'Habeas corpus' relativo a infetado "não teve saúde pública em conta"
Covid-19
27 de ago. de 2020, 15:03
— Lusa/AO Online
"É uma
decisão que naturalmente, sendo uma decisão do tribunal, deve ser
respeitada, mas é uma decisão que claramente não tem a defesa da saúda
pública em conta", declarou o chefe do executivo açoriano, Vasco
Cordeiro.O governante falava aos
jornalistas no dia em que se soube que o Tribunal Judicial da Comarca
dos Açores considerou procedente uma providência de ‘habeas corpus’
interposta na segunda-feira por quatro cidadãos alemães “privados da
liberdade”, um dos quais com resultado positivo à covid-19. Sem
querer alongar-se nos comentários, Vasco Cordeiro lembrou apenas que a
decisão judicial versa "sobre a validade de uma abordagem" defendida
pela autoridade de saúde nacional e segue recomendações da própria
Organização Mundial de Saúde, nomeadamente as referentes ao isolamento
de pessoas infetadas com o novo coronavírus.Segundo
o comunicado divulgado pela autoridade judicial, foi considerado que os
turistas em causa foram “privados da liberdade sucessivamente em duas
unidades hoteleiras da ilha de São Miguel”, aonde chegaram em 01 de
agosto, oriundos da Alemanha.No seu país,
nas 72 horas anteriores, “tinham realizado um teste” para determinar se
eram portadores do vírus que origina a covid-19, tendo o resultado sido
negativo.Os cidadãos entregaram cópias à
Autoridade Regional de Saúde no aeroporto de Ponta Delgada. Em 07 de
agosto, duas cidadãs realizaram um segundo teste e os restantes
fizeram-no três dias depois.Uma das
mulheres deu positivo e, de acordo com o tribunal, “foi-lhes dada, a
todos, ordem de isolamento profilático subscrita pelo delegado de Saúde
de Lagoa, de 08 a 22 de agosto, mas que permanecia em execução” no dia
da decisão sobre o pedido de ‘habeas corpus’, quarta-feira (26).A
instância judicial adianta que “uma das cidadãs internadas padeceu,
durante este tempo, de doença e por isso, todavia sem sucesso, pediu
auxílio através do número disponibilizado pela Autoridade Regional de
Saúde”.No dia posterior, após questionarem
um funcionário do hotel, foi-lhes transmitido que nenhum deles se
poderia ausentar do respetivo quarto. Para
o tribunal, a decisão de “privação de liberdade promanada da Autoridade
Regional de Saúde assentou apenas em circulares normativas emitidas
pela mesma e pela Direção-Geral da Saúde” que “consubstanciam
orientações administrativas não vinculativas para os requerentes, mas
apenas para as mencionadas autoridades e respetiva cadeia hierárquica”.O
Tribunal Judicial da Comarca dos Açores aponta que aos cidadãos
requerentes “nunca foi transmitida qualquer informação, comunicação,
notificação, como é devido nos termos da Convenção Europeia dos Direitos
do Homem, na sua língua materna”.“Nem a
privação da liberdade foi, entre o seu início, em 08 de agosto, e a data
da submissão para apreciação do ‘habeas corpus’, sujeita a qualquer
escrutínio judicial”, daí que se tenha decidido proceder à extração de
certidão do processado com remessa para o Ministério Público para
“eventual instauração de procedimento criminal”, refere a nota
divulgada.Este não é um caso isolado nos
Açores, uma vez que em 14 de agosto o Tribunal Judicial da Comarca dos
Açores ordenou a libertação de duas cidadãs que interpuserem um ‘habeas
corpus’ após lhes ter sido decretada quarentena por terem viajado em
lugares próximos de um infetado com covid-19.Também
em 27 de julho, o tribunal decidiu declarar procedente o 'habeas
corpus' interposto por três cidadãos “privados da liberdade” desde 24 de
julho numa unidade hoteleira da ilha Graciosa, no âmbito da covid-19.Em
05 de agosto, ficou a saber-se que o Tribunal Constitucional considerou
que as autoridades açorianas violaram a Constituição ao impor a quem
chegasse à região uma quarentena obrigatória de 14 dias por causa da
pandemia da covid-19.A decisão surgiu na
sequência de um recurso interposto pelo Ministério Público (MP) a uma
decisão judicial de libertar um homem que se queixou da quarentena
imposta.Depois da decisão do tribunal de
primeira instância, o MP recorreu para o TC, mas os juízes do Palácio
Raton consideraram, na decisão datada de 31 de julho, que “todas as
normas disciplinadoras de um direito liberdade ou garantia carecem de
uma autorização prévia da Assembleia da República”, exigência que “ganha
particular relevância quando estão em causa compressões ou
condicionamentos a um direito”.