Autor: LUSA/AO Online
“O panorama económico do país atualmente é melhor (…), mas o que
temos constatado é que ao nível da franja mais pobre da população ainda
não estamos a ver o retorno dessa melhoria”, disse o presidente da
Fundação AMI, que falava à Lusa a propósito do Dia Internacional para
Erradicação da Pobreza, que se assinala na terça-feira. Para isso
acontecer, seria preciso que o crescimento previsto de 2,5% da economia
portuguesa se “mantivesse durante alguns anos”, adiantou Fernando Nobre. O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) Portugal, padre
Jardim Moreira, partilha da mesma visão, afirmando que “pode ter
melhorado alguma coisa, mas a estrutura social mantém-se na maior parte
dos casos”. “Melhorou uma coisa aqui, ou acolá, houve quem
conseguisse empregar-se, mas são empregos tão inseguros e incertos que
não dá para sair da pobreza”, lamentou Jardim Moreira. Ainda “há
pessoas em Portugal que só comem uma vez por dia”, alertou Fernando
Nobre, contando casos de pessoas que chegam aos centros Porta Amiga da
AMI para almoçar às 08:00 porque estão com fome. Os últimos dados
do Instituto Nacional de Estatística referem que, em 2016, havia 2,595
milhões de portugueses (25,1%) em risco de pobreza ou exclusão social,
menos 1,5 pontos percentuais face ano anterior. Destas, 487 mil
(18,8%) tinham menos de 18 anos e 468 mil (18%) tinham 65 ou mais anos,
adiantam os dados, que apontam um aumento do rendimento médio disponível
por família de 79 euros, passando para 1.497 euros por mês, em 2016. Para
o presidente da Cáritas Portuguesa, Eugénio Fonseca, os sinais de
melhoria devem-se sobretudo a terem sido retomadas políticas sociais que
foram penalizadas durante a crise. “Refiro-me ao Rendimento de
Inserção Social, ao complemento solidário para idosos e aos abonos de
família. Logo aqui nota-se uma diferença naquilo que é básico para as
pessoas, mas no conjunto ainda não se nota essa quebra em termos de taxa
de pobreza", disse Eugénio Fonseca. Para Eugénio Fonseca, a queda
da taxa de desemprego é um dos indicadores de que as coisas estão a
melhorar, mas pediu atenção para os empregos que estão a ser criados, em
regra temporários e com remunerações baixas. Para Fernando Nobre,
a melhoria da economia advém sobretudo do “apelo turístico” que
Portugal tem hoje no mercado internacional, principalmente por ser “um
país pacífico, seguro”. “É uma das locomotivas que está a puxar a
nossa economia e inclusive a baixa do desemprego”, disse o fundador da
Assistência Médica Internacional. Mas, nas palavras de Jardim Moreira, “a pobreza permanece um desafio” porque as suas causas são estruturais. “Enquanto
as respostas não atingirem as causas geradoras”, a pobreza “pode ser
minorada, mas não erradicada, porque a estrutura que a alimenta e produz
mantém-se igual”, vincou. A esta pobreza geracional, juntam-se
agora os novos pobres, pessoas da classe média que “entraram em colapso”
na sequência do período da ‘troika’. Para sobreviver, muitos
emigraram, outros criaram o próprio emprego, aceitaram trabalhos
precários e outros passaram a viver com a ajuda dos familiares, contou
Jardim Moreira. Um dos grandes problemas apontado por jardim Moreira é o desemprego de longa duração, para o qual “não se vê solução à vista”. “Enquanto
podem, vivem do subsídio de desemprego, depois vão vivendo de pequenos
biscates ou de algum comércio paralelo escondido para sobreviver”,
lamentou. Perante a possibilidade de acontecer uma nova crise
mundial dentro de poucos anos, Fernando Nobre defendeu que é importante
Portugal precaver-se e apostar na educação e na “enorme riqueza do
país”, nomeadamente o mar, o turismo, a cultura e as comunidades, para
construir “um futuro sustentável”. “A economia é uma pirâmide
multifacetada e por vezes concentramo-nos apenas numa ou duas faces”,
mas “devemos apostar em todas”, frisou.