Papa Francisco defende uniões de facto de casais homossexuais

21 de out. de 2020, 16:08 — Lusa/AO Online

“Os homossexuais têm o direito a ter uma família. Eles são filhos de Deus", disse Francisco numa das suas entrevistas para o filme.“O que temos de ter é uma lei da união civil. Dessa forma, eles estão legalmente cobertos", frisou.O filme, no âmbito do qual foi entrevistado, aborda questões com as quais o Papa Francisco mais se preocupa, incluindo ambiente, pobreza, migração, desigualdade racial e discriminação.Enquanto servia como arcebispo de Buenos Aires, Francisco defendeu a união civil para casais homossexuais, no entanto nunca até hoje se tinha manifestado sobre o assunto na qualidade de Papa.O diretor do documentário destacou, em entrevista à agência espanhola Efe, a evolução de Francisco em relação ao flagelo dos abusos e a sua capacidade de “aprender com os erros”.Um desses erros, que o Papa mais tarde reconheceu, aconteceu em 2018 quando não acreditou nas vítimas de abuso sexual por padres no Chile e pediu provas, indignado, mas, logo depois de pedir perdão, recebeu as vítimas em Roma e desencadeou a renuncia dos bispos chilenos.“Apenas dois meses após a 'cimeira dos abusos' em fevereiro de 2019, surgiram os primeiros frutos, a nova lei do Vaticano que exige a sua denúncia, e logo após a abolição do segredo pontifício”, enfatiza Evgeny Afineevsky.Um dos personagens principais do documentário é Juan Carlos Cruz, o sobrevivente chileno de abuso sexual pelo clero que Francisco inicialmente desacreditou durante uma visita de 2018 ao Chile.Cruz, que é homossexual, conta a sua própria história em fragmentos ao longo do filme, narrando a evolução de Francisco na compreensão do abuso sexual e documentando as opiniões do Papa sobre os homossexuais.A imagem de uma Praça de São Pedro chuvosa e vazia devido à pandemia do coronavírus e de um Francisco solitário no seu centro é a poderosa metáfora com a qual o diretor do documentário, Evgeny Afineevsky, inicia o seu mais recente trabalho, um olhar cinematográfico sobre a personalidade e as ações do Papa argentino.“Francesco”, que estreou hoje no Festival de Cinema de Roma, é um documentário dedicado a “uma Humanidade que cria dramas e desastres, e a Ele, que com humildade e sabedoria, tenta guiar-nos para construir um futuro melhor”, disse Afineevsky em entrevista à Efe.“Não o vejo como um documentário sobre o Papa, é um documentário sobre todos nós, toda a Humanidade que cria desastres, ataca o meio ambiente, monta todas essas guerras que fazem os migrantes fugirem, cria abusos sexuais, que não há só na Igreja, mas também em Hollywood”, garante o diretor.“Ele tenta nos ajudar a navegar, a mudar, mostrando-nos que estamos diante de uma linha vermelha” e que devemos escolher entre “ser vítimas do nosso passado ou heróis do nosso futuro”, acrescenta.O diretor residente nos Estados Unidos, indicado para o Oscar de melhor documentário em 2016 com "Inverno em chamas: A Luta pela Liberdade da Ucrânia" sobre a revolução Maidan e três Emmy por "Gritos da Síria" em 2017, levou quase três anos para concluir este projeto que durante duas horas traça o pensamento e as experiências de Bergoglio, através das suas viagens e depoimentos de personalidades e amigos.O seu documentário, explicou, pretende mostrar ao mundo que “estamos num certo ponto onde temos de reavaliar as nossas ações, recordar que o que pode acontecer é o Armagedom”, insiste, porque como diz Francisco “a humanidade vive uma crise que não é apenas económica e financeira, mas também ecológica, educacional, moral, humana”.Afineevsky garante que não pretende retratar Francisco como uma celebridade."Ao contrário do filme Win Wenders de alguns anos atrás, é importante para mim não mostrá-lo nem como um Papa nem como o rei do universo, mas como uma pessoa humilde”.No documentário, o diretor de 48 anos, nascido em Kazan (antiga União Soviética), que cresceu em Israel e depois emigrou para os Estados Unidos, não aborda questões religiosas, mas as ideias do Papa sobre os grandes desafios do nosso tempo.“Para mim que não sou católico, que sou judeu e nasci ateu na Rússia, foi importante mostrar ao mundo que eu, com a minha perspetiva não religiosa, posso ver o que esse homem faz e como ele nos inspira”, afirmou.Por isso optou por um filme que possa ser visto por jovens e velhos, por diferentes grupos sociais, crentes e não crentes. “Procurei criar uma história cinematográfica que pudesse ser entendida por pessoas simples e altamente cultas, algo que possa ficar depois de nós e pode educar as pessoas", frisou.O filme tem ainda entrevistas com o Papa Emérito Bento XVI, o cardeal filipino Tagle e o Presidente Sarkissian da Arménia - onde Francisco falou do genocídio que causou a ira da Turquia - entre outros.O realizador recebe na quinta-feira, no Vaticano, o prémio Kineo Film for Humanity das mãos de Rosetta Sannelli, a sua criadora, tradicionalmente premiado no festival de Veneza e que é atribuído aos promotores das questões sociais e humanitárias.A atribuição do prémio foi decidida por considerar o júri que "Francesco" ilustra o pensamento e a obra deste papa "vulcânico e imparável, uma personalidade de grande profundidade em todo o mundo, independentemente de suas crenças ou julgamentos pessoais ".