Magistrados do MP e advogados anteveem tempos difíceis no novo ano judicial
30 de ago. de 2021, 10:43
— Lusa/AO Online
A
Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), através do seu
presidente, Manuel Soares, disse, por sua vez, à Lusa que as principais
matérias com "relevância mais estrutural" na agenda da ASJP para o
próximo ano judicial são temas como o "reforço da transparência e
integridade na justiça", plano nacional de combate à corrupção,
violência de género e tribunais, obrigações declarativas dos juízes e os
tribunais administrativos e fiscais.Adão
Carvalho, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
(SMMP) referiu à Lusa que estes profissionais esperam "tempos difíceis,
porque no último movimento ficaram muitos lugares por preencher devido à
falta de magistrados".Segundo Adão
Carvalho, a falta de meios humanos e materiais continua "a agravar-se e
os magistrados do MP são obrigados a desdobrar-se em várias frentes,
tendo que acumular o seu serviço de origem com o daqueles que estão
ausentes do serviço por motivo de doença, gozo de licença de
parentalidade ou onde não foi colocado qualquer magistrado".O
SMMP alerta para a recusa de o Ministério da Justiça pagar aos
magistrados o valor devido pelas acumulações de serviço que têm sido
feitas desde 2019, data da entrada em vigor do novo Estatuto do MP, com
desrespeito pelo esforço acrescido dos mesmos. O
mesmo responsável argumentou que o quadro de pandemia de covid-19 ainda
se mantém e os serviços do MP continuam "a não dispor de condições
adequadas ao mesmo", designadamente existem secções de funcionários em
espaços exíguos, onde é manifestamente impossível manterem o
distanciamento recomendado pela Direção-Geral da Saúde, a falta de salas
próprias do MP para poderem ser realizadas diligências e de meios
próprios para a realização de diligências por meios de comunicação à
distância.Advertiu também que o fim das
moratórias para os créditos bancários previsto para 30 de setembro vai
arrastar muitos portugueses para situações de incumprimento, o que se
fará sentir ao nível do aumento do número de execuções (cobrança de
dívidas) ou mesmo de insolvências não só de sociedades como de pessoas
singulares."Já do ponto de vista criminal é
de prever que a aplicação dos fundos do plano de recuperação europeu
(“bazuca europeia”) derive em investigações criminais por uso indevido
ou apropriação indevida dos mesmos", previu o magistrado.A
ASJP por seu lado afirma - quanto ao reforço da transparência e
integridade na justiça - que "não desistirá de colocar na agenda do
Conselho Superior da Magistratura e do Conselho Superior dos Tribunais
Administrativos e Fiscais "discussão séria e profunda do plano de
reforço das medidas de prevenção e deteção de eventuais casos de
corrupção judicial".Quanto ao Plano
Nacional de Combate à Corrupção, Manuel Soares assegura que a ASJP vai
emitir um parecer e pedir para ser ouvida no parlamento sobre as
propostas de lei de combate à corrupção e de criminalização da ocultação
de riqueza adquirida no exercício de cargos públicos.Revelou
ainda que nas prioridades estará o ‘think tank’ Agenda da Reforma da
Justiça, tendo sido criado um grupo de trabalho que ao longo do próximo
ano vai "estudar, debater e formular propostas de reformas estruturais
no setor da justiça", dizendo que a ASJP está "consciente da necessidade
de debater reformas mais profundas na justiça e não se demitirá dessa
responsabilidade".Em março de 2022, a ASJP
pretende realizar as primeiras Jornadas Nacionais da Justiça
Administrativa e Fiscal, tendo sido criado um grupo de trabalho que vai
apresentar uma proposta de plano integrado de medidas para solucionar no
curto prazo "a situação dos intoleráveis atrasos processuais que ainda
se verificam naquela jurisdição".O
bastonário da OA, Luís Menezes Leitão, admitiu à Lusa que estes
profissionais estão "apreensivos com as consequências para os tribunais
do enorme aumento do número de litígios que se espera que surjam" no
novo ano judicial e que foram sendo adiados em virtude da pandemia,
considerando que "é inevitável que agora venham a aparecer em grande
número".Segundo disse, já começaram a
surgir sinais sérios da forma como a pandemia afetou as empresas, com o
anúncio de sucessivos processos de insolvência, incluindo em relação a
empresas emblemáticas para o país. "É
muito previsível que essas insolvências de empresas se venham a
multiplicar nos próximos tempos, com os inevitáveis litígios judiciais
daí resultantes. Também em relação aos particulares, o fim das
moratórias pode levar a que muitas famílias não consigam pagar as suas
dívidas, entrando por isso igualmente em insolvência", anteviu.
O bastonário espera também um "enorme aumento dos litígios laborais",
que, notou, já se encontra a ser antecipado pelo anúncio de sucessivos
despedimentos coletivos. "As novas regras
laborais que o Governo foi impondo durante a pandemia não têm sido
claras e o potencial de litígios delas resultante é enorme", disse,
notando ainda que nos tribunais cíveis também têm sido adiados muitos
litígios durante este período, sendo por isso previsível que venha
também a ocorrer agora um grande aumento de atividade destes tribunais. Para
Menezes Leitão, a situação é "preocupante, pois já se assiste agora à
marcação de julgamentos apenas para meados do próximo ano, pelo que se
pode vir a ter um grande aumento na duração dos processos judiciais".