Mudanças atiram ensino da Matemática para "mínimos históricos inexplicáveis"
17 de jan. de 2023, 09:44
— Lusa/AO Online
As
propostas de alteração ao currículo da Matemática no ensino secundário
homologadas a 13 de janeiro pelo ME, entraram em discussão pública em
junho do ano passado sendo o resultado de um grupo de trabalho criado em
2018 para avaliar os problemas do ensino da disciplina em Portugal,
analisar o modelo em vigor, definido no mandato do ex-ministro Nuno
Crato.“Ponderado o conhecimento matemático
e pedagógico-didático que preconizava a proposta, a SPM debateu e
identificou no trabalho curricular proposto múltiplos e graves problemas
– que se mantêm no documento homologado –, com repercussões diretas no
futuro académico dos alunos que venham a ser a ele sujeitos”, criticou a
SPM em parecer.Entre as
críticas da sociedade científica estão “um grande retrocesso” no ensino
da disciplina, ao voltar-se a opções “nefastas” como o “uso intensivo de
calculadoras ou de meios tecnológicos para formular conjeturas sem a
devida validação por processos analíticos”, assim como “alterações
profundas” que “impedem um bom entendimento de várias matérias, a
aquisição de conhecimentos matemáticos e o desenvolvimento de
capacidades próprias para este nível de ensino, encaminhando a
aprendizagem nesta disciplina para mínimos históricos inexplicáveis”.A
SPM defende que o anterior programa estava associado a “uma melhoria
dos desempenhos dos alunos em vários indicadores” e critica o grupo de
trabalho por “omitir” essa correlação nas suas conclusões, assim como o
ME, no que diz respeito ao documento homologado.“A
versão final não corrige nem os erros de natureza científica7, nem os
de natureza pedagógica, pelo que não se pode considerar um documento
legítimo enquanto orientador de uma tão nobre e necessária tarefa como é
a de ensinar Matemática”, defende a SPM.Para
a associação científica, está em causa “os progressos no ensino da
Matemática duramente conquistados”, e as alterações aprovadas configuram
“um retrocesso” a “conceções antiquadas e anticientíficas predominantes
há 50 anos e completamente ultrapassadas pela investigação científica
moderna”, defendendo também que o documento consagra a “superficialidade
no tratamento de vários temas”, o que, entre outros aspetos, prejudica a
“devida preparação em matemática de jovens para cursos do ensino
superior”.“O enquadramento criado pelas AE
leva a que a SPM não possa omitir uma clara preocupação pelas
desigualdades que dele possam resultar na qualidade da aprendizagem e no
sucesso escolar dos alunos. Na verdade, alunos que queiram prosseguir
áreas científicas com forte componente matemática vão ter um
conhecimento matemático muito insuficiente, o que condicionará
decisivamente o sucesso no ensino superior e na prática profissional
consequente”, lê-se no parecer da SPM.Para
a sociedade científica “apenas a reconhecida competência e o bom senso
dos professores poderão permitir superar alguns dos problemas apontados”
e afirma que “tudo fará para mitigar os efeitos que uma aplicação
estreita destas Aprendizagens Essenciais poderá trazer ao Ensino da
Matemática em Portugal”.“A SPM não pode
deixar de lamentar veementemente e de forma pública este extemporâneo e
progressivo desmantelamento de pilares estruturantes em que se apoia a
Escola portuguesa, depois dos progressos de décadas tão duramente
conquistados pelos nossos alunos e respetivas famílias e escolas – num
processo que, se não cessar com brevidade, trará consequências que
levará outras décadas a corrigir”, conclui a sociedade científica.As mudanças no ensino da Matemática no ensino secundário devem entrar em vigor em 2024.