Greves e fechos de blocos de partos e urgências marcaram o ano na Saúde
2023
18 de dez. de 2023, 09:31
— Lusa/AO Online
O Plano Nascer em
Segurança, que surgiu em dezembro de 2022 e começou por ser uma resposta
às dificuldades de funcionamento no período de natal e ano novo,
reorganizando a resposta na Obstetrícia e Ginecologia, acabou por se
estender a 2023. As alterações causaram
polémica, com os utentes a contestarem o encerramento em muitas
situações. No caso do maior hospital do país - Santa Maria (Lisboa) – a
necessidade de construir uma nova maternidade acabou por ditar as
mudanças, transferindo serviços para o Hospital São Francisco Xavier,
mesmo com grande contestação dos profissionais.
Em Santa Maria, a polémica levou ao afastamento da direção do
Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina de Reprodução, que
incluía Diogo Ayres de Campos, que coordenou a comissão de
acompanhamento de resposta em urgência de ginecologia, obstetrícia e
bloco de partos ainda no mandato da ministra Marta Temido.
A reorganização das urgências começou pela Obstetrícia e por ser
provisória, mas acabou por se estender a outras especialidades, que hoje
integram o plano de resposta na rede de serviços de urgência desenhado
pela Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS) e que
entrou em vigor em novembro. Quando
anunciou este plano, que é revisto semanalmente, a direção executiva
assumiu que a reorganização era imposta pela falta de meios para uma
resposta plena dos serviços, sobretudo depois das minutas que milhares
de médicos entregaram ao longo do ano a rejeitar fazer mais do que as
150 horas extraordinárias previstas na lei. Este protesto ganhou força com o aparecimento do Movimento Médicos em Luta, que promete não baixar os braços.
A necessidade deste plano para as urgências mostrou bem as limitações
provocadas por décadas de desinvestimento na Saúde, com falta de
valorização dos profissionais e de investimento em condições de
trabalho, o que faz com que uns fujam para o privado e outros emigrem,
no meio de uma classe que tem visto centenas de médicos reformarem-se
todos os anos. Aliás, a carreira médica
continua a ser tão pouco atrativa que em novembro ficaram por preencher
um número recorde de vagas para o internato da especialidade. Foram mais
de 400, mais do dobro do ano anterior, grande parte delas em Medicina
Interna, uma especialidade central nos serviços de urgência.
A Ordem dos Médicos, este ano com um novo bastonário, tem insistido na
necessidade de valorizar o trabalho médico e manter a qualidade da
formação médica. A este respeito, o bastonário chegou mesmo a criticar o
diploma aprovado pelo Governo para agilizar o reconhecimento de
competências de médicos estrangeiros, prometendo que a Ordem “não vai
facilitar”. Foi um ano de luta intensa dos
médicos, com negociações que já vinham do ano passado e que só
parcialmente viram a luz do dia e já no final de novembro - à beira da
aprovação do Orçamento do Estado -, quando o Governo chegou a um “acordo
intercalar” com o Sindicato Independente dos Médicos. A Federação
Nacional dos Médicos rejeitou assinar, considerando o acordo
discriminatório. Ainda quanto aos médicos, o Governo fez aprovar o diploma relativo à dedicação plena, sem o acordo dos sindicatos.
Foi igualmente este ano, que fecha com uma polémica sobre alegadas
pressões políticas para o tratamento de duas gémeas luso-brasileiras no
Santa Maria, que a Direção Geral da Saúde mudou de mãos: saiu Graça
Freitas e entrou Rita Sá Machado. Com a
DE-SNS a exercer em pleno, finalmente com estatutos aprovados, foi
também um ano em que houve uma redefinição da organização do SNS, que
levará ao desaparecimento das Administrações Regionais de Saúde, com as
funções operacionais transferidas para as Unidades Locais de Saúde
(ULS), que integram hospitais e centros de saúde de uma região na mesma
instituição, com autonomia administrativa e financeira.
No acesso ao sistema, foi igualmente este ano que o Governo decidiu
alargar o modelo B (pagamento por objetivos) a todas as Unidades de
Saúde Familiar. Contudo, as propostas do
Governo para regular o funcionamento das USF modelo B não são pacíficas
e, em outubro, mais de mil médicos de família já tinha assinado uma
carta de contestação. Atualmente, há mais
de 1,5 milhões de portugueses sem médico de família, um número que o
Governo do PS não conseguiu baixar, apesar das promessas eleitorais.