“Uma
perda de dimensões incalculáveis para a literatura portuguesa, para a
poesia, o jornalismo e o feminismo, a quem Maria Teresa Horta dedicou,
orgulhosamente, grande parte da sua vida”, pode ler-se no comunicado
enviado pela editora à Lusa.No mesmo
texto, a Dom Quixote lamenta “o desaparecimento de uma das
personalidades mais notáveis e admiráveis” da literatura portuguesa,
“reconhecida defensora dos direitos das mulheres e da liberdade, numa
altura em que nem sempre era fácil assumi-lo, autora de uma obra que
ficará para sempre na memória de várias gerações de leitores”.Em
dezembro, Maria Teresa Horta foi incluída numa lista elaborada pela
estação pública britânica BBC de 100 mulheres mais influentes e
inspiradoras de todo o mundo, que incluía artistas, ativistas, advogadas
ou cientistas.Em 2022, nos 50 anos da
obra “Novas Cartas Portuguesas”, escrita com Maria Isabel Barreno e
Maria Velho da Costa, Maria Teresa Horta afirmava, em entrevista à Lusa,
que o livro sempre foi desconsiderado em Portugal e confessava-se
“perplexa” com o interesse suscitado cinco décadas depois da publicação.“Novas
Cartas Portuguesas”, escrita por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa
Horta e Maria Velho da Costa, a partir das cartas de amor dirigidas a um
oficial francês por Mariana Alcoforado, constituiu-se como um libelo
contra a ideologia vigente no período pré-25 de Abril, que denunciava a
guerra colonial, as opressões a que as mulheres eram sujeitas, um
sistema judicial persecutório, a emigração e a violência fascista.Começou
a ser escrita em maio de 1971 e foi publicada em abril de 1972, tendo
sido banida pela ditadura e as suas autoras levadas a julgamento.O
livro que se assumiu como um marco na história do feminismo, da
literatura portuguesa, da oposição ao regime e da luta pela liberdade,
após passar o período conturbado que envolveu a sua publicação,
atravessou décadas quase como uma inexistência em Portugal, considerava,
então, Maria Teresa Horta, em declarações à Lusa, acrescentando não
compreender esta situação.“Ninguém ligou
nenhuma às ‘Novas Cartas Portuguesas’ em Portugal, agora, de repente,
enlouquece tudo”, disse à Lusa, acrescentando: “Foram escritas há tantos
anos. Depois esgotou, mas ninguém fez nada, e de repente, de súbito, de
cinco em cinco minutos falam das ‘Novas Cartas’, a pessoa fica
perplexa”. Até ao fim, as três
recusaram-se a revelar e ninguém conhece individualmente a autoria de
cada texto, como salientou à Lusa Maria Teresa Horta, que contestava uma
ideia algo difundida de que a maioria seria obra de Maria Velho da
Costa.“Foram escritas pelas três. Ninguém
vai dizer [quem escreveu cada texto]. Elas já estão mortas e eu nem
morta nem viva digo quem escreveu, porque nós fizemos uma jura”,
afirmou, em 2022.Nascida em Lisboa em
1937, Maria Teresa Horta frequentou a Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa, foi dirigente do ABC Cine-Clube, militante ativa
nos movimentos de emancipação feminina, jornalista do jornal A Capital e
dirigente da revista Mulheres.Como
escritora, estreou-se no campo da poesia em 1960, mas construiu um
percurso literário composto também por romances e contos.Com
livros editados no Brasil, em França e Itália, Maria Teresa Horta foi a
primeira mulher a exercer funções dirigentes no cineclubismo em
Portugal e é considerada um dos expoentes do feminismo da lusofonia.Foi
amplamente premiada ao longo da sua carreira literária, destacando-se,
só nos últimos anos, o Prémio Autores 2017, na categoria melhor livro de
poesia, para “Anunciações”, a Medalha de Mérito Cultural com que o
Ministério da Cultura a distinguiu em 2020, o Prémio Literário Casino da
Póvoa que ganhou em 2021 pela obra “Estranhezas”, e a condecoração, em
2022, com o grau de Grande-Oficial da Ordem da Liberdade, pelo
Presidente da República.