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Pode ser necessário um acordo de gestão com a TAP para a SATA Air Açores

Francisco César. Candidato à liderança do Partido Socialista nos Açores, é o único que se apresenta às eleições que se realizam nos dias 28 e 29 de junho. Fala da necessidade de abertura do PS Açores, aponta como metas o reforço de câmaras e juntas nas autárquicas, a reorganização do Serviço Regional de Saúde, alertando para a urgência de evitar que o Grupo SATA não sobreviva



Autor: Paula Gouveia

É deputado na Assembleia da República (AR). Estando garantida a sua eleição para a liderança do partido, manterá as suas funções no parlamento nacional?
(...) Enquanto me for possível conciliar as duas funções, irei fazê-lo, porque assumi o compromisso de ser deputado à Assembleia da República (...), sendo certo que vou ter pessoas que me ajudem na AR e contarei também com os meus camaradas aqui para me poderem ajudar no Partido Socialista nos Açores. Na prática é trabalhar para os Açores em dois sítios ao mesmo tempo.

Que diagnóstico faz do PS/Açores nesta fase da sua história?
(...) O Partido Socialista está numa fase de transição, como é óbvio. Foi 24 anos responsável pelos destinos da Região. É uma fase do Partido Socialista que merece em primeiro lugar nós percebermos o que é que foi bem feito, o que é não correu como gostaríamos, e o que é que tendo corrido bem, hoje em dia já não faz sentido. Porque há muitas políticas que se esgotaram apenas por já terem passado o seu tempo. (...)

Na sua moção, fala em abertura e reforma do partido. Como pretende fazê-lo?
(...) O primeiro trabalho do PS é a sua abertura: temos de ter mais militantes, temos de conversar com os militantes que existem, temos de ter a capacidade de os ouvir (...). Segundo ponto, (...) o PS não pode apenas ser o partido dos seus militantes. Tem de ser o partido dos seus militantes, dos simpatizantes, e de todos aqueles que mesmo sendo não socialistas querem dar o seu contributo e não se revêm na governação atual. Por isso apresentei propostas no sentido de criarmos um Fórum Açoriano para se discutir a preparação de um programa de governo, onde todos aqueles que fazendo parte da sociedade civil, mas não querendo ter uma ligação partidária, sintam o à vontade para o fazer. Depois temos de aprofundar a relação com a juventude, através da Juventude Socialista, mas não só; nós temos de ter maior participação das mulheres. (…) Temos de criar mecanismos de renovação do próprio partido – não faz sentido que tenhamos militantes que são ao mesmo tempo membros de órgãos regionais, órgãos locais ou de órgãos intermédios. (…) Temos de ter uma relação com a diáspora. (...)

Traça um objetivo muito claro já para o próximo ano: o reforço do número de câmaras municipais, assembleias municipais e juntas de freguesia...
O Partido Socialista pode estar numa fase de transição, mas o PS não esteve a dormir. Vasco Cordeiro continuou a fazer o seu trabalho no PS. (...) O PS já tem neste momento, convidados, muitos cidadãos para órgãos de freguesia órgãos municipais, e órgãos até de Câmara. (…) Já está muito trabalho feito. (...)

O PS teve responsabilidades governativas em 24 dos últimos 28 anos. E o Francisco César já alertou: “o pior erro em que o PS Açores poderá incorrer é fazer do seu futuro a defesa do nosso passado”. Admite mesmo que em alguns casos será preciso assumir ruturas. Em que é que é necessário fazer ruturas?
Se a nossa intervenção política for sempre com base no que nós fizemos no passado e não apresentarmos medidas concretas e alternativas em relação ao que está a ser feito, essa é uma discussão que o PS nunca poderá ganhar. (...) E, portanto, o PS tem de apresentar novas políticas. Em alguns casos são evoluções, noutros casos são coisas manifestamente diferentes. (…)
A prioridade das prioridades é a Educação. Nós temos de fazer um contrato social no âmbito da Educação. (…) Temos de criar uma escola a tempo inteiro que permita desde manhã até à noite, desde os quatro meses de idade até à universidade, com um planeamento muito forte, uma intervenção muito forte, durante uma geração. E com isso ter uma ambição que convoque a sociedade civil para numa geração termos a geração mais qualificada do país. Isso significa uma alteração estrutural da Região, da economia açoriana, da possibilidade de emprego. (…) E ter uma coisa fundamental: (…) temos de modernizar a economia, senão toda essa massa de pessoas qualificadas não encontra oferta de emprego e vai-se embora. (…) Portanto, há aqui um trabalho concomitante: por um lado, a educação, por outro lado a economia, investimento externo, atração de capital para que possa haver investimento, apoio às nossas empresas, para que os dois trabalhos sejam feitos ao mesmo tempo e a economia e a educação no final encaixem.

