Papa Francisco diz que ser homossexual não é um crime, mas é um pecado
25 de jan. de 2023, 09:19
— Lusa/AO Online
Francisco
reconheceu que os bispos católicos em algumas partes do mundo apoiam as
leis que criminalizam a homossexualidade ou discriminam a comunidade
LGBTQ (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero) e admitiu que ele
próprio se refere à questão em termos de "pecado". O
líder da Igreja Católica defendeu também que esses bispos, em
particular, precisam de passar por um processo de mudança para
reconhecer a dignidade de todos. "Esses bispos têm de ter um processo de
conversão", disse, acrescentando que deveriam agir com "ternura, (...)
como Deus tem para cada um de nós". Cerca
de 67 países ou jurisdições em todo o mundo criminalizam a atividade
sexual consensual entre pessoas do mesmo sexo, 11 dos quais podem ou
impõem a pena de morte, de acordo com o The Human Dignity Trust, uma
organização não-governamental sediada no Reino Unido que trabalha para
pôr fim a tais leis. Os especialistas
dizem que, mesmo quando as leis não são aplicadas, estas contribuem para
o assédio, estigmatização e violência contra pessoas LGBTQ.
As Nações Unidas têm apelado repetidamente ao fim das leis que
criminalizam abertamente a homossexualidade, dizendo que violam os
direitos à privacidade e à liberdade e constituem uma violação das
obrigações dos países ao abrigo do direito internacional para proteger
os direitos humanos, independentemente da orientação sexual ou
identidade de género. Declarando tais leis
"injustas", Francisco disse que a Igreja Católica pode e deve trabalhar
para lhes pôr fim. "[A Igreja Católica] deve fazer isso. Tem de o
fazer", sustentou. Francisco citou o
catecismo da Igreja Católica, defendendo que os homossexuais devem ser
acolhidos e respeitados, e não devem ser marginalizados ou
discriminados. "Somos todos filhos de
Deus, e Deus ama-nos como somos e pela força que cada um de nós luta
pela nossa dignidade", disse Francisco, numa entrevista realizada
terça-feira, no Vaticano. Tais leis são
comuns em África e no Médio Oriente e datam da época colonial britânica
ou são inspiradas pela lei islâmica. Alguns bispos católicos
defenderam-nas firmemente como consistentes com os ensinamentos do
Vaticano que consideram a atividade homossexual "intrinsecamente
perturbada", enquanto outros apelaram à sua abolição por se tratar de
uma violação da dignidade humana básica.
Em 2019, esperava-se que Francisco emitisse uma declaração de oposição à
criminalização da homossexualidade durante um encontro com grupos de
direitos humanos que conduziram pesquisas sobre os efeitos de tais leis e
das chamadas "terapias de conversão". O
Papa acabou por não se encontrar com os grupos, que em vez disso se
reuniram com o 'número dois' do Vaticano, o qual reafirmou "a dignidade
de cada pessoa humana e contra toda a forma de violência".
Francisco disse que tinha de haver uma distinção entre
um crime e um pecado no que diz respeito à homossexualidade.
"Ser homossexual não é um crime", afirmou. "Não é um crime. Sim, mas é
um pecado. Muito bem, mas primeiro vamos distinguir entre um pecado e um
crime", explicou, para acrescentar, de seguida: "É também um pecado
faltar com a caridade ao próximo". A
doutrina católica defende que enquanto os homossexuais devem ser
tratados com respeito, os atos homossexuais são fruto de uma
perturbação. Francisco não mudou essa doutrina, mas fez da aproximação à
comunidade LGBTQ uma marca do papado. A
começar pela famosa declaração de 2013, "Quem sou eu para julgar?",
quando lhe perguntaram sobre um suposto padre homossexual. Como
arcebispo de Buenos Aires, apoiou a concessão de proteção legal a casais
do mesmo sexo, uma alternativa à defesa do casamento homossexual, que a
doutrina católica proíbe.Francisco foi
criticado pela comunidade católica LGBTQ após um decreto de 2021 do
gabinete de doutrina do Vaticano, segundo o qual a igreja não pode
abençoar uniões homossexuais "porque Deus não pode abençoar o pecado".
O Vaticano em 2008 recusou-se a assinar uma declaração da ONU que
apelava à descriminalização da homossexualidade, alegando que o texto ia
além do âmbito original e incluía também linguagem sobre "orientação
sexual" e "identidade de género" que considerava problemática. Então,
o Vaticano instou os países a evitarem a "discriminação injusta" contra
os homossexuais e a porem fim às sanções discriminatórias.