Autor: Lusa/AO Online
Em entrevista à RTP, após a conferência de imprensa do Conselho de Ministros, Luísa Salgueiro (PS) realçou que a ANMP enviou em outubro ao Governo um documento com propostas para a Proteção Civil e a gestão integrada de fogos rurais e florestais “que infelizmente não mereceram sequer uma resposta ou uma análise”.
Entre as medidas propostas, a autarca destacou a revisão da carta de perigosidade, porque “as cartas de perigosidade não são reais, não correspondem à situação concreta das várias parcelas do território”, e assegurar “que seja possível uma resposta pronta da limpeza dos terrenos”.
“As pessoas, porventura, não têm conhecimento que um presidente de Câmara, se tiver conhecimento de um terreno que esteja em más condições de limpeza e que ofereça perigo, não tem condições para avançar para essa limpeza rapidamente. Tem de seguir um conjunto de procedimentos”, disse.
Salgueiro salientou que cumprir estes procedimentos pode demorar demasiado tempo.
“A autarquia identifica a necessidade de limpeza do terreno, notifica o proprietário para proceder à limpeza do terreno, tem naturalmente de cumprir os prazos do Código de Procedimento Administrativo que requerem um conjunto de etapas, a pessoa pode-se opor à realização dessa limpeza e, caso pretenda realizá-la, realiza-a no tempo que considera possível. E a autarquia só pode substituir-se ao proprietário passados meses depois de ter iniciado o procedimento”, explicou.
A autarca destacou ainda que o cumprimento destes passos também “depende da capacidade da autarquia a vários níveis, seja técnica, seja financeira”, porque “não se pode esperar que as autarquias, sejam quais forem, consigam responder com os escassos meios que têm a este problema”.
“Há autarquias que não têm condições financeiras para realizar estes trabalhos porque não têm nenhum financiamento, portanto era importante que houvesse a dotação dos municípios, dos recursos humanos e financeiros”, sobretudo nos municípios em regiões de maior desertificação.
Luísa Salgueiro criticou ainda o centralismo do país, em que “a descentralização não avança porque não se quer que avance, a regionalização está congelada” e há “um país a várias velocidades”, sem “capacidade de decisão imediata”, dependente de autoridades “que, estando em Lisboa, acabam por ser sempre aqueles que tomam as decisões sobre todas estas parcelas do território”, enquanto “o país assiste a isto”.
“Não é só com este Governo. É com sucessivos Governos. Isto não se trata de uma questão partidária, trata-se de interesse público, do interesse nacional, do interesse das pessoas, da defesa do território, que está em causa”, afirmou a autarca socialista.
Salgueiro considerou que “é evidente” e “inquestionável” que houve problemas e descoordenação no combate aos incêndios dos últimos dias, e afirmou que a culpa é “multinível, desde o nível nacional ao nível regional”.
Salientou também que não teve tempo ainda para analisar as propostas do Governo, apresentadas na quinta-feira, mas, se forem “uma resposta àquilo que há muito está identificado e que tarda em ser feito, vem no bom sentido”.
“É tarde, mas é melhor que se faça agora (…) o país não pode esperar mais”, considerou.
Além da revisão das cartas de perigosidade e de mais meios legais, técnicos, humanos e financeiros para fazer cumprir com maior rapidez a limpeza de terrenos pelos privados, no documento com propostas enviado pela ANMP ao Governo, a que a Lusa teve acesso, os municípios propõe a simplificação das regras de funcionamento do sistema de incêndios, “diminuindo a dispersão e a complexidade dos instrumentos de planeamento e de programação”.
Os municípios pretendem que o Estado dote as Câmaras “de instrumentos legais e administrativos para assumirem a posse dos terrenos privados com matos e/ou floresta mal estruturada onde haja risco de incêndio, para tomarem medidas operacionais e de diminuição do risco, no caso de incumprimento por parte dos privados”.
Defende também meios para prosseguir no cadastro das propriedades e o aumento da capacidade de fiscalização do Instituto de conservação da Natureza e da Floresta (ICNF) e que a GNR/SEPNA.
“Reforçar a capacidade de vigilância e dissuasão através da presença da autoridade na floresta, chamando também as Forças Armadas a este desiderato, nomeadamente o Exército e a Força Aérea para ações de reconhecimento em períodos de risco e de combate aos incêndios, com mecanismos de acionamento que permitam uma ação em tempo próximo ao das ignições, em áreas em que os meios operacionais terrestres dos bombeiros sejam marcadamente insuficientes”, defendeu.
No extenso documento, defendem ainda a reestruturação da cadeia integrada de comando nas operações de combate, com definição objetiva do papel dos responsáveis, maior articulação entre as autarquias e as associações humanitárias e as corporações de bombeiros e a revisão das condições de trabalho dos bombeiros sapadores e em regime de voluntariado, pedindo ao Governo que “desencadeie o processo legislativo tendente à aprovação de um novo Estatuto Profissional dos Bombeiros Sapadores”.