No plano económico, defende que se crie um quarto pilar, para além dos três setores tradicionais (Agricultura, Pescas e Turismo) dedicado às novas Economias, Ciência, Mar, Digital e Descarbonização e Transição Energética. Os Açores já não estão a fazer esse caminho? O que propõe de diferente?
Acelerar. Lembro-me do tempo em que havia a agricultura e as pescas, e depois alargou-se ao turismo. Passados quase 30 anos, temos já três setores tradicionais e não dois. O turismo já é um setor tradicional (...) Nós precisamos de setores de valor acrescentado que trazem muito rendimento. (…) E temos de ter a ambição não é de ter aqui umas pequenas coisas, mas sim de sermos os melhores, e falarmos com quem sabe (…).
E a forma de nós tratarmos de todas as nossas ilhas de uma forma igualitária, é um erro enorme do ponto de vista do desenvolvimento. Porque muitas vezes estamos a dar a determinadas ilhas aquilo que elas não precisam, e a falhar noutras ilhas naquilo que elas verdadeiramente precisam. Para quem tem poucos recursos para investir isto é um desperdício enorme. (...) Temos de evoluir para aquilo que se chama o desenvolvimento específico, de acordo com as potencialidades de cada uma das nossas ilhas. Porque senão estamos a desperdiçar recursos e a criar uma das coisas que é mais problemática na nossa terra – o bairrismo que é o populismo dos Açores. (...)

Ao longo da sua moção, fala de acordos de regime com o PSD, por exemplo, no caso da SATA e também para as grandes obras regionais. O que o leva a defender agora a necessidade dos dois partidos procurarem consensos? Não era essa a postura até agora...
Não sei se não era, mas não me interessa falar do passado. (...) O PSD tem, nos Açores, exatamente a mesma dimensão do PS – as pessoas às vezes esquecem-se disso. Temos 23 deputados e o PSD tem 23 deputados. O PSD tem a responsabilidade de governar, mas não tem nenhum mandato diferente do PS em relação a legislar. (…) E eu percebi que o presidente do Governo talvez tenha compreendido isto nas declarações que fez. Porque é a primeira vez que ouço o presidente do Governo dizer que, em matérias de regime, em que há necessidade de aprovação parlamentar, querem falar com o PS. Porque se bem me lembro o PSD tem sempre preferido falar com o Governo Regional da Madeira ou com o Chega. Não com o PS.

Mas tem havido esta abertura do PS também, tendo em conta que votou contra o programa do governo?
Mas absteve-se no orçamento.

Mudou de posicionamento com o incêndio no HDES...
(…) O PS, quando os Açores precisam, está presente. Houve um problema com o hospital, havia uma questão de regime em que era preciso estar presente, e o PS absteve-se. (...) O PS é um partido de construção.

Em que áreas é que está disponível para acordos de regime?
A moção é clara. (…) Nós estamos disponíveis por exemplo sobre a SATA. (...) Estamos numa situação em que podemos deixar de ter Grupo SATA. Entrámos numa situação de pré-rutura financeira, e nem sequer temos administração completa. Portanto, nós temos aqui um problema de caos total, num dos nossos maiores instrumentos de desenvolvimento. Nós estamos disponíveis para nos sentar como iguais, ou seja não são eles decidem e depois o PS coloca um carimbo a dizer que é um acordo de regime. Se querem apoio parlamentar tem que haver aqui partilha de responsabilidades. E, portanto, conversem connosco sobre o que vão fazer sobre a SATA.

