Mais de 29 mil sobre-endividados pediram ajuda à Deco em 2019
29 de jan. de 2020, 13:40
— Lusa/AO Online
O
balanço do ano não é positivo, na opinião da coordenadora do Gabinete
de Proteção Financeira da Deco, Natália Nunes: "O número de pedidos de
ajuda [à associação de defesa do consumidor Deco] não diminuiu em 2019,
mantendo-se com o mesmo número desde 2017", e totalizando 29.154 no ano
passado, quando em 2018 foi 29.350 e em 2017 tinha sido 29.000.
O que mudou, analisando dados daquele gabinete de 2019 face a 2018,
foram as razões desse sobre-endividamento, deixando o desemprego de ser a
principal causa das dificuldades financeiras das famílias, sendo
substituído pela deterioração das condições laborais, como atrasos de
pagamento de salários, perdas de rendimentos (nomeadamente devido a
baixa médica) e redução de horas extraordinárias ou comissões.
A Deco lembra que os desempregados que regressaram no ano passado ao
mercado de trabalho têm sido confrontados com contratos temporários e/ou
parciais e que, do ponto de vista financeiro, esta situação conduz a
insegurança e instabilidade e está aliada a baixos salários.
"Relativamente aos créditos, verificamos que as famílias continuam a
ter cinco créditos (um à habitação, dois cartões pessoais e dois cartões
de crédito), tal como em 2018, mas verificamos que há um aumento dos
montantes do crédito pessoal e dos cartões de crédito", apontou Natália
Nunes. Os montantes médios do crédito, que
em 2018 eram de 16.111 euros para o crédito pessoal e 7.580 euros para
os cartões de crédito, subiram no ano passado para, respetivamente, 22
mil euros, 8.300 euros. Em termos
percentuais, o crédito à habitação tinha um peso de 73% no total de
créditos, o crédito pessoal 20% e os cartões de crédito 7%.
Os dados revelam ainda outro grande motivo de preocupação para a
associação de defesa dos consumidores, a taxa de esforço suportada pelos
consumidores sobre-endividados, ou a percentagem do rendimento total do
agregado familiar destinada ao pagamento das prestações de créditos,
que no ano passado foi de 76%, contra 80% em 2018.
Natália Nunes lembra que a taxa de esforço "não deve ser superior" a
35% do rendimento, o que significa que os gastos mensais com créditos
não devem absorver mais de 35% do rendimento mensal da família. "Com esta taxa de esforço [76%], as famílias estão estranguladas do ponto de vista financeiro", afirmou Natália Nunes.
Em 01 de julho de 2018, entraram em vigor novas regras do Banco de
Portugal (BdP) de restrição à concessão de novos créditos à habitação e
ao consumo, estabelecendo três tipos de limites, recomendando a entidade
a atribuição de novos créditos apenas a clientes que gastem no máximo
metade (50%) do seu rendimento líquido com as prestações mensais de
todos os empréstimos detidos (habitação e consumo), apesar de admitir
exceções. "Essas medidas tiveram algum
efeito no que concerne à concessão de crédito à habitação, com a banca a
atuar de acordo com as recomendações do BdP. Mas há muito a fazer",
afirmou a responsável da associação, acrescentando que entre os pedidos
de ajuda que chegam à Deco "há muito crédito contratado recentemente por
famílias cuja taxa de esforço já não lhes permitia ter mais crédito".
A Deco defende a criação de "regras muito apertadas" para a concessão
de cartões de crédito, e a aplicação das recomendações à concessão de
crédito ao consumo. Os dados da associação
revelam ainda que a maioria (44%) dos consumidores que pedem ajuda à
Deco eram trabalhadores do setor privado (contra 14% do setor público),
19% eram desempregados e outros 19% reformado.