Autor: LUSA/AO Online
“Portugal aguarda com legítima expectativa as consequências que o
Governo irá retirar de uma tragédia sem precedentes na nossa história
democrática”, afirmou o chefe de Estado, que nesse momento recebeu um
forte aplauso das cerca de 200 pessoas presentes na sala. Marcelo
Rebelo de Sousa fez esta declaração, tendo em conta “o anúncio feito
pelo senhor primeiro-ministro”, António Costa, relativamente “a uma
reflexão ponderada e exaustiva baseada no teor do relatório” da Comissão
Técnica Independente, divulgado e apresentado à Assembleia da
República, na quinta-feira. O chefe de Estado intervinha na
abertura do primeiro Encontro para a Autoproteção e Resiliência das
Populações, organizado pela Associação de Vítimas do Incêndio de
Pedrógão Grande (AVIPG), em que fez alguns comentários ao documento, na
Casa Municipal da Cultura de Pedrógão Grande. O Presidente da
República defendeu uma “rigorosa avaliação dos contornos jurídicos do
sucedido”, no dia 17 de junho, em Pedrógão Grande, no distrito de
Leiria, e concelhos vizinhos, “também à luz do conteúdo do relatório,
quanto ao enquadramento de atuações e omissões no conceito de culpa
funcional ou funcionamento anómalo ainda que não personalizado”. O
chefe de Estado considerou que este conceito constitui “pressuposto de
efetivação de responsabilidade civil da administração pública”. Para
Marcelo Rebelo de Sousa, “Portugal tem o dever de proceder a tal
avaliação – e de forma rápida – atendendo à dimensão excecional dos
danos pessoais, a começar no maior e mais pungente deles, que é a perda
de tantas vidas”. Importa, na sua opinião, “aproveitarmos por uma
vez uma tragédia coletiva para mudarmos de vida e rompermos com aquilo
que estrutural ou conjunturalmente esteve mal” no socorro a pessoas e
bens. “Não minimizando ou banalizando a realidade. Não tentando
fazer de contas que ela não foi o que foi, antes mobilizando tudo e
todos, mas mesmo todos, para tornarmos irrepetível a dor sofrida ou
prestarmos tributo aos que choramos, como sobretudo mostrarmos que é
nestas horas decisivas que se revela a força da nossa democracia e da
sua visão do futuro”, acrescentou. Para o Presidente da República,
que discursou durante cinco minutos e não fez declarações aos
jornalistas no final, “há instantes em que o que cumpre dizer ganha em
ser dito de modo curto e direto”. Tanto mais quando “não há tempo a perder, ou melhor, já perdemos todos tempo demais”, afirmou. Ainda
sobre o relatório da CTI, Marcelo Rebelo de Sousa realçou a importância
de “outros contributos que o completem e o enriqueçam”, tendo exprimido
“apreço por todo um envolvimento da comunidade científica e técnica
nacional” na elaboração de um documento "empenhado no esboço de pistas,
nas recomendações que formula". A Comissão Técnica Independente
nomeada para analisar os incêndios rurais de junho na região Centro, em
particular o fogo que deflagrou em Pedrógão Grande, entregou na
quinta-feira no parlamento o seu relatório final. O documento, que
analisa incêndios em 11 concelhos dos distritos de Leiria, Coimbra e
Castelo Branco ocorridos entre 17 e 24 de junho, refere que, apesar de o
fogo de Pedrógão ter tido origem em descargas elétricas na rede de
distribuição, um alerta precoce poderia ter evitado a maioria das 64
mortes registadas. Além disso, acrescenta, “não foram mobilizados
totalmente os meios disponíveis” no combate inicial e houve falhas no
comando dos bombeiros. A GNR fica, por outro lado, ilibada de
direcionar carros para a Estrada Nacional 236-1, onde ocorreram cerca de
metade das mortes. O documento aponta falta de conhecimento
técnico no sistema de defesa florestal e falta de preparação dos atuais
sistemas de combate às chamas para as alterações climáticas,
confirmando, por outro lado, falhas de comunicação do Sistema Integrado
das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP). O
primeiro-ministro, António Costa, afirmou, na sequência da divulgação do
relatório, que o Governo assumirá todas as responsabilidades políticas,
se for caso disso.