Marcelo critica elites distantes do povo e recusa lições de direito constitucional
27 de out. de 2017, 06:18
— Lusa/AO Online
Marcelo Rebelo de Sousa deixou estas
mensagens, e falou também sobre a importância de se "saber sair a
tempo", durante uma aula aberta sobre o tema "Atlântico", na
Universidade dos Açores, em Ponta Delgada, que durou mais de uma hora e
meia.O chefe de Estado referiu-se ao direito constitucional
português a propósito do sistema de governo dos Estados Unidos da
América, declarando: "Sabem que não há nada como conhecer direito
constitucional para se perceber os poderes constitucionais dos titulares
dos órgãos de soberania". "Portanto, não há nada como ser
professor de direito constitucional para se saber o que se pode fazer e o
que não se pode fazer, sem ter de receber lições de quem não sabe
direito constitucional", acrescentou.Antes, em resposta a uma
pergunta sobre a lusofonia, Marcelo Rebelo de Sousa lamentou que
"durante tempo de mais", no período de integração na União Europeia,
essa não tenha sido uma prioridade."Mas eu, sobre essa matéria,
tenho sempre uma dúvida essencial: se é meu defeito ter razão antes de
tempo - isso só me tem causado os maiores problemas -, ou é defeito
alheio o chegar sempre tarde a compreender coisas relativamente óbvias",
observou, em seguida.O Presidente da República disse que isso de
"ter razão antes de tempo" lhe acontece "muitas vezes" e que enquanto
professor se absteve de falar de "certas realidades" com os colegas.Provocando
risos, explicou o motivo: "Para não ser considerado o responsável pela
sua ocorrência, porque, tendo dito com antecedência que poderiam
ocorrer, depois fico uma espécie de causa daqueles efeitos".Na
assistência, estavam o atual presidente do Governo Regional dos Açores,
Vasco Cordeiro, e o antigo titular desse cargo João Bosco Mota Amaral,
que Marcelo Rebelo de Sousa saudou como "um amigo de há 51 anos".Nesta
aula aberta, o chefe Estado fez um discurso de cerca de 45 minutos e no
final afirmou que se sente bem como professor - "aquilo em que sou
melhor do que em tudo o resto por onde passei ou onde me encontro".Antes de responder a perguntas, falou sobre a necessidade de "reestruturação permanente" das universidades.Neste
contexto, comentou: "É desagradável para os velhinhos como eu, é, mas
eu fui dos primeiros a aceitar aquilo que ao mesmo tempo é penoso, que é
saber sair a tempo. Que é o mais difícil, como sabem, do futebol à
política"."Mas noutros domínios é preciso saber sair a tempo, e os professores também têm de saber sair a tempo", reforçou.Após
ter respondido a perguntas durante perto de uma hora, o Presidente da
República deixou ainda dois recados, uma crítica às "chamadas elites", e
um pedido aos jovens estudantes para que, no futuro, "por amor de Deus,
não se isolem em torres de marfim"."Há realidades essenciais
para a nossa vivência coletiva relativamente às quais as chamadas elites
- não vamos agora discutir o que são, se o são verdadeiramente e como o
são - se dispensam de realmente partilhar com o povo aquilo que é
essencial para poder ser assumido como verdadeiramente nacional. E todos
nós perdemos com isso", considerou.Como exemplos, apontou a
atitude em relação às comunidades portuguesas no momento de lhes
assegurar participação política e a falta de pedagogia europeia sobre o
funcionamento da União Europeia. Dirigindo-se aos estudantes
açorianos, o chefe de Estado pediu-lhes que tenham a noção de que "em
Portugal ainda são privilegiados" e que, quando se formarem, trabalhem
em função da sociedade onde vivem, "não se esqueçam da comunidade"."É
fundamental a ideia de não se fecharem. E, quando pensarem em projetos
para o país, pensem mesmo no país todo. Porque, se o não fizerem, nascem
os populismos, fruto de as pessoas não saberem, de terem medo, de se
sentirem marginalizadas", argumentou, concluindo: "Está nas vossas
mãos".O Presidente da República encontra-se nos Açores desde
quarta-feira e ficará na região até sábado, para visitar as duas ilhas
do grupo oriental, Santa Maria e São Miguel, completando assim o périplo
que fez em junho pelas outras sete ilhas do arquipélago.