Para as vítimas de violência doméstica a casa foi tudo menos um lugar seguro
Covid-19
7 de mai. de 2021, 17:25
— Lusa/AO Online
As
constatações foram feiras no decorrer do debate sobre o “Impacto da
covid-19 na vida das mulheres – As violências contra as mulheres e a
violência doméstica”, que decorreu no
parlamento, organizado pela subcomissão para a Igualdade e Não
Discriminação, enquadrado no ciclo de debates “O impacto da covid-19 e
as desigualdades”.A coordenadora do Centro
de Investigação em Saúde Pública, da Escola Nacional de Saúde
Pública/Universidade Nova de Lisboa, salientou que o ano de 2020 ficará
marcado pela crise provocada pela pandemia de covid-19 e alertou para o
quadro paradoxal causado pelas medidas adotadas.“Para
as vítimas, a casa foi muitas vezes tudo menos um lugar seguro. Perante
a pandemia surgiu a obrigatoriedade de confinamento que fechou no mesmo
espaço agressores e vítimas, reduzindo os contactos sociais e agravando
problemas anteriores”, apontou Sónia Dias.Segundo
a responsável, a “evidência do impacto da covid-19 [na violência
doméstica] ainda é incipiente”, razão pela qual a Escola Nacional de
Saúde Pública realizou um inquérito ‘online’ em abril do ano passado, ao
qual responderam 1.062 pessoas.Sónia Dias
adiantou que 13,7% dos inquiridos, ou seja, 146 pessoas, afirmaram ter
sido vítimas de violência doméstica durante o período pandémico, a
maioria do género feminino, com um perfil jovem, baixa escolaridade e
com mais dificuldades económicas.Entre as
146 pessoas que reportaram ter sido vítima, 66% já tinham sofrido de
violência anteriormente, enquanto “uma em cada três sofreu violência
pela primeira vez neste período”.O
procurador da República Miguel Ângelo Carmo ressalvou que, nesta
matéria, o diagnóstico da pandemia ainda não está feito e que está a ser
conhecido, mas apresentou um “dado que vai mais além”, porque vem de
uma fonte diferente, o Citius, a plataforma informática de gestão
processual e onde dão entrada todos os processos.“No
ano de 2019, o Citius dá-nos como processos criminais registados pelo
Ministério Público como violência doméstica o número de 34.801. No ano
de 2020, já com pandemia, o Citius conferiu o número final de entrada de
inquéritos de 35.465, o que corresponde a um aumento, é verdade pouco
expressivo, de mais 644 processos, mas que ainda assim representa mais
1,9%”, revelou, acrescentando que estes dados foram retirados na semana
passada.Miguel Ângelo Carmo explicou que
estes dados são diferentes dos apresentados pela PSP e pela GNR – que
reportaram menos queixas do que em 2019 - porque são todas as denúncias
que entraram no sistema judicial, vindas de todos os locais.“Porque
é um crime de natureza pública e, portanto, as pessoas denunciam
diretamente no Ministério Público, denunciam nos tribunais, na saúde, na
escola e como é obvio estamos perante um crime que tem de ser
comunicado ao Ministério Público”, disse Miguel Ângelo Carmo.Por
outro lado, defendeu que “é urgente” que seja implementado o manual de
atuação funcional nas 72 horas seguintes à denúncia, “algo que está
feito desde maio de 2020”, e que é dirigido aos órgãos de polícia
criminal, de modo a melhor proteger a vítima e melhor produzir prova que
possa incriminar o agressor em tribunal.Algo
defendido também pelo coordenador da Equipa de Análise Retrospetiva de
Homicídios em Violência Doméstica (EARHVD), que salientou que com a sua
“efetiva implementação a proteção das vítimas e a força preventiva da
norma penal serão, seguramente, reforçados”.Rui
do Carmo aproveitou, por outro lado, para salientar a proteção dos
direitos das crianças, apontando que se trata de uma “questão central”
no combate à violência doméstica, que “está claramente documentada no
âmbito criminal e no âmbito da proteção das crianças e jovens”.O
encerramento da sessão deveria ter sido feito pela secretária de Estado
para a Cidadania e a Igualdade, mas Rosa Monteiro teve de ausentar-se
por motivos pessoais.