Estudo identifica como escolhas de consumo prejudicam espécies ameaçadas
Investigadores anunciaram esta quarta-feira estar em condições de identificar e medir o perigo oculto para a vida selvagem da importação de bens de consumo, seja beber um café expresso em Pequim ou comer uma salada de tofu em Chicago.

Autor: Lusa/Açoriano Oriental

O novo estudo, publicado na revista britânica Nature Ecology and Evolution, identificou que opções de consumidores de determinado país causam mais perdas de espécies terrestres e marítimas noutros Estados.

Os investigadores criaram um "mapa de ameaças" global que permite detalhar o impacto das exportações para os Estados Unidos, China, Japão e União Europeia (UE) nas espécies em perigo.

Para garantir o abastecimento de grãos de café ou tofu, por exemplo, foram destruídas florestas em Samatra (Indonésia) ou no Mato Grosso (Brasil), que levaram ao desaparecimento de dezenas de animais e plantas, por perda do habitat.

Um dos exemplos referidos é como a procura crescente de azeite de Portugal e Espanha pode levar ao desaparecimento do lince ibérico, devido à construção de barragens para controlar a irrigação dos terrenos.

Com base em quase sete mil espécies terrestres e marinhas ameaçadas - de acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, sigla em inglês) - os investigadores definiram "focos" de perda de biodiversidade em troca de centenas de bens e mercados distantes, o que permite conhecer onde devem ser focados os esforços de conservação.

Atualmente, 90% dos mais de seis mil milhões de dólares (5,75 mil milhões de euros) mobilizados todos os anos para a conservação de espécies são gastos dentro das nações mais ricas, onde o dinheiro é angariado.

"No entanto, estes países raramente apresentam focos de ameaça", disse um dos autores Keiichiro Kanemoto, professor da universidade japonesa Shinshu, em Matsumoto.

Cerca de 2% das ameaças a sapos considerados vulneráveis no Brasil podem ser diretamente atribuídas à extração de madeira para bens exportados para os Estados Unidos.

Do mesmo modo, a indústria madeireira na Malásia, sobretudo para exportação para a UE e China, afetou o habitat do elefante asiático, da águia-gritadeira (‘greater spotted eagle’) e do urso-malaio.

O derrube das florestas no sul do Brasil, para a produção de carne bovina, destruiu o habitat do macaco mono-carvoeiro, conhecido como muriqui.

"Identificámos focos de ameaças à biodiversidade que são predominantemente criados por um pequeno número de países", disse Kanemoto.

O trabalho "devia facilitar a colaboração direta entre produtores e consumidores", acrescentou.

Para os cientistas, encontrar novas soluções para a perda de espécies tornou-se urgente, com o desaparecimento de animais e plantas mil vezes mais rápido do que há apenas alguns séculos.

A Terra entrou num "evento de extinção em massa", que só aconteceu seis vezes nos últimos meio milhar de milhão de anos. Alguns destes eventos foram responsáveis por 95% do desaparecimento de todas as formas de vida.

As ameaças à biodiversidade não incluem o comércio ilegal de marfim de presas de elefante, ou aves raras e répteis, vendidos como animais de estimação.

No papel, muitos dos animais e plantas ameaçados estão protegidos ao abrigo da Convenção da ONU sobre Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas e Fauna e Flora Selvagens (CITES, sigla em inglês).

Mas o tráfico, no valor de 150 mil milhões de dólares (143 mil milhões de euros) por ano, destas espécies - vivas ou de determinadas partes - continua a ser muito elevado.

O estudo não considerou a influência de outros fatores como o crescimento urbano, a caça local ou as alterações climáticas.