MP arquiva inquérito à divulgação de dados de 230 mil utentes dos Açores
21 de nov. de 2017, 16:01
— Lusa/AO Online
O
inquérito foi desencadeado com a participação da empresa pública
Saudaçor, que gere os recursos e equipamentos de saúde dos Açores, após a
revista Exame Informática ter noticiado em março que dados de quase
todos os habitantes dos Açores estiveram expostos no 'site' da
Administração Regional de Saúde (ARS) do Alentejo."O
ficheiro tinha o nome 'Exportação Utentes SRSA para Reembolsos'. Quem o
descobria na Internet tinha uma surpresa: numa grelha Excel estão os
dados de mais de 230 mil habitantes dos Açores", incluindo "nomes
completos, número fiscal, e de utente dos serviços de saúde regionais,
moradas, datas de nascimento e números de telefone e/ou telemóveis",
informou a revista.Na
participação, a Saudaçor pretendia ver apreciada a responsabilidade
criminal de um engenheiro, constituído arguido, que contratou para a
“execução da plataforma informática para o Sistema de Gestão de
Reembolsos nos Açores”, por ter “desenvolvido idêntica plataforma para a
ARS Alentejo”.O
arguido prestou o serviço a partir de Évora e, após a situação ter sido
tornada pública, a Saudaçor, que queria ver também apuradas
responsabilidades criminais da ARS Alentejo, da revista e de
desconhecidos, rescindiu o contrato.O
Departamento de Investigação e Ação Penal de Évora delegou a
investigação na Unidade Nacional de Combate ao Cibercrime e à
Criminalidade Tecnológica da Polícia Judiciária.No
despacho final lê-se que o arguido “assumiu a colocação do ficheiro
Excel no servidor da ARS Alentejo para que pudesse trabalhar os dados
ali existentes”, mas esqueceu-se de o apagar quando se tornou
desnecessário.Já
quanto à responsabilidade criminal do arguido, dos autos resulta que
“acedeu aos sistemas informáticos da Saudaçor e da ARS Alentejo e,
ainda, a um ficheiro informático contendo dados pessoais protegidos por
lei”.“Sucede
que tais acessos foram legitimados pelas relações contratuais e
funcionais que detinha com cada uma destas entidades”, refere o
despacho, explicando que o arguido “estava devidamente autorizado a
aceder a ambos os servidores e ao ficheiro de dados”, o que afasta a
prática dos crimes de acesso ilegítimo e acesso indevido.Já
quanto à violação de dever de sigilo, o MP sustenta “resulta indiciado
que o ficheiro não se encontrava acessível a quem consultasse o ‘site’
da ARS, através de um ‘link’, ou sequer a quem fizesse uma pesquisa
simples no Google”.“Conforme
divulgado pela notícia da revista Exame Informática, a sua consulta só
era possível através de pesquisa com recurso aos Google ‘dorks’,
ferramenta informática de ‘hacking’ que permite apurar resultados
relativos a servidos sedeados em Portugal que usam uma tecnologia de
partilha de ficheiros e gestão de conteúdos”, lê-se no despacho.Para
o MP, trata-se de uma pesquisa que está acessível apenas a “pessoas com
especiais conhecimentos de informática e que permite a entrada ilícita
num servidor”.O
MP rejeita também responsabilizar criminalmente a ARS Alentejo, dado
que “a gravação e manutenção do ficheiro no seu servidor” foram
assumidas pelo arguido, além de que “nada indicia que tenha atuado em
nome ou no interesse” desta, que “desconhecia a existência e localização
daquele ficheiro na raiz” do seu ‘site’.“No
que respeita à identificação de terceiros desconhecidos que tenham
acedido ao sistema informático da ARS e ao ficheiro contendo dados
pessoais, no caso não se mostra possível apurar as circunstâncias
concretas deste acesso”, sobretudo “quem acedeu, através de que IP,
onde, quando e como”, adianta o MP que afasta igualmente a
responsabilidade da revista, “ou mais concretamente do jornalista” que
elaborou a notícia ou eventualmente da sua fonte.Considerando
que o conhecimento da existência do ficheiro e do ‘site’ na Internet em
que o mesmo se encontrava disponível “terá, presumivelmente, resultado
de um acesso ilegítimo ao ‘site’ da ARS, o MP adianta que “nada permite
concluir” que foi o jornalista “quem pessoalmente acedeu ao site” - e
consequentemente ao ficheiro -, mas admite a possibilidade de ser alguém
que tenha atuado como fonte jornalística, “muito provavelmente um
indivíduo com especiais conhecimentos de informática, um ‘hacker’”.