O Ingenuity (Engenho),
que pesa cerca de 1.800 gramas, transportou um fragmento de tecido das
asas que protagonizaram outro voo histórico: o do avião dos irmãos
Wright, que fez o primeiro voo controlado registado na História, em
1903."Os dados do altímetro confirmam que o
Ingenuity fez o seu primeiro voo. O primeiro voo de um aparelho
propulsionado noutro planeta", afirmou o controlador do helicóptero,
Havard Grip, numa comunicação emocionada e aplaudida entusiasticamente
pelos seus colegas da agência espacial norte-americana.Os
controladores de voo na Califórnia confirmaram a breve viagem do
Ingenuity, que custou cerca de 85 milhões de dólares, pelos dados que
receberam da sonda Perseverance, que ficou a cerca de 65 metros de
distância.O voo era considerado de alto risco, mas também altamente recompensador, se tivesse êxito."Cada
mundo só tem direito a um voo inaugural", afirmou a responsável da NASA
pelo projeto do helicóptero, Mimi Aung, que chamou à experiência do voo
um "sonho supremo".Aung e a sua equipa
tiveram que esperar durante mais de três horas para saber se o voo
pré-programado tinha ocorrido com sucesso, à espera que os dados da
sonda fizessem a viagem de 287 milhões de quilómetros entre a Marte e a
Terra.Aplausos e risos soaram pelo centro
de operações quando se concluiu que o Ingenuity tinha conseguido,
reforçados quando chegou à Terra a primeira imagem a preto e branco da
sombra que o Ingenuity projetou na superfície do planeta enquanto voava.De
seguida, chegaram imagens a cores tiradas pela sonda do 'helicóptero' a
aterrar. Há uma semana, um erro de programação tinha impedido esta
pequena viagem de acontecer, obrigando os engenheiros da NASA a
arranjarem uma solução para o problema.A
NASA tinha apontado para um voo de 40 segundos. Embora ainda não sejam
conhecidos todos os pormenores da operação, todos os objetivos foram
conseguidos: as pás rodaram, houve descolagem, voo, descida e aterragem.Para
conseguir desempenhar a tarefa, as duas pás de rotor, que giram em
sentidos contrários, precisaram de chegar a 2.500 rotações por minuto,
cinco vezes mais do que seria preciso para o mesmo efeito na Terra.A
atmosfera de Marte tem apenas 1% da densidade da da Terra e os
cientistas tiveram que construir um helicóptero suficientemente leve e
com pás a girar na velocidade certa para gerar a força ascensional
necessária.Ao mesmo tempo, o aparelho foi construído para suportar o frio extremo e o vento na superfície do planeta.O
Ingenuity demorou mais de seis anos a construir. Tem cerca de meio
metro de altura e é suportado por quatro pés. A fuselagem, que tem
baterias, sensores e aquecedores, é do tamanho de uma caixa de lenços de
papel.As peças com maior dimensão são as pás do rotor: cada par mede 1,2 metros de diâmetro.O aparelho tem ainda um painel solar para carregar as baterias, o que é essencial nos 90 graus negativos das noites marcianas.A pista de aterragem escolhida pela NASA é uma área de terreno relativamente desimpedida com cem metros quadrados.O
programa de atividades da NASA para o Ingenuity inclui mais cinco voos,
cada vez mais ambiciosos. Se tiverem sucesso, o futuro poderá levar à
criação de uma frota de 'drones' marcianos nas próximas décadas, que
poderão fazer missões de reconhecimento e servir como transportes.O
desenvolvimento deste tipo de tecnologia poderá ter também aplicações
na Terra, servindo para criar helicópteros capazes de navegar a grandes
altitudes e a desempenhar missões em locais como a cordilheira dos
Himalaias.Por ter chegado a Marte acoplado
à "barriga" da sonda Perseverance, os cientistas da NASA deram-lhes
alcunhas. A "irmã mais velha" que levou o Ingenuity para o planeta é
Ginny e o helicóptero que hoje se estreou é Percy, nomes de personagens
do universo dos livros de Harry Potter.