Pedro Queiroz Pereira diz que Salgado procurou comprar Marcelo Rebelo de Sousa
BES/GES
22 de out. de 2024, 11:59
— Lusa/AO Online
“O
doutor Salgado fez o seguinte: pega no Departamento Jurídico e manda
entregar trabalhos de cobrança à doutora Rita Amaral Cabral, que tem um
escritório de advocacia. Para quê? Para recuperar a relação com o
professor Rebelo de Sousa. Se for, por exemplo, ao escritório da doutora
Rita Amaral Cabral, mais de metade ou 60% do trabalho era o BES que
dava. Era uma forma de comprar o professor Rebelo de Sousa”, afirmou o
industrial falecido em 2018.Pedro Queiroz
Pereira recordou que houve uma deterioração da relação entre Marcelo
Rebelo de Sousa e Ricardo Salgado, quando o primeiro foi a um congresso
do PSD e falou “mal do GES”, porque “era conveniente mostrar que se era
contra os grandes grupos económicos”, o que deixou a relação entre ambos
“muito tremida” quando até passavam férias juntos, segundo o antigo
líder da Semapa.“Só que os interesses eram
grandes demais: o interesse político de Marcelo Rebelo de Sousa era
grande, mas precisava do dinheiro por trás; Salgado tinha poder
económico, mas não tinha poder político. Foram as mulheres, Rita Amaral
Cabral e Maria João Salgado, que trabalharam na relação”, revelou o
industrial no depoimento como testemunha perante o Ministério Público
(MP) em janeiro de 2018.De acordo com o
empresário, que faleceu em agosto de 2018, Ricardo Salgado agiu então
através da companheira de Marcelo Rebelo de Sousa para reparar a relação
com o antigo líder social-democrata, mediante a entrega de trabalho
jurídico e a posterior nomeação como administradora da Semapa.“Para
ajudar Ricardo Salgado, [Rita Amaral Cabral] veio para administradora
da Semapa por alturas de 2004, 2005 ou 2006, juntamente com Rui
Silveira. E Rui Silveira fez uma opção da vida dele que foi seguir
Ricardo Salgado até à morte. O que Ricardo Salgado dizia era lei e ele
chega a administrador e nem tem capacidade para isso… Rui Silveira é um
advogado medíocre, mas que desempenhava uma função muito importante de
lealdade ao chefe”, declarou.Na sessão que
decorre no Juízo Central Criminal de Lisboa, até agora preenchida com a
reprodução do depoimento de Pedro Queiroz Pereira, o empresário lembrou
também a guerra de poder com Ricardo Salgado, quando o BES tentou
assumir o comando do seu grupo através de posições acionistas e da
influência sobre as suas irmãs.“No início
dos anos 2000, os bancos começaram a ser obrigados a cumprir rácios mais
exigentes e tiveram de fazer aumentos de capital. Depois, diziam que a
procura era oito vezes superior e isso foi sempre mentira… financiaram
com as ‘offshores’, a concorrer com dinheiro do próprio banco, e vinham
para os jornais dizer que toda a gente queria ações do BES. E eu vivia
revoltado com isso. Foi assim que eles compraram a minha irmã
Margarida”, notou.“Deram-lhe as ações da
‘offshore’ e ela deu as ações dela no grupo. Mas não disseram quem era,
diziam que era um investidor norueguês, e depois apareceram lá Rita
Amaral Cabral e Rui Silveira como administradores. Depois só lhes
faltava comprar a minha outra irmã. Aquilo era uma vigarice completa”,
observou, resumindo: “Já desde 2001 que eu não tinha confiança nenhuma
[em Ricardo Salgado], mas fingia”.O
industrial acusou ainda Ricardo Salgado e outros administradores do BES,
como Rui Silveira, de acharem que “eram Deus na Terra, que mandavam no
país e que eram donos do mundo” e destacou a existência de ameaças
veladas do ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) ao governador do
Banco de Portugal.“O Ricardo Salgado
chegou a ameaçar o governador do Banco de Portugal a dizer: ‘eu já estou
há muitos anos e os governadores mudam’. Assim como quem diz, ‘se
calhar tenho de falar com alguém para te tirar’. Era uma prepotência
desmedida”, finalizou.