Habitantes da ilha de Santa Maria mantêm tradição do milho cozido
1 de nov. de 2024, 10:49
— Lusa
Na ilha de Santa Maria existe a tradição secular de os seus habitantes cozerem grão de milho para consumo nesta data.“Dia
de Todos os Santos que não tenha milho cozido, não parece ser Dia de
Todos os Santos, é a tradição. A gente está sempre à espera daquela
altura do ano [os Santos] para cozer o milho. Sempre me lembro de ser
assim”, disse hoje à agência Lusa Ana Braga, de 61 anos.Esta
habitante da ilha de Santa Maria desconhece a origem da tradição, mas
cumpre-a anualmente neste dia, dando continuidade ao hábito que recebeu
da mãe e da avó.Ana Braga contou que põe
sempre o milho de molho, em água, “uns dois dias” antes do consumo, “que
é para ele ficar mais inchado, para cozer melhor” na panela.“[O
cereal] leva ainda umas boas horas a cozer e vai-se sempre pondo água,
porque a água vai acabando e, depois, quando ele está todo aberto, vê-se
que ele está cozido e come-se”, explicou.O
“milho dos Santos” não leva qualquer tempero na cozedura e o sal é
adicionado “quando a gente está comendo”: “Por acaso eu gosto com sal,
mas o sal é posto na hora em que a gente está comendo”.Segundo a moradora, o cereal é consumido ao longo do Dia de Todos os Santos e a qualquer hora.“As pessoas comem ao lanche ou de manhã. Por acaso a gente [aqui em casa] costuma comer ao lanche ou à noite, ao serão”, disse.Este ano, Ana Braga espera cozer três quilos de milho “para dar para várias pessoas” e para oferecer a uma amiga “que não coze”.A
venda de milho para o Dia de Todos os Santos foi incentivada há cerca
de três anos pela Agromariensecoop - Cooperativa de Produtores
Agropecuários da Ilha de Santa Maria e a sua procura “tem vindo a
crescer”, segundo o presidente da direção.“Nós
[cooperativa], como temos por missão também apoiar as produções locais,
temos alguns produtores, já poucos, infelizmente, que produzem milho e
ajudamos desta forma a escoar e a vender esse milho e, por outro lado, a
promover a tradição do milho cozido pelos Santos”, disse hoje Duarte
Moreira à Lusa.A cooperativa vende sacos com um quilo de milho por 3,90 euros a unidade.A venda começou há cerca de três anos e “tem vindo a crescer”.“Este ano já é o ano em que vendemos mais milho”, contou.Pelas
contas do dirigente, nesta época, na ilha de Santa Maria, são
atualmente vendidas “duas ou três centenas de quilos de milho” pelos
produtores, nas superfícies comerciais e na loja da Agromariensecoop.O cereal comercializado para este fim “é um milho tradicional dos Açores, é um milho antigo”.“Não
é dos milhos híbridos, não é do milho que se faz para a alimentação do
gado, do milho híbrido. É um milho de uma variedade que chamamos a
variedade regional. É um milho branco, grado, o grão é grande e é um
milho que ainda vai subsistindo na nossa ilha”, especificou.Duarte
Moreira referiu que há outras ilhas do arquipélago que têm a mesma
variedade de milho, “se bem que ele tem vindo a desaparecer com a
entrada dos milhos híbridos mais produtivos, mais resistentes às
condições climatéricas e também pelo facto de os Açores serem uma região
de produção de gado, leite e carne, [são] milhos adaptados à silagem”.Com
a evolução do setor agroalimentar, e por os habitantes da ilha terem
deixado praticamente de fazer pão em casa, “os milhos regionais, menos
produtivos, tiveram tendência a desaparecer” e a cooperativa tem “por
missão ir preservando esses milhos”, acrescentou.A
ilha de Santa Maria é a terceira mais pequena do arquipélago e em 2023
tinha 5.418 habitantes, de acordo com a base de dados Pordata.A tradição de comer milho cozido pelos Santos também se estende a outras ilhas açorianas.