"Países têm de estar preparados para novas pandemias"
26 de dez. de 2022, 16:12
— Lusa/AO Online
Francisco
George falava à agência Lusa na véspera do Dia Internacional da
Preparação para Epidemias, criado pela Organização das Nações Unidas
(ONU) em 2020, ano fustigado pela covid-19, para alertar para os
“efeitos arrasadores” das grandes doenças infecciosas, que além de
mortes, causam destruição, perdas socioeconómicas e atrasos ao
desenvolvimento de sociedades inteiras. No
contexto deste dia, “chama-se a atenção para a necessidade de colocar
tudo o que respeita à saúde pública como absoluta prioridade”, disse
Francisco George, lamentando que esta área seja remetida muitas vezes
para “níveis de menor prioridade”.Para um
dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Saúde Pública, os países devem
ter a preocupação de terem nas respetivas agendas “o reforço das
unidades de saúde pública”.O médico, que
exerceu o cargo de diretor-geral da Saúde entre 2005 e 2017, lembrou à
Lusa a primeira grande pandemia que aconteceu em 1980, a sida, e as que
surgiram no novo milénio.“A partir do ano
2000, assistimos a uma série de acontecimentos que traduzem a emergência
inesperada de fenómenos epidémicos de natureza zoonótica” - doenças que
têm origem em agentes infecciosos que têm como reservatório animais –
que têm abalado “diferentes países”.O
especialista recordou a Síndrome Aguda Respiratória Severa (SARS) em
2003, que teve a sua génese no animal exótico Civeta, e que começou no
sudeste asiático, tendo particular gravidade em Toronto, no Canadá, onde
provocou 8.000 casos e 800 mortos.Mais
tarde, em 2012, surgiu o coronavírus no Médio Oriente (MERS), com origem
nos camelos, e em 2019 apareceu o SARS-CoV-2 na China central, que
provocou a pandemia de covid-19.Tudo
indica que na origem da covid-19 esteve o pangolim, um mamífero com o
corpo coberto de escamas muito idêntico aos peixes, que é também
utilizado como fonte alimentar, adiantou.“As
epidemias não vão parar, vão acontecer e, por isso, é de toda a
importância chamar a atenção para os governos prepararem mecanismos de
monitorização, mecanismos de vigilância a fim de serem detetados os
primeiros casos e serem imediatamente combatidos”, avisou.Foi
neste contexto que foi criada em Portugal a Sociedade Portuguesa de
Saúde Pública, que se ocupa do estudo destas questões, mas sobretudo dos
aspetos científicos que dizem respeito à emergência desses problemas e à
necessidade de criar mecanismos de vigilância.Francisco
George anunciou, a este propósito, que vai decorrer em junho um
congresso que vai juntar especialistas portugueses, da Organização
Mundial da Saúde e de outras organizações para debater estes problemas,
“mas com a preocupação de afinar a interpretação científica que é
requerida para preparar respostas”.Questionado
sobre a vaga de novos casos de covid-19 na China, o especialista disse
que o que se exige “é a total transparência da informação”, com a
comunicação da situação à OMS, o que vai implicar a deslocação de
especialistas desta organização à China.“Os
problemas têm de se combater onde surgem. Portanto, se há questões na
China, antes de mais nada é preciso começar a perseguir e controlar
esses problemas que são identificados e evitar que se propaguem para
outros países. Essa é uma questão central que tem que ser atendida”,
vincou.Também questionado se a covid-19 se
está a tornar uma doença endémica, afirmou que, em Portugal,
“provavelmente sim”, mas ressalvou que há sempre a possibilidade de
surgirem novas variantes“Não quer dizer
que a probabilidade seja alta, mas há sempre a possibilidade de surgirem
variantes novas que fogem às defesas asseguradas pelos anticorpos que
foram criados, entretanto, na população”, disse Francisco George.Por
isso, defendeu, tem de haver uma vigilância genómica laboratorial como a
que se faz no Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge, para perceber a
natureza da infeção, se há ou não alterações ao vírus inicial e se há
novas variantes que podem precisar de adaptação de respostas, incluindo
vacinas.