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Luís Vasco Cunha acredita que o sucesso passa por “manter as portas abertas, muito em particular as da mente”

Chama-se Luís Vasco Cunha, tem 59 anos, é casado e pai da Carlota. Tem o 11º ano de escolaridade, PDE, pela AESE Business School, e "Leadership for XXI century", por Harvard. É o irmão mais velho dos sócios da empresa José Tomás da Cunha e Filhos, Lda.


Autor: Made in Açores

Como surge o mundo empresarial na sua vida?

A semente surge naturalmente, por via de avós que exploravam "mercearias e líquidos". Desde criança que a atividade nestas lojas sempre me fascinou, com um avô a permitir e até a incentivar todo o tipo de inovações, mesmo as mais absurdas. Na adolescência, vendi alhos e feijão cultivados pelo avô Tomás, exercício deveras rentável, pois no fim ficava com a totalidade do valor da venda. No auge da crise "pós sismo de 1980", um trabalho de férias escolares de Verão, num estabelecimento de venda de artigos de oferta, abre o caminho para um futuro que se estende até hoje.


De que forma é que o contexto familiar moldou o seu perfil e o seu caminho profissional?

Da forma mais profunda que pode existir. Desde a primeira hora, no Verão de 1982, que o percurso foi sempre acompanhado pela família, até porque foi o meu pai quem, contrariando a minha vontade de experimentar o trabalho de ser servente de pedreiro, sugeriu que fosse trabalhar para a Casa Vitória. Nas noites e nos fins-de-semana em que a loja ficava a meu cargo, tinham sempre a companhia do meu pai ou dos meus irmãos, apesar dos seus 11 e 9 anos de idade. Foram meses de trabalhar sete dias por semana, das 9 às 22h.


Três irmãos que herdam um património familiar considerável. Depois da partida do patriarca, como se consegue continuar esse legado de forma ativa, tendo os três perfis tão distintos?

De uma forma natural, até porque quando se fala em herança pensa-se sempre que existiu morte de alguém. Em primeiro lugar, o nosso pai continuará connosco diariamente e, em segundo lugar porque, objetivamente, a liderança do pai sempre se fez na sombra, isto é, passando toda a responsabilidade para nós. Os perfis distintos são o garante do equilíbrio, pois em todas as viaturas coexistem o pedal do travão com o do acelerador. Temos sabido manter esse equilíbrio, porque se tivéssemos preponderância no travão já teríamos sido largamente ultrapassados e adormecido no conforto da tranquilidade. Por outro lado, se o pé estivesse unicamente no acelerador, já nos teríamos despenhado durante uma das muitas tempestades a que sobrevivemos.


A José Tomás da Cunha e Filhos é a "mãe" de várias empresas de diversos ramos. Quais são essas áreas distintas?

Ao longo de quase 42 anos, já demos inúmeros passos em frente, muitos para o lado e alguns para trás, criando estruturas, alterando-as e encerrando-as. Hoje, somos o somatório dessas vivências.

A SUSIARTE mantém a sua matriz original, comercializando móveis e artigos decorativos, com uma área de exposição moderna e atrativa. Há vários anos que temos um Gabinete de Arquitetura, liderado pela Susana Cunha, com uma atividade intensa em obras domésticas e na área da hotelaria, onde temos importantes trabalhos concluídos e vários em fase de implementação.

Na atividade da SUSIARTE, inclui-se a exploração da galeria comercial Fórum Terceira, nascida de uma necessidade de congregar num mesmo espaço uma oferta variada que pudesse ser o centro da Terceira, um lugar onde as pessoas se pudessem encontrar.

A Bfashion procurou preencher uma lacuna na oferta de moda, numa gama média-alta, masculina e feminina, posteriormente alargada à moda desportiva.

Em São Miguel, a SUSIARTE começou pela distribuição de eletrodomésticos e eletrónica de consumo, atividade que continua. Em 2014, abriu a loja EXPERT, nos Valados, dedicada à venda a público de toda a gama de eletrodomésticos, ar condicionado e eletrónica. A distribuição de eletrodomésticos nos Açores é coordenada a partir de São Miguel.

Na Terceira, as lojas EXPERT, em Angra do Heroísmo e na Praia da Vitória, são complementadas com um vasto serviço de assistência técnica a eletrodomésticos, ar condicionado e informática.

A José Tomás da Cunha & Filhos, Lda, com designação comercial SUSIARTE, é a empresa detentora da maioria das ações da CODELPOR,SA, com sede em Benavente, que se dedica à comercialização de eletrodomésticos, eletrónica de consumo e telecomunicações, funcionando também como hub logístico.

