Autor: LUSA/AO Online
Dos emigrantes-soldado aos "emigrantes de sonho", o primeiro romance
de Manuel do Nascimento inspira-se na história da emigração e surge após
48 anos a viver em França - mais do dobro daqueles que viveu em
Portugal - e depois de ter editado, em França, nove obras sobre História
de Portugal. Manuel do Nascimento contou à Lusa, em setembro, que
escreveu páginas que classifica como "uma narração simples", nas quais
deixou "palavras soltas das últimas férias ao país" e "principalmente
saudade". O livro nasceu de uma viagem a Lisboa, quando o
emigrante conheceu um mendigo cujo pai, o alferes Raimundo Marques,
participou na Primeira Guerra Mundial em França, entrou na Resistência
francesa na Segunda Guerra, "esteve com o general Charles de Gaulle
várias vezes e salvou o Hitler na Primeira Guerra sem saber que era
ele". A obra, editada em Portugal pelas Edições Colibri, parte da
vida deste soldado para percorrer a história contemporânea do país,
nomeadamente a emigração para França nos anos 1950, 1960 e 1970, a que
Manuel do Nascimento chama "emigração de sonho". "A maioria dos
nossos emigrantes que vieram naqueles anos tinha um sonho de encontrar
uma vida melhor em França, mas encontraram outras surpresas porque foram
morar para as barracas dos bairros de lata. Para muitos, esse sonho foi
muito triste", lembrou, exemplificando com os ‘bidonvilles' de
Champigny-sur-Marne, Saint-Denis e Aubervilliers. Ainda que não
tenha vivido nos bairros de lata, em janeiro de 1970, com 20 anos,
Manuel do Nascimento também rumou a França "a salto", numa viagem
negociada clandestinamente e a "três contos de reis, três meses de
ordenado". O objetivo era evitar a guerra colonial. Quando chegou a
França, trabalhou para uma empresa onde fazia "microfilmagem de
jornais, revistas e livros para a então Biblioteca Nacional de Paris" e
foi ao longo desses 15 anos, em contacto com as páginas de obras "muito,
muito antigas", que cultivou a paixão pela História e se dedicou à
escrita porque "nos manuais franceses nada existia sobre Portugal". "Antigamente,
eu era obrigado a tirar dias de férias para ir para as bibliotecas
fazer pesquisa. Ainda por cima, naquela altura a biblioteca da Fundação
Calouste Gulbenkian em Paris estava fechada aos sábados e tinha de tirar
dias durante a semana", continuou Manuel do Nascimento. Uma das
"grandes paixões" do autor é a Grande Guerra, tendo publicado,
nomeadamente, "Premiére Guerre mondiale (Centenaire 1914-2014) et la
main-d'oeuvre portugaise à la demande de l'État français" ["A Batalha de
La Lys" e "Primeira Guerra Mundial: Os soldados portugueses das
trincheiras da Flandres e a mão-de-obra portuguesa a pedido do Estado
francês"]. "Nem tudo acontece por acaso" vai ser apresentado por
Luísa Semedo, Conselheira das Comunidades Portuguesas e vencedora do
Prémio Literário e de Ilustração Eça de Queirós.