Processo autonómico da Madeira está marcado pela crise política
1 de jul. de 2024, 11:18
— Lusa/AO Online
“O que temos hoje é uma
autonomia que precisa de ser aprofundada e aperfeiçoada”, disse o líder
parlamentar do PS no parlamento regional, considerando que em causa está
um projeto inacabado e “sem resultados”.Paulo
Cafôfo falava na sessão solene do Dia da Região e das Comunidades
Madeirenses, na assembleia, no Funchal, que contou com a presença do
representante da República para o arquipélago, Ireneu Barreto, de
membros do Governo Regional, do ex-presidente do executivo Alberto João
Jardim e de representantes de entidades civis e militares. O
deputado socialista salientou que “a Madeira está hoje mergulhada numa
crise e numa instabilidade como nunca se viu”, insistindo em que os
socialistas não podem “ser culpabilizados quando a direita não se
entende” na região para consensualizar um Programa de Governo e
viabilizar um Orçamento Regional. Segundo
Cafôfo, “a Madeira e o Porto Santo não podem continuar a viver neste
clima de instabilidade” e é “possível fazer mais e fazer diferente”.O
socialista falou também dos problemas das comunidades emigrantes,
sobretudo “em países marcados pela violência, como a África do Sul, ou
pelas dificuldades económicas e os problemas sociais, como a Venezuela”,
sublinhando que precisam de medidas concretas de solidariedade.Quanto
ao Juntos Pelo Povo (JPP), através do líder da sua bancada, Élvio
Sousa, apontou ser hoje “a primeira vez em 48 anos de autonomia que no
Dia da Região se respira a verdadeira essência da democracia”. O
deputado destacou o caráter “decisivo” do parlamentarismo, visto o PSD -
que governa o arquipélago e, no seu entendimento, sofre de “falta de
humildade” – ter deixado de ter maioria absoluta.A
crise política que a Madeira atravessa, indicou, não surgiu por
“castigo divino”, mas “começa e reside neste governo, que foi indigitado
à pressa com base numa pretensa mentira”, sem suporte documental.Élvio
Sousa acrescentou que “a crise começa porque existem suspeitas de
corrupção” sobre responsáveis políticos, nomeadamente o presidente do
Governo Regional, Miguel Albuquerque, que foi constituído arguido numa
investigação judicial em janeiro.“Temos de
estar atentos e vigilantes para que a autonomia não seja refém nem
vítima de interesses políticos”, declarou, por seu turno, o deputado
Miguel Castro, do Chega, afirmando que “a autonomia vai além dos
partidos” e deve ser fortalecida.Quanto ao
deputado único da Iniciativa Liberal (IL), Nuno Morna, argumentou que a
“autonomia não deve ser confundida com autodeterminação” e “não
questiona a soberania, mas engrandece-a”. Para o eleito, é necessário
transformar as “águas tumultuosas do contencioso da autonomia” em que a
região navega desde 1976.Para Nuno Morna,
“o Estado centralizador deve ser desafiado de forma construtiva, para
evitar tempestades desnecessárias”, e a “falta de imaginação não pode
ser limite” do processo autonómico.Já para
a deputada única do PAN, Mónica Freitas, hoje vive-se numa democracia
que “para alguns parece mais frágil, mas que na realidade é como deve
estar”, porque é “representativa das diferentes pessoas e causas, aberta
ao diálogo e parcerias, com respeito pelas diferenças e criadora de
pontes para se atingir o bem comum”. Pelo
CDS-PP (partido que tem um acordo de incidência parlamentar com o PSD), a
deputada Sara Madalena falou da evolução da região e dos custos da
autonomia suportados pelo povo da Madeira, dizendo que “muito mudou nas
últimas décadas”. Ainda assim, observou, o território precisa de
“soluções que esbatam a insularidade”.Rubina
Leal, do PSD, mencionou que a evolução da Madeira nos últimos 48 anos é
“assinalável” e que a região vive um “desafio inaudito: a estabilidade
governativa”, que exige maturidade dos intervenientes políticos, além de
“diálogo, negociação e consenso”.Na sua
leitura, seria “uma desonra” para todos os que lutaram pela autonomia
“não permitir que a Madeira tenha um governo” em funções. A eleita
manifestou também solidariedade para com as comunidades madeirenses,
sobretudo a da África do Sul.O executivo
da Madeira saído das eleições de 26 de maio tem estado em negociações
com a oposição para fechar o Programa do Governo. Na semana passada,
Miguel Albuquerque retirou o documento da discussão na assembleia, após
PS, JPP e Chega (que, juntos, somam 24 deputados, o equivalente a uma
maioria absoluta) manterem o anúncio do voto contra.Após
reuniões com alguns partidos (o PS e o JPP recusaram-se a participar), o
PAN mostrou-se já disponível para viabilizar o documento, sem
especificar o sentido de voto, e a IL assumiu que irá abster-se.Para a tarde desta segunda-feira está marcada outra reunião com o Chega. Miguel Castro
disse na semana passada que irá esgotar as negociações com o Governo
Regional “até ao último minuto”, admitindo um “braço de ferro”, e
reiterou que não viabiliza o Programa do executivo sem o afastamento de
Miguel Albuquerque.As eleições de maio
realizaram-se oito meses após as legislativas madeirenses de setembro de
2023, depois de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter
dissolvido o parlamento madeirense, na sequência da crise política
desencadeada em janeiro, quando Albuquerque foi constituído arguido. O
social-democrata acabou por se demitir em fevereiro e o executivo ficou
então em gestão.