Na Madeira, somos acionistas da empresa HN-Trónica,Lda., responsável pela distribuição dos nossos produtos neste arquipélago.

Com lojas na Terceira e Ponta Delgada, a WineExpert,Lda, dedica-se à distribuição e venda a público de vinhos, com especial foco em provas de vinhos que promovam e elucidem as dúvidas acerca do consumo de vinho.


Estreou-se recentemente no ramo do enoturismo. Esta é uma caminhada empresarial diferente?

Este é o primeiro negócio que acontece fora da JTC, pois trata-se de uma atividade exercida unicamente por mim e pela Madalena, minha mulher, embora conte com os apoios incensáveis dos meus irmãos. Este caminho é a combinação da cultura de uma vinha originalmente pertença da família da Madalena, à qual já juntámos outras, com o gosto pelo vinho, pela sua cultura e pelos Biscoitos em particular.

O projeto Materramenta tem por objetivo colocar em prática o amor aos Biscoitos e o gosto pelo vinho, procurando imprimir uma dinâmica sustentável


Como caracteriza o seu perfil de empresário?

Procuro ser exigente comigo e com os outros de forma a podermos superar os obstáculos e a criar oportunidades que nos permitam crescer. Hoje, tenho a certeza que a única forma de liderarmos de forma saudável é pelo caminho da partilha de responsabilidades com os membros das nossas equipas.

Tenho a forte convicção de que uma empresa é uma família de coração e que, como tal, há que ser gerida privilegiando os laços familiares. Somos um Grupo verdadeiramente inclusivo em termos de paridade de género, de religião ou de orientação sexual e isso é algo que nos orgulha e que é fruto do trabalho de todos nós, ao longo dos anos.

Tento ser justo e fazer crescer as pessoas dentro da nossa organização, em vez de ir procurar fora quem ocupe os lugares de topo.

Para os que acham que “meias é para as pernas”, recordo que “se queremos ir depressa vamos sozinhos, mas se queremos ir longe vamos acompanhados”.


Que características considera serem essenciais para ser empresário nos Açores nos dias de hoje?

A característica principal é ter a mente aberta e não pensar pequenino. As dificuldades arquipelágicas podem ser ultrapassadas e todas as moedas têm duas faces, precisam é ser ambas contempladas. O primeiro objetivo da maioria dos empresários é criar o seu próprio posto de trabalho e isso só pode ser conseguido com sucesso se tiverem muita perseverança e vontade de trabalhar. Confundem-se muito os conceitos de empresário e de empreendedor, entendo que todos, em todas as funções, podem ser empreendedores, mas nem todos têm perfil para serem empresários. Sem acreditar em si próprio, ninguém pode ser empresário.


O dístico Marca Açores traz vantagens para a divulgação e promoção dos produtos, nomeadamente o vinho Materramenta?

Em termos da Marca Açores, falta fazer quase tudo. Há algum tempo foi apresentado publicamente um projeto de reestruturação da Marca Açores, mas, até ao momento, nada se viu. Para que a Marca Açores seja uma mais-valia tem de haver muito mais exigência nos critérios e muita fiscalização, coisas que o poder político por norma não gosta de fazer, pois é mais fácil deixar rolar.


Estamos num tempo em que o turismo parece ser a resposta para todas as dificuldades económicas da região, o que falta fazer no apoio às empresas?

Falta o Governo e as autarquias perceberem que o que é dos privados deve ser deixado aos privados, sem constantes interferências públicas. Falta perceber que a atribuição de subsídios indiscriminadamente, muitas vezes atrofia o mercado. Os interesses politiqueiros não se podem sobrepor à livre economia. Falta haver uma verdadeira política de transportes marítimos, dentro e fora da Região, que vá além de grupos de estudo que, uma vez mais, fazem a montanha parir um rato, nado-morto. Falta as empresas serem vistas como parceiros e não como inimigos. Falta incentivar as boas práticas empresariais. Sobretudo, e o mais importante, faltam previsibilidade e estratégias. Não podemos continuar a ser geridos ao sabor de tempos eleitorais.


O que lhe falta concretizar enquanto empresário?

Com a idade que tenho, o mais importante é procurar ajudar a consolidar as nossas equipas para que se sintam realizados e felizes. Os desafios surgem diariamente e há que os ultrapassar, da melhor maneira possível. Até ao meu último dia de trabalho, haverá sempre muitas coisas por fazer, mas o que é verdadeiramente importante é poder desfrutar do trabalho diário. O objetivo é sempre manter as portas abertas, muito em particular as da mente.