Juízes alertam Governo para perigo real que processos artificiais da AIMA representam
6 de out. de 2025, 16:42
— Lusa/AO Online
“Mais uma vez, assistimos a uma distorção da
realidade: os juízes são apontados como entrave à justiça, quando, na
verdade, somos nós que diariamente asseguramos que o sistema não colapsa
perante as falhas de outros. Os exemplos da AIMA falam por si. Milhares
de processos artificiais entopem os tribunais, não porque os cidadãos
litigam em excesso, mas porque a Administração falha no que lhe compete.
E é o poder judicial que fica exposto às críticas injustas de
ineficiência”, lê-se numa nota da ASJP enviada aos seus associados na
sexta-feira.Nessa mesma nota, a ASJP
rejeita que os juízes sejam responsabilizados: “Não aceitaremos que se
continue a responsabilizar os juízes por disfunções que não lhes
pertencem”.Na origem desta nota estão dois
ofícios enviados ao Governo, um ao ministro Adjunto e da Reforma do
Estado, Gonçalo Matias, e outro ao ministro da Presidência, António
Leitão Amaro, aos quais os juízes pedem uma intervenção face à “situação
insustentável que se vive no Tribunal Administrativo de Círculo de
Lisboa (TACL), decorrente da acumulação de dezenas de milhares de
processos diretamente relacionados com a AIMA.Na
carta ao ministro Gonçalo Matias a ASJP sublinha que estes processos
“têm origem quase exclusiva em falhas de funcionamento da AIMA, que
obrigam os cidadãos a recorrer aos tribunais para obterem simples
agendamentos ou atos administrativos básicos”, que geram uma “litigância
artificial” que congestiona o tribunal competente em Lisboa e “desvia
recursos essenciais” de outras áreas.Os
juízes defendem que a AIMA “deve constituir prioridade absoluta” na
reforma do Estado, “dado o seu impacto direto na sobrecarga dos
tribunais”, pelo que pedem que a reforma deste organismo “seja tratada
com caráter urgente e diferenciado”, uma vez que a situação atual
“constitui um perigo real para o funcionamento da justiça
administrativa, ameaçando seriamente a sua capacidade de resposta e a
confiança dos cidadãos nas instituições”.Ao
ministro Leitão Amaro, que tutela a AIMA, a ASJP reitera alertas
anteriores, apontando os “efeitos devastadores” para a justiça do
acumular de processos com origem em falhas administrativas do Estado,
nomeadamente os “atrasos generalizados em processos de enorme relevância
social e económica” em áreas como urbanismo, ambiente ou contratação
pública, para além dos impactos na “perceção de ineficiência da
justiça”.“A repetição deste alerta revela a
urgência da intervenção. É imperativo que o Governo, através do
ministério que V. Ex.ª dirige, adote medidas concretas e imediatas para
sanar as falhas da AIMA e restabelecer o normal funcionamento
administrativo, sob pena de continuarmos a assistir à degradação da
capacidade de resposta da jurisdição administrativa”, apelam os juízes
sublinhando o “caráter prioritário” do tema.Na
nota enviada aos associados a ASJP coloca-se “na linha da frente,
exigindo soluções concretas ao Governo e denunciando publicamente estas
situações”.“O nosso dever é julgar com
independência, imparcialidade e rigor — não substituir-nos a organismos
administrativos incapazes de cumprir a sua missão. É tempo de afirmar,
com clareza, que a dignidade da função judicial não se negocia nem se
deixa arrastar por perceções superficiais” conclui.