Jovens entre os mais penalizados numa “sindemia” que agravou desigualdades
Covid-19
27 de mai. de 2022, 11:16
— Lusa/AO Online
Agravamento da situação
daqueles que já eram vulneráveis, teletrabalho sobretudo para a classe
média alta, e um peso económico particularmente elevado sobre os jovens.
Estas são algumas das conclusões do mais recente estudo da Fundação
Francisco Manuel dos Santos.Intitulado “Um
novo normal? Impactos e lições de dois anos de pandemia em Portugal”, a
investigação olhou para as marcas de dois anos de pandemia deixadas nos
portugueses, em termos económicos, sociais e políticos.Desenvolvido
em duas fases – entre março e maio, e entre setembro e outubro de 2021 –
o estudo é o resultado de um total de 3.463 entrevistas que confirmaram
que a pandemia não foi igual para todos.“Embora
a covid-19 possa ser comparada a uma tempestade inesperada, não é
verdade que estejamos todos no mesmo barco. A doença e as medidas
implementadas para conter e mitigar o impacto da sua rápida propagação
tiveram efeitos colaterais desiguais e mais gravosos entre grupos
específicos da população”, refere o estudo.Por
esse impacto desigual, que ultrapassa o campo da saúde, os
investigadores preferem antes falar numa “sindemia” para refletir a
forma como a covid-19 interagiu também com as condições sociais e
económicas do país.Exemplo disso são os
efeitos da covid-19 na vida dos jovens, simultaneamente o grupo menos
vulnerável à doença e um dos mais afetados em termos económicos, ao
contrário do que antecipavam.“O Portugal
pandémico não é um país para jovens”, refere o estudo, que destaca a
perda de emprego, mas também o impacto das medidas restritivas sociais
na saúde e no bem-estar, que pesaram de forma significativa sobre aquele
grupo.Apesar da reduzida incidência de
contágio grave e de mortalidade pela covid-19 entre os jovens,
acrescenta o documento, “a análise dos efeitos indiretos da pandemia
permitem revelar esta face oculta da crise sanitária”.Por
outro lado, os investigadores referem que, além dos jovens, os impactos
negativos da pandemia foram também particularmente sentidos pelos
grupos que já eram considerados vulneráveis, designadamente as mulheres e
as classes sociais baixas.Essa
desigualdade foi visível, por exemplo, no caso do teletrabalho, a
solução adotada por muitas empresas no início da pandemia, em março de
2020, para que conseguissem continuar a funcionar, mas que não foi
possível para todos.De acordo com os
resultados, 68% dos indivíduos que dizem pertencer à “classe baixa” e
48% dos indivíduos que dizem pertencer à “classe média-baixa”
trabalharam presencialmente entre 2020 e 2021, enquanto a maioria dos
indivíduos de “classe média-alta” trabalhou integralmente à distância
(36%) ou em modo misto (46%).Sem apontar
uma explicação, o relatório refere também que, se para as classes média e
média-alta aquele período da pandemia foi uma oportunidade de reforçar
as poupanças, para as classes baixa e média-baixa foram mais frequentes
as situações de instabilidade financeira.No
que toca ao equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal, as conclusões
apontam que a sobreposição entre locais de lazer, trabalho e estudo, em
particular durante os períodos de confinamento, acabaram por gerar
níveis acrescidos de conflito.“Estes
conflitos emergiram durante a pandemia com prejuízo para ambas as
dimensões, mas sendo especialmente nocivo para as famílias, isto é, a
vida pessoa”, referem os investigadores.Ainda
assim, “as famílias portuguesas apresentaram maiores níveis de coesão
entre os seus membros do que de conflito” e a divisão do trabalho
doméstico foi, sobretudo, igualitária. Por
outro lado, a digitalização a que confinamento obrigou acarretou alguns
desafios, como a falta de equipamento em casa para a realização do
trabalho, referida por mais de 30% dos inquiridos, e também para a
atividade escolar dos filhos (mais 40%), a fraca qualidade da Internet
(mais de 20%) e a falta de espaço ou privacidade para trabalhar (mais de
15%).“De uma forma geral, foram as
mulheres e os inquiridos de classe social baixa quem demonstrou uma
maior vulnerabilidade nestas dimensões tecnológicas de digitalização do
trabalho”, refere o estudo.