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Fortunato Garcia, produtor do vinho Czar: “Dar continuidade ao legado do meu pai foi e continua a ser uma honra”

Fortunato Garcia, natural de São Roque do Pico, nasceu em 1966. O filho mais novo de José Duarte Garcia deu continuidade à produção de vinho, iniciada pelo seu pai, e colocou o verdelho Czar num patamar nunca antes sonhado



Autor: Made in Açores

Professor, músico e empresário. O Fortunato Garcia herdou um pouco de tudo e é muito de cada?

Professor, tal como meus pais, profissão que, hoje em dia, não tem o mesmo reconhecimento que teve outrora, pois a sociedade deixou de reconhecer que sem professores não existe educação. No entanto, fui por gosto e por vocação. Ser músico é o meu “stress relief”. Faz bem à alma, ajuda a acalmar os ânimos e a distrair dos problemas. Empresário... comecei com a discoteca Skipper, em Santo António, mas, após 16 anos de noite e com o falecimento do meu pai, fechei esse capítulo e passei a dedicar-me aos vinhos Czar.


A produção de vinho começou pelo seu pai. Acompanhou-o desde o início?

Nasci quando ele comprou a vinha na Criação Velha, numa zona mais tarde classificada como Património da Humanidade, pela UNESCO. Sim, pode dizer-se que acompanhei desde o início. A partir dos cinco anos de idade, já ia para a vinha ajudar, no que podia.


Quando é que passa a ser, realmente, o responsável? Foi algo natural?

Quando interrompo a universidade, em 1989, passo a ajudar em tudo na adega. Teve de ser, visto que eu e os meus amigos bebíamos uma boa parte do vinho do meu pai. Do ter de ser a gostar de fazer, foi bastante rápido. Com a idade de meu pai avançando, as minhas responsabilidades de adegueiro foram aumentando. Com o falecimento dele, em 2007, é que foi decidido, entre mim e os meus dois irmãos, por eu ser o mais bem preparado para dar continuidade ao legado do nosso pai. Em 2008, produzo o primeiro Czar sem ele.


O Czar dá um grande salto em termos de visibilidade graças à produção de 2009, que chega ao mercado em 2017 com uma embalagem carimbada pela Vista Alegre. Como foi esse processo?

Uma das barricas de 2009, ao contrário de todas as outras, continuou a sua fermentação até à vindima de 2010. De oito a dez meses é normal mas 12 meses, em fermentação, não tinha registo.

Ao enviar o vinho para laboratório, as análises deram 20,1 de volume de álcool adquirido, sem nenhum tipo de enriquecimento; ou seja, totalmente natural. Essa barrica foi engarrafada, separadamente, e deu 205 garrafas. Segundo Edward Korry, professor de Enologia da Universidade de Rhode Island, dos Estados Unidos da América, tratou-se do “único vinho conhecido do mundo que, naturalmente, tenha atingido 20 graus”, pelo que passou a ser um Czar de promoção. Poucas garrafas foram vendidas.

Em 2017, visto ter um vinho considerado impossível e único no mundo, decidi fazer, com o resto das garrafas existentes, um lançamento em garrafa premium, de cristal, Vista Alegre. Somente restava vinho suficiente para se fazerem 75.

Foi uma decisão difícil, principalmente devido ao preço de cada garrafa, mas acreditei que era chegada a hora de colocar o Czar no mundo dos vinhos premium. As últimas 20 garrafas foram vendidas a 1500 euros cada. As 75 garrafas esgotaram em seis meses, o que me levou a pensar que, afinal, o Czar poderia vir a ser um negócio, pois nunca o tinha sido em vida de meu pai e, até então, ainda não o era.

Neste ano de 2024, foi lançada uma nova edição, também Vista Alegre, neste caso uma homenagem ao meu pai. O único vinho que ele guardou saiu agora com o título “O último Czar do século XX”. É o vinho que restou de uma das barricas de 1999, a preferida dele, que deu somente para 86 garrafas. Também com gravação a ouro, de 21,3 quilates e, neste caso, em vez de serem numeradas, estão a ser personalizadas com um nome escolhido por quem as compra. Estas têm o preço de 7500 euros e já só existem 48.


Ser produtor de vinho é mais do que um negócio?

Quem for para produtor de vinho pensando, exclusivamente, em ser um negócio, irá ter pouco tempo de existência - não há regra sem exceção.

Produzir vinho é uma paixão, são momentos de partilha e de união. É algo que nos corre no sangue e que faz parte de nós, são momentos de alegria que, muitas vezes, se tornam em dor, desalento e tristeza.

Ser produtor de vinho é ter uma alma desafiante, até perante a toda poderosa natureza. Resiliência faz parte dos nossos nomes, desistir é que nunca. Para o ano vai ser melhor.

Ser produtor de vinho é uma bênção, pois somos nós que tornamos este mundo mais alegre. Como Bukowski escreveu, “Se acontece algo de mau, bebe-se para esquecer. Se acontece algo de bom, bebe-se para celebrar. Se nada acontece, bebe-se para que aconteça alguma coisa”.


Como é continuar o legado do seu pai e sempre com o nome Czar?

Dar continuidade ao legado do meu pai foi e continua a ser uma honra. É devido ao professor José Duarte Garcia que este vinho ancestral, que já foi bebido por Papas, Reis, Imperadores e Czares, hoje em dia, existe. Foi meu pai que deu manteve algo que não existe em mais nenhum lugar dos Açores, ou do mundo.

O nome Czar, vinho, não poderia desaparecer.