Autor: LUSA/AO Online
O país "tem, em
relação a outros países com clima semelhante um número recorde de
ignições, da ordem das 15 mil por ano, e não sabemos bem qual a origem
destas ignições, é uma coisa que o Estado não tem conseguido diminuir",
disse em entrevista à agência Lusa Filipe Duarte Santos, professor
jubilado da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. O
especialista em alterações climáticas realçou que "o número de ignições
continua elevado e, de certo modo, incontrolado. Sempre que há um risco
elevado de incêndios florestal, se há ignições, há fogos", resumiu. O
também presidente do Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável (CNADS) falava numa altura em que as condições
meteorológicas são menos propícias a incêndios florestais, depois de as
temperaturas terem baixado. Mas,
quando ainda se tenta resolver a destruição causada pelos incêndios de
grandes dimensões deste verão, é tempo de começar a planear as ações de
prevenção dos fogos, a pensar que, com as alterações climáticas e o
aumento da frequência dos fenómenos extremos, como secas, no próximo ano
o país pode voltar a enfrentar ondas de calor. Filipe
Duarte Santos listou um conjunto de cinco fatores que mais contribuem
para os incêndios florestais e o elevado número de ignições é um deles. O
que se tem passado "é um aumento do risco meteorológico de incêndio
florestal, em particular este ano que tem sido particularmente quente e
seco, com uma seca muito prolongada, portanto o risco de incêndio tem
sido muito elevado", descreve. Por
outro lado, a ligação estreita entre a agricultura e a floresta
perdeu-se, salienta o especialista, explicando que a floresta tinha
produtos e subprodutos que eram usados na agricultura, como os matos. Com
a desertificação humana registada nas regiões do interior do país, com
as pessoas a deslocarem-se para a zona litoral ou a emigrarem, "essa
ligação perdeu-se" e, "como temos uma floresta muito fragmentada, isso
significa que a floresta perdeu muito do seu valor económico",
especificou o professor. As
alterações climáticas potenciam o risco de fogos, sobretudo com verões
muito quentes ou muito secos, o que torna os incêndios florestais "muito
mais perigosos" e, declarado o fogo, "com as condições de extrema
secura, tanto no solo como na atmosfera, atinge proporções muito grandes
e torna-se extremamente difícil o combate". A
este fator, junta-se o facto de que de Portugal "tem apostado muito
mais no combate aos incêndios do que na prevenção", acrescenta Filipe
Duarte Santos. Este
ano, Portugal registou dois conjuntos de grandes incêndios, sendo o
pior o de 15 de outubro, dia em que começaram centenas de fogos que
consumiram 190.090 hectares de floresta, quase metade (45%) da área
ardida desde janeiro, provocaram 45 mortos, cerca de 70 feridos, perto
de uma dezena dos quais em estado grave, obrigando ainda à evacuação de
localidades e ao realojamento de populações. Além
dos 43.191 hectares de floresta consumida pelas chamas, o fogo em
Oliveira do Hospital provocou ainda 12 mortos, sendo o concelho com
maior número vítimas mortais. Outra
situação grave de incêndios, em que o fogo começou a 17 de junho em
Pedrógão Grande causado, causou 64 mortos e mais de 250 feridos.