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Legislativas
“Os Açores estão altamente prejudicados nas quotas de pesca”

Francisco Lima, cabeça de lista do Chega pelo círculo eleitoral dos Açores às legislativas


Autor: Cristina Pires - Açores TSF/Carlota Pimentel Açoriano Oriental

No seu entender, estas eleições antecipadas podiam ou deviam ter sido evitadas em nome da estabilidade governativa e do superior interesse do país?

Claro que podiam e deviam. A culpa exclusiva foi de Luís Montenegro, que quis transformar umas eleições num plebiscito pessoal, ou seja, numa questão de ética. Existe aqui uma falta de ética do primeiro-ministro, que não esclarece sinais exteriores de riqueza que tem. Casas de 700 mil euros que paga com várias contas que não declarou ao Tribunal Constitucional, empresas que põe no nome dos filhos, depois no nome da mulher... Trapalhadas. (...)

Um caso muito próximo de José Sócrates, que também tinha amigos com malas de dinheiro. Aqui ainda não apareceram as malas, mas já apareceu o dinheiro, aparecem casas... Há uma falta de seriedade. (…) Soube-se, na semana passada, que o líder parlamentar também faturou 700 mil euros numa empresa em que o único trabalhador é o próprio Hugo Soares. (...)

Luís Montenegro não se quis sujeitar a uma comissão de inquérito parlamentar e provocou eleições.

E a moção de censura que o Chega apresenta a dada altura?

O Chega mostrou que tinha razão antes do tempo. Os partidos votaram contra a moção de censura do Chega e passado uma semana ou 15 dias, deram razão ao Chega e não aprovaram a moção de confiança.

O Chega viu, antes do tempo, os sinais de que era mais do que evidente uma falta de credibilidade e até de seriedade do primeiro-ministro e não podemos ter um primeiro-ministro sob suspeita.

António Costa demitiu-se por causa de um parágrafo e por causa dos 75 mil e 800 euros que foram encontrados no gabinete, que pertenciam ao seu chefe de gabinete Vítor Escária. Mas demitiu-se, assumiu a sua responsabilidade. Houve uma consequência política. Na altura, o PSD aplaudiu. Toda a gente aplaudiu. Agora, estamos perante um caso de uma dimensão maior. Não são 75 mil e 800 euros, são vários milhões de euros, que não se explica, que não é credível (...) O PSD, neste caso a AD (…) está a ser vítima do próprio primeiro-ministro, que está agarrado ao poder, mais o seu líder parlamentar, e não saem. Eles tinham que sair.

Substitui José Bernardo que chegou a ser anunciado como cabeça de lista do partido. Viu-se obrigado a aceitar este desafio ou encarou este convite de última hora com naturalidade?

Encarei com naturalidade. (...) Nunca ia aceitar um desafio dessa natureza se não estivesse preparado. No Chega, quando vamos para esse partido, e eu já sou militante desde 2020, assumimos determinadas responsabilidades, [como] a exposição mediática e temos que estar preparados para as batalhas que aparecem, as batalhas eleitorais. Nesse caso, temos que dar a cara e o nome do partido. Estou aqui não a defender as ideias de Francisco Lima, mas as ideias do partido Chega.

Este convite foi feito por José Pacheco ou por André Ventura?

Foi concertado entre a regional e a nacional. Contrariamente ao que dizem e propagam, essa ideia do centralismo, de que o Chega não tem uma democracia interna, mas, de facto, tem. As escolhas desta lista foram as do líder do Chega Açores, falando com os dirigentes do Chega Açores e que que tiveram que ter o aval de André Ventura, o presidente do Chega, porque existem determinados critérios que têm que ser cumpridos. (...)

A revisão da Lei das Finanças Regionais não está na gaveta, mas pouco ou nada avançou no último ano. Do seu ponto de vista, o que é preciso acautelar e com que rapidez na próxima legislatura?

A República tem sempre um espírito centralista. É mais do que evidente que, com os gastos na Saúde e na Educação, o Governo Regional, seja qual for a cor política, não consegue suportar esse aumento de gastos. (…) Os Açores não conseguem suportar sem uma atualização.

As rendas têm atualização, tudo tem atualização. Os custos da Região têm atualização.Estamos a suportar custos que a República tinha que ser solidária. Além da Lei das Finanças Regionais, existe a questão da capitação do IVA que, quando foi o governo da Troika, deu um rombo de quase 200 milhões de euros nas contas regionais.

Ora, não há milagres. Não temos capacidade nem sequer de aumentar impostos. Existe um diferencial na Região de 30% (...) e há uma dupla penalização.

Quer dizer, o Governo Regional recebe menos 30% do IRC e IRS também. Na receita do IVA também é penalizado em 30%. É injusto, quer a capitação, quer a Lei das Finanças Regionais. (...)

