Estudo demonstra que a retina pode facilitar diagnóstico da doença de Alzheimer
13 de jan. de 2020, 12:38
— Lusa/AO Online
“A retina poderá
funcionar como um biomarcador não invasivo relevante para o diagnóstico
precoce da doença de Alzheimer”, de acordo com um estudo inovador,
afirma a Universidade de Coimbra, numa nota enviada «e à agência Lusa.A
Alzheimer é caracterizada pela “perda gradual e irreversível de
determinadas funções cerebrais, como a memória, a atenção e a
linguagem”, representa cerca de 60 a 70% dos casos de demência, segundo a
Organização Mundial de Saúde, e o seu diagnóstico “não é fácil de
fazer”, sublinha a UC.Além de exigir
vários exames, o diagnóstico é feito, frequentemente, numa fase moderada
ou avançada da doença, havendo, por isso, “necessidade urgente de
identificar biomarcadores subclínicos que possam ajudar a diagnosticar
precocemente o início da doença e de forma confiável”.Uma
vez que a retina é um tecido do sistema nervoso central (“tem a mesma
origem embrionária que o cérebro”) e é considerada uma extensão do
cérebro, a equipa de investigadores, coordenada por Francisco Ambrósio,
explorou o conceito da “retina como um espelho ou janela para o
cérebro”, isto é – explica a UC –, “a retina pode “mostrar” o que
acontece no cérebro, no contexto de doença de Alzheimer”.Nesse
sentido, foi realizado “um estudo longitudinal, único e inovador, com
um modelo animal triplo transgénico da doença de Alzheimer (3×Tg-AD), um
murganho que possui três genes humanos com mutações associadas a esta
doença neurodegenerativa”. Foi também usado um grupo de controlo
(murganhos saudáveis).Em cada um dos
períodos de vida do modelo animal (com uma esperança média de vida de
dois anos), os investigadores efetuaram testes em que avaliaram a
estrutura e a função da retina, assim como a estrutura cerebral.Os
resultados, já publicados na Alzheimers Research & Therapy – “uma
das principais revistas internacionais” na área das neurociências e da
neurologia clínica – indicam “a existência de alterações estruturais e
funcionais na retina e alterações estruturais no córtex visual do modelo
animal 3×Tg-AD”, afirma o líder do estudo.“Estas
alterações neurais poderão ser usadas como um biomarcador adicional
para o diagnóstico precoce da doença de Alzheimer”, salienta.“Além
disso, este trabalho reforça a possibilidade de se usar o olho como uma
ferramenta adicional (de modo não invasivo) para o diagnóstico precoce e
monitorização terapêutica da doença de Alzheimer”, acrescenta, citado
pela UC, Francisco Ambrósio.Notou-se que
“a retina, até certo ponto, mimetiza o que acontece no cérebro, isto é,
no cérebro há uma redução do volume da estrutura do hipocampo (região do
cérebro associada à memória) e do córtex visual, e na retina também
ocorre uma redução da sua espessura”, explica o investigador.“Em
todas as fases estudadas [4, 8, 12 e 16 meses], observou-se uma redução
da espessura das camadas mais internas da retina, o que se correlaciona
com a redução do volume do hipocampo e do córtex visual. Esta
correlação sugere que se poderá utilizar a retina como mais uma
ferramenta para o diagnóstico precoce da doença de Alzheimer”, explicita
Francisco Ambrósio.Posteriormente, a
equipa de especialistas, constituída também por Miguel Castelo-Branco,
Rui Bernardes e Isabel Santana, realizou estudos com humanos, tendo
confirmado “a existência de algumas alterações na retina e uma
associação positiva entre as alterações no cérebro e na retina”, refere
Francisco Ambrósio.Mas, adverte, “para uma
validação robusta da possibilidade de se usar a retina como
biomarcador, é necessário aumentar o número de doentes”.Mesmo
assim, considerando que o diagnóstico precoce é crucial para um
tratamento mais eficaz da doença de Alzheimer e que o olho permite
realizar testes não invasivos, ao contrário do cérebro, “este trabalho
constitui uma abordagem bastante relevante para a prática clínica”,
sustenta.“Face aos resultados obtidos,
seria interessante que os neurologistas ponderassem a prescrição de
testes da retina, por exemplo, uma tomografia de coerência ótica (em
inglês, OCT), um exame de rotina rápido e simples e que não é muito
dispendioso, que permite avaliar a espessura das camadas da retina,
contribuindo assim para a validação do método no diagnóstico precoce da
doença de Alzheimer”, conclui o Francisco Ambrósio.Apesar
de o estudo se ter focado na Alzheimer, pode ser alargado a outras
patologias, como doença de Parkinson e escleroses múltipla e lateral
amiotrófica.O estudo foi realizado no
âmbito do projeto “Alterações cerebrais na doença de Alzheimer: a retina
como um espelho do início e progressão da doença?”, distinguido com o
Prémio Mantero Belard e Prémios Santa Casa Neurociências 2015, e é
também financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e
por fundos europeus (FEDER e COMPETE 2020).