijo Limiano, caso a caso”, mas que essa negociação “está a falhar”.A socialista acrescentou que a líder da bancada parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, “de forma infeliz, disse que era a reedição das forças de bloqueio”, mas “é evidente que o parlamento nunca é força de bloqueio” e que estas declarações dão “argumentos aos populistas”.Para Ana Gomes, a “história de o Governo se refugiar numa de ‘à justiça o que é da justiça’ e ‘à política o que é da política’ serve de mantra para tudo, para não se fazer o que é preciso, para não dar combate à corrupção, para não fazer as reforças de fundo que certas instituições absolutamente precisam”.Questionada também sobre que balanço faz do mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, que completa quatro anos na segunda-feira, 09 de março, a comentadora disse que “tem servido muito bem a Portugal e descomprimiu extraordinariamente o país” depois da “rigidez” da presidência do ex-chefe de Estado Cavaco Silva.“Embora eu jamais me sentasse, como ele se sentou, na mesma mesa do ditador [Teodoro] Obiang [Nguema Mbasogo, Presidente da Guiné Equatorial] no quadro da CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa], jamais. Há limites”, vincou, acrescentando que também não favorece “a forma indireta que Marcelo utilizou para anunciar os pré-vetos a alguns diplomas legislativos, por exemplo, se acabassem as PPP [parcerias público-privadas] na saúde”.Em relação à “questão da eutanásia”, Marcelo Rebelo de Sousa “fez bem, não tomou posição e recusou-se a tomar posição”.