Portugal "tem tudo a ganhar" se assumir liderança na europa na proteção do oceano
28 de set. de 2024, 09:27
— João Miguel Roque/Lusa
Não se vê, mas está lá,
por debaixo do casco do antigo bacalhoeiro Santa Maria Manuela, que
funciona como centro de operações da campanha que reúne cerca de 30
cientistas de 14 centros de investigação, e é no convés do navio que
Emanuel Gonçalves afirma que "com a extensão de oceano que tem, Portugal
tem tudo a ganhar se assumir a liderança na Europa na área da proteção
do oceano", porque tem uma "riqueza de biodiversidade marinha que muita
da população desconhece, que ainda está largamente por estudar e que tem
de ser estudada para sustentar os esforços de proteção".A
expedição de três semanas - promovida pela Fundação Oceano Azul,
Oceanário de Lisboa, Instituto de Conservação da Natureza e das
Florestas (ICNF) e Marinha Portuguesa - é um esforço para impulsionar o
caminho de Portugal no cumprimento da estratégia europeia de conseguir
que até 2030 pelo menos 30% do oceano seja protegido, com pelo menos 10%
com proteção estrita.Emanuel Gonçalves
lembra que "as áreas marinhas protegidas são uma ferramenta para
proteger e ajudar o oceano a recuperar dos impactos da atividade humana,
como a pesca excessiva, e isso depois tem efeitos benéficos para a
utilização humana do oceano".Mas para
proteger é necessário conhecer e o trabalho dos investigadores na
expedição - recolha de amostras de fauna e flora através de mergulhos,
censos de biodiversidade através de registos vídeo com câmaras colocadas
no fundo ou a flutuar perto da superfície, investigação de zonas mais
profundas com recurso a um veículo controlado remotamente e censos
visuais de aves e mamíferos marinhos - irá dar origem a um relatório
científico.Este relatório, com publicação
prevista para o primeiro trimestre de 2025, visa sustentar a gestão
daquela área, que desde 2015 já é área marinha protegida da Rede Natura
2000 mas exige proteção mais robusta. Sobre
o trabalho realizado, o coordenador da expedição, que levou cerca de um
ano a preparar, afirma que não se trata apenas de fazer o levantamento e
catalogar a biodiversidade que existe, "mas também constatar o que já
falta, como grandes predadores, que deveriam estar presentes em maior
quantidade, mas são em número reduzido, presumivelmente devido ao
excesso de pesca".Em mais de uma centena
de lançamentos à água de sistemas de câmaras de vídeo com isco para
atrair fauna marinha, nas imagens captadas surgiram apenas dois tubarões
azuis, apesar de a riqueza da fauna da montanha submarina justificar a
existência de mais predadores do topo da cadeia alimentar. O
banco de Gorringe tem dois picos principais, os montes submarinos
Gettysburg e Ormonde, que apesar de submersos, ao elevarem-se desde
profundidades de cerca de 5.000 metros são mais altos do que as
montanhas do Pico (Açores) e Serra da Estrela juntas e são as montanhas
mais altas da Europa ocidental. São ecossistemas de elevada
biodiversidade, com habitats que vão desde florestas de algas perto da
superfície até recifes de coral de água fria a grandes profundidades.Considerados
“oásis oceânicos”, onde já estão identificadas mais de 800 espécies,
para além da flora e fauna bentónica (associada ao fundo) os picos do
banco de Gorringe atraem também grande variedade de fauna pelágica (que
vive em água aberta), incluindo mamíferos marinhos, como golfinhos e
baleias, tartarugas e aves marinhas.A
cerca de 130 milhas náuticas (cerca de 240 quilómetros) a sudoeste do
cabo de S. Vicente, no Algarve, o banco de Gorringe foi originalmente
cartografado em 1875 por Henry Gorringe, comandante do navio da marinha
dos Estados Unidos USS Gettysburg e é uma cordilheira submarina com
cerca de 180 quilómetros de comprimento e 60 quilómetros de largura.A
expedição tem o envolvimento institucional do Governo Português, Fundo
Ambiental, Autoridade Marítima Nacional, Oceana, National Geographic
Pristine Seas e Waitt Institute e a equipa científica envolve o
Instituto Hidrográfico, IPMA, e os centros de investigação CCMAR –
Universidade do Algarve, CESAM – Universidade de Aveiro, CIBIO e CIIMAR –
Universidade do Porto, MARE – IPLeiria, Okeanos – Universidade dos
Açores, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), Associação
para a Investigação dos Mamíferos Marinhos (AIMM), Aquário Vasco da
Gama, Moss Landing Marine Laboratories da universidade de San Jose
(Estados Unidos), Marine Futures Lab da universidade de Western
Australia e o Laboratory of Applied Bioacoustics da Universidade
Politécnica da Catalunha.