Na moção, coloca um cenário de integração da Azores Airlines na TAP para ser integrada na sua privatização. E admite, mesmo que se encontre um parceiro de gestão para a SATA Air Açores – isso significa privatização para a SATA Air Açores?
Não. O que eu digo é o seguinte: eu não sei se a SATA sobrevive, tendo em conta a forma como se encontra. (...) O plano de reestruturação da empresa não está a ser cumprido com a UE. E podemos vir a precisar de uma segunda hipótese junto da CE (...). O que eu gostaria é que a Azores Airlines fosse maioritariamente pública, mas não sei se a CE aceita, e não sei se é possível, tendo em conta a circunstância financeira da empresa. Eu sei que tenho de preservar pelo menos o interilhas. E no interilhas, pode ser necessária nova injeção de capital, falar com a UE, e pode ser necessário garantir acesso a financiamento e complemento do ponto de vista da sua gestão. E, a única forma que vejo disso acontecer – se não for possível nenhuma destas alternativas – é, pelo menos, na TAP que é um grupo grande, e que tem experiência, e é português, em que o Estado vai ficar com uma participação qualificada, se for necessário fazer um acordo de gestão, em que a propriedade continua pública, mas a gestão é feita por outra empresa.

Está a falar da SATA Air Açores...
Sim, ou seja, se chegarmos a uma circunstância em que não for possível, nós vamos ter de pedir ajuda. Nós não devemos disfarçar o problema e ser orgulhosos quando o que nos interessa é manter, pelo menos, a SATA Air Açores. (...) O que me parece em relação à SATA é que a SATA não fez os cortes, não fez a reestruturação, e espera ter resultados diferentes, fazendo exatamente o mesmo, ora isso não é possível. Se for preciso suporte político para fazer o que é verdadeiramente necessário, o PS está aqui para dar esse suporte. Agora, temos de conversar e conversar a sério. (...)

Na Saúde, propõe uma reorganização administrativa, com a criação de três Unidades Locais de Saúde e de um Centro de Prevenção e Controlo de Doenças. De que forma seria feita esta reorganização?
Nós falámos com vários especialistas, antigos responsáveis políticos da Saúde nos Açores, e especialistas do continente envolvidos na reforma do SNS. (…) Nós temos de mudar o sistema: primeiro, fazer uma aposta muito grande nos cuidados primários e, segundo, não faz sentido que tenhamos, num lado, o centro de saúde e, no outro lado, os hospitais – não faz sentido. Têm de estar integrados. E nós temos de ganhar sinergias. Há ilhas em que o número de pessoas que vêm ao hospital é uma vez e meia a sua população. (…) Nós temos de reduzir o número de conselhos de administração, nós temos de reduzir o número de procedimentos paralelos. E, por isso, a proposta que nós fazemos é a fusão de um conjunto de unidades de saúde, criando três pontos de gestão, em que estes três agrupamentos fazem a gestão do sistema e depois teremos um corpo central a nível regional que faz a gestão destas três valências. E com essa integração, a informatização e a digitalização da Saúde, a par da valorização da carreira médica, podemos conseguir, num curto espaço de tempo, melhorar a eficiência dos serviços prestados à população.

Apresentou a sua candidatura com o apoio de mais de 400 militantes. E, apesar de algumas vozes críticas se terem feito ouvir quando manifestou a vontade de se candidatar, é o único candidato. O peso do nome do seu pai é lhe sempre apontado como sendo o seu calcanhar de Aquiles. Sente que o partido está consigo?
Se não estivesse comigo, calculo que tivesse uma candidatura adversária. Se há vozes críticas ainda bem, porque no PS não há um regime ditatorial. Quem tem vontade de apresentar um projeto político que o apresente. Eu tive vontade de apresentar um projeto político, optei por fazer uma alteração substancial à minha vida para ajudar o PS na altura em que achei que era a altura em que o PS precisava de mim. (…) Vou-me submeter a votos, e se o PS não estiver comigo, fico socialista na mesma. Continuarei no continente e a ajudar aqui no que puder. Se tiver a confiança que espero ter, vou-me fazer o que me proponho fazer com entusiasmo. O que às vezes me desagrada são as chamadas críticas de teclado que são muito fortes no teclado, mas depois não participam nos órgãos do partido. Comigo estas pessoas continuarão a ter o espaço para, dentro do partido, fazerem as críticas e melhorarem até a ação dos órgãos do partido. (…) Em relação ao outro ponto, não posso fazer nada quanto a isso. Sou filho do meu pai e da minha mãe e ainda por cima dou-me bem com eles, gosto deles. Não os vou renegar. O facto de ter tido a educação que tive, a família que tenho, foi um privilégio. (…) Acabei por sempre estar inserido na vida política. (…)

Espera que os açorianos o distingam do antigo presidente Carlos César?
Eu sou tão diferente dele. Eu nasci em democracia e o meu pai não. Eu fui criado no tempo de estabilização da Autonomia. (…) Eu tenho o meu caminho próprio há 20 anos. (...)