Maratona de leitura de "Moby Dick" lembra presença de baleeiros açorianos nos EUA
21 de dez. de 2017, 10:09
— Lusa/AO online
“Este
livro está muito relacionado com os Açores até pelas implicações de
toda a aventura do navio. E não é sem mais nem menos que possui
personagens açorianas”, declarou à agência Lusa o escritor, ensaísta e
professor da Universidade dos Açores Vamberto Freitas.O
académico falava em antecipação da leitura, a realizar em 05 e 06 de
janeiro, da obra de Melville e de outros títulos inspirados por "Moby
Dick", que decorrerá na Horta, ilha do Faial, em formato de maratona
luso-americana, com a duração de três horas e 45 minutos, em simultâneo
com o Museu da Baleia de New Bedford, nos Estados Unidos, e o Museu de
Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, também nos Açores. Esta
vai ser a 22.ª maratona “Moby Dick” no museu norte-americano, que
repete, em 2018, a leitura simultânea com o Museu de Angra do Heroísmo,
que já ocorreu em janeiro deste ano.Na
época áurea da baleação, as embarcações norte-americanas recrutavam,
pela boa reputação que tinham, açorianos, em particular nas ilhas das
Flores e Corvo, para a pesca dos cetáceos.Melville
elogia mesmo na sua obra os açorianos: "Não poucos destes caçadores de
baleias são originários dos Açores, onde as naus de Nantucket que se
dirigem a mares distantes atracam frequentemente, para aumentar a
tripulação com os corajosos camponeses destas ilhas rochosas"."Não
se sabe bem porquê, mas a verdade é que os ilhéus são os melhores
caçadores de baleias", escreve Herman Melville, cujo romance não teve
muito sucesso no seu lançamento, e que hoje se encontra entre os
“clássicos” das letras norte-americanas, de acordo com a crítica e a
investigação literária.A bordo do navio baleeiro "Pequod" seguiam três açorianos, havendo um deles que passava a vida a cantar e a tocar viola.Vamberto
Freitas, que viveu na Califórnia, nos Estados Unidos, diz que a obra
evidencia também a emigração açoriana para a América – uma emigração
que, numa primeira fase, se realizou exatamente a partir incursão de
homens do mar dos Açores, em baleeiras norte-americanas.“Essa
[emigração] começa nos finais do século XVIII e continua no século XIX.
Os açorianos eram conhecidos pela sua habilidade na baleação. Além de
os navios e baleeiros terem de parar no Faial para reabastecerem, também
o faziam para recruta de baleeiros açorianos, começando a emigração
açoriana, precisamente através dessa atividade”, destaca o escritor.Vamberto
Freitas afirma que os açorianos, a bordo das baleeiras, uma vez pagos
pelas suas campanhas, desertavam na costa leste quando chegavam ao país
para seguirem, na sua maioria, para a “corrida ao ouro” da Califórnia.Para
o escritor, o romance de Herman Melville, que conheceu os Açores,
“retrata muito bem o destino americano dos açorianos”, tendo tido a
oportunidade de partilhar com estes uma viagem que promoveu às ilhas do
Pacífico. No
museu da baleação de New Bedford refere-se que o primeiro português numa
baleeira norte-americana terá sido Joseph Swazey, no ano de 1765, tendo
o primeiro capitão sido Frederick Joseph, natural da ilha do Faial.O
crítico literário considera que este “é o primeiro romance americano
que faz do navio uma metáfora da própria América”. Para Vamberto de
Freitas, Melville é o “primeiro escritor que vê no país a diversidade
das nações que ou triunfam ou vão juntas ao fundo”.O
mesmo autor exemplificou que a tripulação do navio é oriunda de
variadíssimas zonas geográficas, como a França, Islândia, Ilha de Man,
Holanda, Sicília, Malta, Chile, Dinamarca, Açores, Índia, Inglaterra,
Espanha e Irlanda.“O
romance 'Moby Dick' não é sobre baleias ou um cachalote branco atrás do
qual vai o louco do capitão Ahab, mas a natureza do próprio poder
americano, da vaidade americana e da ideia de que o homem pode dominar
tudo e todos, incluindo a natureza, acabando por se afundar”, conclui o
professor universitário.