Mentalidade é a chave para mais mulheres no desporto motorizado
16 de mai. de 2024, 10:40
— António Gonçalves Rodrigues/Lusa
“Não
se pode estar neste desporto só pela exposição, pelo facto de ser a
única mulher no meio de um desporto de homens. Se não gostar da
velocidade, do desafio, de ultrapassar os seus limites, é muito difícil.
Este não é um desporto em que se consiga chegar ao topo facilmente e só
porque se quer. É preciso trabalhar muito, treinar. Não é como nos
outros desportos, é preciso investir o seu tempo e energia”, afirmou
Michele Mouton, em entrevista à agência Lusa.A
antiga piloto de ralis e atual presidente da Comissão das Mulheres nos
Desportos Motorizados da Federação Internacional do Automóvel (FIA)
considera que são necessárias mais vontade e determinação para haver
mais mulheres em competição.Vencedora de
quatro provas do Campeonato do Mundo, incluindo o Rali de Portugal, em
1982, Mouton lamenta que o foco dos jovens esteja cada vez mais nas
redes sociais.“O que vejo na maior parte
do tempo é que os jovens têm muito mais energia para se mostrarem no
Instagram ou no Facebook do que em quantas décimas de segundo ganharam
numa especial, dentro do carro. Esse é outro dos problemas. Hoje em dia,
preferem saber quantos seguidores têm do que lutar. Infelizmente, este
não é um desporto em que se chegue ao topo só porque se quer. É preciso
lutar por isso”, sublinhou.À margem da
57.ª edição do Rali de Portugal, que terminou no domingo, o promotor do
Campeonato do Mundo (WRC) apresentou um programa de deteção de talentos
femininos, com o objetivo de aumentar o número de mulheres no
campeonato. Uma ideia que Michele Mouton aprova, apesar de considerar
que isso só resolve parte do problema. A outra metade depende das
próprias jovens.“Quem me dera voltar a ter
[agora] 20 anos, porque no meu tempo precisávamos de encontrar os
patrocínios, tínhamos de fazer tudo. Agora, desde o promotor, às
equipas, todos ajudam as raparigas. Não se sabe quantas vão aderir mas
se o programa pudesse ajudar uma ou duas já seria fantástico. É uma
excelente oportunidade. Mas é preciso estar motivada”, apontou.A
francesa recordou o início da sua carreira, nos anos 1970, quando
decidiu arriscar: “Quando comecei, não sabia se seria boa. Mas comecei”.
“Depois, quis melhorar, ser mais rápida,
tentei ser sempre mais rápida e nunca desisti. Ok, não tínhamos
Instagram ou telemóveis nem nada disso. Mas agora é uma história
diferente. Para mim, a motivação é o mais importante. Pilotar depressa
depende mais da cabeça do que do pé”, sentenciou.Mouton
defende o alargamento da base de recrutamento feminina, mas também
motivar as raparigas a experimentarem a competição automóvel.“É
mais uma questão de trabalho do que de talento. A certa altura, sabes
que não vais mais depressa mas se queres bater o adversário, tens de
encontrar a solução para ires mais depressa. O que faz a diferença é a
motivação. No meu caso, eu não podia aceitar ser mais lenta do que o
colega que tinha o mesmo carro que eu. Tínhamos o mesmo carro e, para
mim, não era aceitável ser mais lenta se os carros eram iguais. Não
sabia como fazê-lo mas tentava ir o mais depressa possível”, garantiu.E
tentava fazê-lo, independentemente da aparência: “Se não tivermos essa
mentalidade... eu gosto do desafio e de lutar. Não queria saber se
estava despenteada para as fotos, se falavam bem de mim, ou mal. Não
queria saber. Só queria atingir o nível deles. E tinha essa motivação”,
recordou Michele Mouton, apesar de nunca ter tido como objetivo ser
piloto de ralis.