Erro e fadiga de piloto levam a acidente com avião da TAP no aeroporto de Lisboa em 2016
19 de mar. de 2019, 13:07
— Lusa/AO Online
Na noite
de 22 de outubro, um ATR 72, operado pela White Airways, em nome da TAP
Express, descolou do Porto para Lisboa, com 20 passageiros e quatro
tripulantes. Na aterragem, o avião sofreu danos substanciais no trem de
aterragem dianteiro, no trem principal esquerdo e em painéis da
fuselagem dianteira, após embater quatro vezes na pista, sem causar
feridos.O relatório final do Gabinete de
Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e Acidentes
Ferroviários (GPIAAF), a que a agência Lusa teve hoje acesso, aponta
como causa provável para o acidente a decisão do piloto comandante “em
prosseguir e forçar a aterragem, não cumprindo os critérios
estabelecidos (…), com velocidade [de aproximação] bem acima da
referência”.Os investigadores frisam que a
fadiga “poderá ter contribuído para o acidente ao afetar diretamente o
desempenho” do piloto comandante, de 51 anos, que, nos seis voos da
ponte aérea Lisboa/Porto (e vice-versa), realizados naquele dia, teve
sempre a seu lado uma copiloto, de 26 anos.Contactada pela Lusa, a TAP confirma que recebeu o relatório, o qual “está a ser objeto de cuidadosa análise”.O
relatório conta que a copiloto alertou o piloto comandante para a
“velocidade excessiva” na aproximação para aterragem, mas este “não
reagiu ao alerta nem seguiu o procedimento”. O GPIAAF diz que o
comandante “forçou a aeronave (com o nariz para baixo) em velocidades
acima das previamente calculadas e estabelecidas” no manual.As condições de vento aquando da aterragem “estavam dentro dos limites estabelecidos” nos manuais de voo e de operações.Segundo
o GPIAAF, “o incorreto manuseio da aeronave e deficiente técnica de
aterragem”, resultou numa aterragem 'aos saltos', e a decisão de
continuar com a aterragem após o primeiro contacto com a pista, com
velocidade do ar acima da velocidade calculada, “resultou numa conhecida
dinâmica de aterragem com danos consequentes para a aeronave”.A
investigação salienta que os pilotos conhecem o comportamento desta
aeronave na fase de aterragem, durante a qual "é imprescindível e
necessário o respeito pela velocidade de referência”.O
relatório final da investigação ao acidente refere que a tripulação
realizava a "sexta etapa" do dia entre as duas cidades, com condições
meteorológicas adversas. O primeiro voo iniciou-se às 13:00 em Lisboa,
onde o oficial das operações forneceu, no briefing inicial, os
documentos previstos para toda a operação (6 voos no total).O ATR 72 descolou do Porto para o último dos seis voos às 20:47.“A
repetibilidade das tarefas na mesma rota levou os pilotos a efetuarem
briefings parciais [incompletos] e, em alguns casos, realizados fora dos
momentos previstos nos SOPs [procedimentos padrões do operador]. Foi
ainda evidenciado cansaço em ambos os tripulantes, especialmente do
PIC/PF [piloto comandante] durante todo o voo e que se veio a traduzir
numa aparente apatia nos pós evento, levando o PIC alguns minutos a
reagir ao acidente”, explica o GPIAAF.A
investigação salienta que "foram evidenciadas falhas nos procedimentos,
provavelmente por tentativa de simplificação e precipitação de tarefas,
eventualmente por fadiga".O GPIAAF
sustenta que a frota ATR 72 operada pela White Airways voa para destinos
até cerca de duas horas, “sendo uma operação exigente e intensa na
relação horas/ciclos realizados, tanto para os equipamentos como para as
tripulações”.“Embora o período de
descanso anterior ao voo fosse adequado e o tempo de voo estivesse
dentro dos limites de tempo de voo definidos pela empresa e na
legislação, as seis pernas de voo podem ter reduzido os níveis de alerta
dos dois pilotos. O desempenho degradado da tripulação de voo é
consistente com os efeitos da fadiga. As ações e declarações do piloto
indicaram que o seu conhecimento e compreensão da técnica de recuperação
de aterragem saltada (aos saltos) da aeronave ATR 72 era insuficiente”,
concluiu a investigação.Para o GPIAAF, o
número de tripulações disponíveis bem como a alocação das mesmas, tendo
em conta as referidas rotas com alta frequência e com pernoita em muitos
dos destinos, "tornam, de facto, a operação particular e exigente para
as tripulações".“Dos dados
disponibilizados pelo operador relativos ao planeamento da operação, foi
possível constatar que as tripulações, embora sem excederem
consistentemente os tempos regulamentares, estavam sujeitas a um esforço
significativo de disponibilidade para longas jornadas de trabalho. Não
foi evidenciado pelo operador uma análise de risco à exposição
continuada das tripulações a este tipo de operação e, tendo em conta,
por exemplo, a relação hora ciclo voada, a operação continuada numa
mesma rota (LPPT-LPPR - Lisboa-Porto) ou as pernoitas fora da base”,
lê-se no relatório final do acidente.