Luís Montenegro, que já provou ser muito mau para os açorianos, (…) vai arrastando os problemas e não os resolve. Temos esperança de que haja um governo que realmente olhe para essa realidade dos Açores e Madeira. Sei que há estudos, que contrataram equipas técnicas...

Mas tem que se passar da teoria à prática?

Sim, os açorianos estão cansados. Creio que o Governo dos Açores, seja de que cor política for, tinha interesse que fosse concretizada essa atualização.

Que outros compromissos eleitorais tem o Chega para a próxima legislatura no que aos Açores diz respeito?

O Chega continua a reivindicar tudo o que são falhas da República, desde o património da República abandonado, à falta de vigilância do mar. Criam-se as reservas, mas depois, quer a Força Aérea, quer a Marinha não têm os submarinos, nem os aviões para vigiar, e os chineses e toda a gente pesca nas nossas reservas, menos os nossos pescadores.
Os cabos de fibra ótica interilhas também não avançam. (...)

Os tribunais da Região (...) não têm condições, não têm ar condicionado. As esquadras de polícia são mesmo situações abjetas. É insuportável. (…) A cadeia de Ponta Delgada é um exemplo paradigmático. Andamos a mover montanhas de areia e não se concretiza.

(...) Os Açores estão altamente prejudicados nas quotas de pesca. Houve até uma proposta do Chega que foi reprovada com a AD, que não quer renegociar para os Açores as quotas e a modernização da pesca.

O PRR também foi mal desenhado. O Governo da República falhou, por exemplo, com o subsídio de 2022 dos custos das matérias-primas. Falhou com os agricultores. Luís Montenegro mentiu aos agricultores. Estivemos na Associação Agrícola há tempos e foi dito publicamente que iam pagar cerca de 18 milhões de euros. Esqueceu, não se fez nada. Promessas atrás de promessas (...).

Temos cerca de 23 propostas. (…) A questão do RSI, para nós, é uma bandeira. Está-se a pagar a milhares de pessoas nos Açores, já chega a quase 200 mil pessoas no país e o governo da AD não fez nada para acabar com a chaga do RSI.

Consideramos uma chaga quando temos mais de 100 mil pessoas que não querem trabalhar e os outros portugueses e açorianos é que os têm que sustentar (...). Nos Açores, com a influência do Chega, reduziu-se o RSI. A nível nacional não se reduz o RSI.

A habitação é também um problema que é uma das nossas bandeiras. Até temos uma proposta na Assembleia Regional para o Governo Regional criar legislação para facilitar a construção. Os açorianos estão desesperados por falta de mão de obra e, de facto, as coisas não avançam.

Vamos agora olhar para as eleições de 18 de maio. Os Açores elegem cinco deputados. Ideologias à parte e sem as por em causa, no seu entender, não deveria haver mais diálogo e cooperação entre os parlamentares eleitos pelo arquipélago na defesa dos interesses da Região e menos calculismo partidário?

Esta é uma pergunta muito adequada para os partidos do sistema que estão cá há 50 anos e que não nos resolveram os problemas. O que é eles andam a fazer? Vemos inclusivamente o clima que existe de crispação entre os dois partidos. O Chega, contrariamente ao que dizem, quis ser parte da solução. Foi parte da solução que existe atualmente nos Açores e os Açores têm um clima de estabilidade...

Estou a referir-me a nível da República, porque até há pouco tempo tinham um deputado eleito pelos Açores.

O nosso deputado, enquanto foi deputado, tinha uma relação muito estreita com o Chega Açores. Muitas das propostas que ele levou eram propostas que tínhamos discutido e estávamos a discutir na Região, como por exemplo a prioridade nas creches, que aqui foi aprovado e com o governo da República foi reprovado, porque a AD entendeu que as creches têm que ser para as pessoas que não querem trabalhar e não para as pessoas que querem trabalhar.

A prioridade nas creches nos Açores é para quem trabalha, no continente continua a ser para aqueles pseudo desempregados, que são aqueles que recebem o RSI, vão para os cafés e põem os filhos no colégio. Os que trabalham, têm que ficar sem trabalhar, porque não têm o sítio para pôr os filhos.

O entendimento existe, da nossa parte. Dos outros partidos, não sabemos.


“Os jovens vão votar massivamente no dia 18 e vão votar no Chega”

Se for eleito para a Assembleia da República, vai tentar estabelecer pontos e entendimentos com os outros deputados eleitos pela Região? E, se for eleito, trocará o Parlamento Regional pela Assembleia da República?


Vamos a eleições e vamos ver o que as pessoas decidem. Perante os resultados eleitorais, temos que tomar uma decisão. É evidente que eu não posso estar nos dois parlamentos e terá que haver uma opção. (...)

