Igreja Católica em Portugal está num “ponto sem retorno” no combate aos abusos
14 de mar. de 2023, 18:45
— Lusa
Em
comunicado divulgado no final da reunião do Conselho Permanente, que
decorreu em Fátima, os bispos que integram a CEP asseguraram que a
Igreja irá continuar “a trabalhar, dando atenção aos muitos indicadores
que estão presentes no Relatório Final” da Comissão Independente para o
Estudos dos Abusos Sexuais de Menores na Igreja Católica em Portugal,
apresentado em 13 de fevereiro.“O caminho
que a Igreja em Portugal está a percorrer, seguindo os passos de um
processo que o Papa Francisco indicou para toda a Igreja e que tem por
objetivo essencial proteger as vítimas e garantir a segurança e
confiança nos ambientes da Igreja Católica, abre portas à esperança e ao
compromisso para que comportamentos e atitudes do passado não se voltem
a repetir”, acrescenta o comunicado do Conselho Permanente da CEP.O
Conselho Permanente da CEP acrescenta que as vítimas de abusos sexuais
na Igreja Católica em Portugal continuam a ser a “prioridade em todo
este processo”, reafirmando a “disponibilidade para acolher e escutar as
vítimas que o desejarem”, mantendo “o firme compromisso de assumir as
(…) responsabilidades e disponibilizar às vítimas todas as ajudas
necessárias para o seu acompanhamento espiritual, psicológico e
psiquiátrico, e outras formas de reparação do crime cometido”.“Estamos
a encetar contactos para a criação de um grupo responsável pelo
acolhimento e acompanhamento das vítimas. Este grupo operativo, com
caráter de autonomia, constituído por pessoas que garantam credibilidade
e confiança perante as vítimas, será articulado com a Equipa de
Coordenação Nacional e com as Comissões Diocesanas de Proteção de
Menores e Adultos Vulneráveis”, adiantam, confirmando uma medida que já
havia sido anunciada em 03 de março.Na
reunião de hoje, foi feito um reconhecimento do “trabalho realizado
pelos bispos e administradores diocesanos em relação aos suspeitos de
abusos, nomeadamente quanto à identificação de situações ainda não
esclarecidas, com a ajuda da ex-Comissão Independente e do Grupo de
Investigação Histórica dos arquivos”, refere o comunicado.“Quando
for entregue em finais de abril à Conferência dos Institutos Religiosos
de Portugal (CIRP), a lista com os nomes dos alegados abusadores
relativos aos Institutos de Vida Consagrada terá o devido seguimento por
parte dos Superiores Maiores das congregações”, acrescenta a nota,
informando que a reunião de hoje contou com a participação online de
alguns membros da Comissão Independente que foi liderada pelo
pedopsiquiatra Pedro Strecht.Entretanto,
as diretrizes da CEP sobre o abuso de menores e adultos vulneráveis
“estão a ser revistas tendo em conta as sugestões e recomendações do
Relatório Final, à luz do manual de procedimentos (Vademecum) da Santa
Sé, revisto em junho de 2022, o qual define o tratamento destes casos e
que é seguido por todos os responsáveis eclesiásticos”, anunciou o
Conselho Permanente, adiantando que “a ‘tolerância zero’ perante as
situações de abusos é assumida pela CEP, respeitando a autonomia de cada
diocese”.Com as comissões diocesanas de
proteção de menores e adultos vulneráveis, criadas por determinação do
Papa Francisco, em processo de reestruturação com vista a integrarem
apenas leigos, os bispos asseguram que “estas são organismos da Igreja
(…) cada vez mais capacitadas para o adequado tratamento da problemática
dos abusos de menores”.O comunicado tem
ainda espaço para uma referência às "reações dos católicos e de outros
membros da sociedade portuguesa às decisões tomadas na Assembleia
Plenária extraordinária de 03 de março”, que se saldaram em muitas
críticas, desde logo do Presidente da República.“Gostaríamos
de agradecer e dizer que valorizamos o escrutínio público. Estamos
totalmente disponíveis para caminhar com toda a sociedade na erradicação
do drama dos abusos sobre menores, no apoio permanente às vítimas e no
julgamento dos agressores. Lamentamos que, diante da complexidade do
tema, nem sempre tenhamos comunicado as nossas intenções com clareza”,
afirmam os bispos no comunicado de hoje.O
documento confirma ainda outras ações anunciadas em 03 de março, como “o
propósito de realizar um memorial e uma jornada nacional de oração
pelas vítimas de ‘abusos sexuais, de poder e de consciência na Igreja’”
em 20 de abril, dia em que termina a próxima Assembleia Plenária da
Conferência Episcopal Portugal, que se realizará em Fátima a partir do
dia 17 desse mês.A Comissão Independente
para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica validou
512 dos 564 testemunhos recebidos, apontando, por extrapolação, para um
número mínimo de vítimas da ordem das 4.815.Vinte
e cinco casos foram reportados ao Ministério Público, que deram origem à
abertura de 15 inquéritos, dos quais nove foram já arquivados,
permanecendo seis em investigação.Estes testemunhos referem-se a casos ocorridos entre 1950 e 2022, período abrangido pelo trabalho da comissão.Na
sequência destes resultados, algumas dioceses decidiram já afastar
cautelarmente do ministério alguns padres, nomeadamente Angra, nos
Açores (dois padres), Évora (um), Guarda (um), Braga (um) e Vila Real
(um).