Greve dos funcionários judiciais com adesão acima dos 90%, diz sindicato
2 de set. de 2023, 00:04
— Lusa /AO Online
Segundo António Marçal, presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ), em alguns locais do país hoje viveu-se “uma calma típica de cemitério”, devido ao encerramento dos tribunais.“Atendendo a que os grandes tribunais estiveram fechados, estimamos em muito acima dos 90% a adesão à greve. Nós só teremos a real dimensão do que se poderia ter passado hoje na próxima semana, quando efetivamente houver necessidade de tramitar e colocar em execução algumas das coisas que deveriam ter sido executadas hoje”, disse António Marçal à Lusa, num balanço do dia de greve, que marcou o regresso das férias judiciais.Entre o que foi adiado pela greve de hoje está a execução da lei da amnistia, aprovada por ocasião da vinda do Papa a Portugal, em agosto, e que entrou hoje em vigor, tendo gerado polémica ao longo desta semana entre a magistratura e sindicatos de oficiais de justiça por um ofício da Direção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ), assinado pela diretora-geral, a juíza desembargadora Isabel Namora, no qual se emitiram orientações classificadas pelos juízes como uma interferência na esfera reservada da independência judicial.Para António Marçal, esta é uma questão que Ministério da Justiça (MJ), conselhos superiores da magistratura e até a Assembleia da República “terão de analisar de forma muito fria”.“Qualquer que seja a motivação para o ofício da DGAJ, ele é de qualquer das formas grave. É grave se foi uma tentativa de interferência na esfera da independência do poder judicial, mas é também grave se isso tentou ser uma forma de gorar um direito constitucionalmente garantido aos trabalhadores, que é o direito à greve. Qualquer das motivações merece censura e merece ser alvo de uma análise cuidada e ponderada, para que pelo menos não se repitam situações destas”, defendeu o presidente do SFJ.A tentativa de minorar os impactos da greve de hoje com o ofício da DGAJ – que determinava a realização as diligências necessárias para a tramitação dos processos, incluindo a emissão de mandados de libertação até quinta-feira, para que a sua execução pudesse ter efeitos a partir de hoje – foi uma das questões levantadas num conjunto de três remetido pelo grupo parlamentar do PSD à ministra da Justiça Catarina Sarmento e Castro na quinta-feira.No mesmo dia, o Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ) veio pedir ao Conselho Superior da Magistratura (CSM) que faça cessar a comissão de serviço da diretora-geral da DGAJ, o que na prática se traduziria na saída do cargo. A DGAJ reagiu à polémica por comunicado, no qual defendeu o ofício como um instrumento que pretendia apenas acautelar a identificação de processos abrangidos e executar a lei em tempo útil.Mais do que uma questão de demissão do cargo, António Marçal olha para a polémica como “uma questão de políticas”: “A experiência vai-nos dizendo que há muitos atos praticados no setor da Justiça que podiam ter tido uma análise cuidada da parte de quem manda do lado do Governo”.O presidente do SFJ põe a ênfase na resolução dos problemas da classe, sublinhando que a preocupação se centra em aspetos como a certeza de que os 200 oficiais de justiça que hoje aceitaram tomar posse “tenham condições para pagar as suas despesas ao fim do mês”, referindo ainda que a adesão à greve de hoje “demonstra a insatisfação dos trabalhadores face à desconsideração a que estão a ser votados pelo Ministério da Justiça”.Sobre o anúncio de que “nos próximos dias” será publicado no Boletim do Trabalho e Emprego o projeto de revisão dos estatutos profissionais dos oficiais de justiça, António Marçal sublinhou que o sindicato ainda desconhece a proposta.“Aquilo a que assistimos hoje foi a mais um anúncio. Ainda não vimos nada. Estaremos calmamente a aguardar que esse documento nos seja entregue para analisar e entretanto mantém-se o calendário de greves que foram aprovadas no dia 14 de julho”, disse.“Assim que o MJ começar a apresentar propostas concretas, nós cá estaremos para pôr fim à luta e analisar e negociar sem nenhuma reserva mental aquilo que melhor sirva os trabalhadores e também o sistema de Justiça em Portugal”, acrescentou.O dia de greve de hoje termina com a garantia de que a próxima semana arranca com novas paralisações, que vão decorrer em todo o país, em diferentes formatos, e à qual se junta, na segunda-feira, uma greve nacional, ao longo de todo o dia, convocada pelo SOJ.“Nós fechámos antes das férias judiciais com uma greve, estamos a reabrir infelizmente com uma nova greve e esperamos que o MJ, ao fim de todos estes meses de contestação, comece finalmente a dar respostas àquelas que são as nossas reivindicações que o próprio MJ diz que são justas e razoáveis”, disse António Marçal.