Sobre os entendimentos com as outras forças políticas, posso dizer o seguinte: até o governo de Luís Montenegro já teve votos de protesto, aprovados por unanimidade, na Assembleia Regional, por incumprimento com os Açores, como foi o caso do subsídio de mobilidade, em que o ministro, desrespeitando o Parlamento dos Açores, pôs uma tabela que aumentava o custo de passagem aos açorianos sem falar e nem ouvir nem respeitar os legais representantes dos açorianos que é o Parlamento Regional.

(…) Existe um centralismo que tem que ser combatido. Faço um desafio a Francisco César e a Paulo Moniz. Se for eleito, o Chega-Açores está disponível, naquilo que for o interesse da Região, de termos uma frente comum de defesa. (...) Vamos para o parlamento nacional, mas fomos eleitos pelo círculo dos Açores, (...) portanto a defesa dos Açores tem que estar à frente de todas as questões partidárias.

Como se sente, enquanto cidadão - e até como deputado pela sua experiência no Parlamento Regional -, quando o debate político e a troca de argumentos nos parlamentos ultrapassam os limites do bom senso, da educação e, em alguns casos, até da decência?

Isso, de facto, é sancionável. O Chega tem sido vítima disso.  Quando o Chega é atacado vilmente, (...) não se passa nada, não há indignação. Quando o Chega, por alguma razão, riposta, defende-se, há uma certa indignação.

(…) De facto, não prestigia a democracia o clima de crispação que temos tido. Mas, na anterior legislatura, foi muito pior por culpa de Ferro Rodrigues, que odiava o Chega e não respeitava a democracia. Atualmente, o presidente da Assembleia, Aguiar Branco, mostrou ser uma pessoa com equidistância em relação a essas questões da liberdade de expressão, etc. (...) Na Assembleia, por vezes, discordamos de tal forma que até podemos nos exaltar, mas acabamos podemos ir almoçar com o colega. Ele é o nosso opositor, não o nosso inimigo.

(...) As pessoas têm, às vezes, umas discussões mais efervescentes, mas ascoisas resolvem-se democraticamente. (...)

Nos Açores, os níveis de abstenção são sempre elevados, comparativamente ao resto do país. Em 2024, a percentagem ultrapassou mesmo os 50%. Receia que, a 18 de maio, se volte a bater um recorde?

Penso que não. Acho que, à semelhança do que aconteceu nas últimas eleições da Madeira, as pessoas vão dar uma resposta à altura e, neste momento, acho que uma resposta à altura será mesmo um voto massivo no Chega, principalmente a juventude. (...) Todas as sondagens dizem que mais de 30% dos jovens estão com o Chega e não estão com os partidos do sistema, porque os jovens já se cansaram.

Os jovens, apesar de terem menos idade, já têm outro tipo de perspetiva e de informação. Olham para trás e veem um país que, em 50 anos, está na cauda da Europa. Se está na cauda da Europa, é porque os nossos governantes não deram soluções. A única solução que [os jovens] hoje têm é o aeroporto para embarcar e emigrarem para outras paragens.

Os jovens vão votar massivamente no dia 18 e vão às urnas votar no Chega. Vamos crescer eleitoralmente, principalmente no eleitorado de jovens.

Quem é a sua maior referência política?

André Ventura.

Receia que o caso de Miguel Arruda, eleito há um ano pelo Chega e que passou a deputado não inscrito na sequência do caso das malas, possa prejudicar o partido nos Açores, pondo em causa a votação inédita de há um ano?

Acho que não, por uma razão muito simples. Os políticos e alguns jornalistas pensam que os eleitores são estúpidos. Esse é o grande erro dos políticos. Os eleitores sabem distinguir entre questões pessoais de Miguel Arruda, de José Sócrates, de Luís Montenegro, se não fosse candidato a primeiro-ministro, (…) do presidente da Câmara de Vila Franca do Campo, que foi condenado por esses dias, de um partido.

(...) Temos a caminho dos 70 mil militantes. Se 1% das pessoas não for séria ou tiver comportamentos que são sancionáveis, estamos a falar de 600 pessoas. (...) Mas, atenção, nos partidos do sistema, só o caso do “tutti frutti” são dezenas. A diferença do Chega para os outros partidos não é os casos que aparecem, é a forma como eles são tratados. (...)

Resumindo, não acredita que o caso de Miguel Arruda prejudicará a sua eleição enquanto cabeça de lista nas próximas eleições?

Não sou hipócrita para dizer que favorece a minha eleição, mas prejudicar acho que não. No dia 18, os açorianos vão provar que são superiores a esse tipo de confusão (…).