Madeira apresenta reserva natural das Selvagens como “exemplo mundial”
Oceanos
21 de jun. de 2022, 10:22
— Lusa/AO Online
“Alargar a área
seria fácil, mas o que marca a diferença é o estatuto de proteção desse
alargamento, que é total até às 12 milhas em redor das ilhas”, disse à
agência Lusa Paulo Oliveira, vogal do conselho diretivo do Instituto das
Florestas e Conservação da Natureza (IFCN), organismo do governo
madeirense que tutela a reserva. O
novo regime jurídico das Selvagens, um subarquipélago da Madeira
localizado a cerca de 300 quilómetros a sul do Funchal, foi aprovado em
fevereiro no parlamento regional, decretando o alargamento da reserva
marinha de 92 para 2.677 quilómetros quadrados.Em toda esta área é agora proibida a pesca e qualquer outra atividade extrativa. Paulo
Oliveira sublinha tratar-se de um “passo de liderança muito importante”
ao nível das políticas de proteção e conservação da natureza. Será
apresentado como um “exemplo mundial” na Conferência dos Oceanos da
Organização das Nações Unidas (ONU), que decorre em Lisboa de 27 de
junho a 01 de julho.O
responsável explica, no entanto, que o novo regime jurídico potencia
algumas atividades económicas, como o turismo científico e de natureza,
já previsto desde 2017, com a revisão do Plano de Ordenamento e Gestão
das Selvagens. “A
dinâmica é grande. Existem já empresas [marítimo-turísticas] na Madeira
que vendem o produto Selvagens, um produto ‘gourmet’, normalmente para
grupos”, disse, indicando que 874 turistas e 22 investigadores visitaram
a reserva em 2019.Paulo
Oliveira realça que o turismo é “regrado”, com “controlo rigoroso” do
número de pessoas em terra e pernoita “muito restringida”. A
presença permanente na reserva de dois elementos do Instituto das
Florestas e Conservação da Natureza e três da Autoridade Marítima
Nacional é considerada “suficiente” para responder às exigências de
fiscalização, mas o responsável adianta que a capacidade vai ser
reforçada, provavelmente com recurso a drones. O
subarquipélago das Selvagens pertence à freguesia da Sé, no Funchal, e é
constituído por duas ilhas – Selvagem Grande e Selvagem Pequena – e
vários ilhéus, sendo reserva natural desde 1971, a primeira instituída
em Portugal.A
área terrestre é de 245 hectares e a vegetação rasteira, mas os 2.677
quilómetros quadrados de área marítima com proteção total conferem-lhe o
estatuto de maior reserva do Atlântico Norte e uma das maiores do
mundo, onde se destacam as aves marinhas, entre as quais a emblemática
cagarra. As
Selvagens são o território português mais a sul e, ao longo dos anos,
foram alvo de polémica entre Portugal e Espanha devido à questão da
delimitação da Zona Económica Exclusiva, situação que motivou várias
afirmações da soberania, como a visita de quatro Presidentes da
República: Mário Soares (1991), Jorge Sampaio (2003), Cavaco Silva
(2013), o único que pernoitou em terra, e Marcelo Rebelo de Sousa
(2016).Antes,
em 1982, o Governo da Madeira tinha já construído a estação de
vigilância permanente na Selvagem Grande e em 1994 foi instalada uma
casa abrigo da Selvagem Pequena, entretanto desativada e substituída por
vigilância remota, controlada pela Autoridade Marítima Nacional, que se
mantém em permanência na reserva desde 2016. Em
2003, foi instalado um posto oficial de correios na Selvagem Grande,
contribuindo para o reforço da soberania nacional, e atualmente existe
boa ligação por internet e telefone fixo. Ao
longo dos séculos, diversas espécies foram introduzidas nas Selvagens
por ação humana e depois tiveram de ser erradicadas, como a tabaqueira
(planta usada para lenha), os coelhos e os murganhos.No
século XX, as atividades predominantes eram a pesca e a caça à cagarra,
ave marinha que nidifica nas ilhas e cuja população baixou
drasticamente na década de 1960. Porém,
na sequência da primeira expedição científica ao subarquipélago, em
1963, Alexander Zino, cidadão inglês, adquiriu o direito de caça à
cagarra com o objetivo de pôr termo à atividade e simultaneamente
incentivar a criação da reserva.A população de cagarras começou então a crescer, tornando-se na espécie mais emblemática e mais estudada das ilhas.A
família Zino construiu uma casa na Selvagem Grande, em 1967, que
permanece propriedade privada e sobre a qual é cobrado o Imposto
Municipal sobre Imóveis.