'Encontrar ministros aceitáveis pelo PR será desafio para Meloni'
Itália/Eleições
27 de set. de 2022, 08:48
— Lusa/AO Online
Vencedor
das eleições de domingo à frente de uma coligação de direita e
extrema-direita que poderá ter a maioria dos lugares parlamentares, o
partido Irmãos de Itália "cresceu, mas a classe dominante permaneceu a
mesma do que quando pesava 1%” dos votos", disse à Lusa Francesco Costa,
diretor do site de notícias Il Post e especialista em política
internacional."É uma liderança idosa e
tenho certeza que Meloni vai procurar técnicos da área, professores
universitários, para tentar construir as bases para governar", adiantou.Ligada
a partidos da direita radical europeia como o espanhol Vox, a formação
de Meloni tornou-se, após as eleições de domingo, o primeiro partido
italiano, com cerca de 26% dos votos e dispondo de uma maioria para
formar Governo, juntamente com os aliados Liga (extrema-direita) e Força
Itália (direita). De acordo com a
constituição italiana, é o Presidente da República que, depois de ouvir
os partidos, indigita o primeiro-ministro e os ministros. Em
2018, quando a Liga - de Matteo Salvini, parceiro de Meloni na atual
aliança - e o Movimento 5 Estrelas formavam governo e propuseram a
Sergio Mattarella, atual presidente, Paolo Savona para Ministro da
Economia, este foi considerado "muito anti-europeu" e rejeitado."Mattarella
não vai aceitar qualquer pessoa, só vai ter em consideração nomes que
possam dar garantias à Europa", disse à Lusa Claudia Fusani, jornalista
política do Riformista, um jornal de centro-esquerda.Quando
se apresentou pela primeira vez nas eleições de 2013, o partido de
Meloni teve 2% dos votos, crescendo continuamente desde então, até 6,4%
em 2019 e superando depois os 20 por cento, no mesmo período em que a
Liga, com quem disputa o eleitorado radical de direita, passou de 17%
para 9%.Guido Crosetto, membro fundador do
Irmãos de Itália e geralmente considerado elemento de uma ala menos
radical do partido, declarou recentemente num programa televisivo que
não teria problemas se, pelo menos nas primeiras semanas, Meloni
trabalhasse com o presidente Mario Draghi. “A
lei orçamental deve ser enviada a Bruxelas em 16 de outubro, e o novo
governo vai ter só um dia para elaborá-la. Por isso, acredito que
devemos trabalhar num diálogo entre o antigo governo e os novos eleitos,
juntos”, disse Crosetto. Claudia Fusani
considera que estas declarações são "uma indicação do facto de que
dentro dos Irmãos da Itália há uma parte que encarna uma direita moderna
e outra que olha para o passado". "Giorgia
Meloni também agradeceu [no seu discurso de vitória] aos falecidos, 'às
pessoas que já não estão aqui' e que 'gostariam de ver este dia' e não
se pode deixar de pensar que essas palavras foram para os líderes dos
partidos dos quais o Irmãos de Itália nasceu e que se inspiraram no
pós-fascismo”, adiantou Fusani. "O facto
de os primeiros líderes que saudaram Giorgia Meloni terem sido [o
primeiro-ministro húngaro, Viktor] Orban e [a líder da Frente Nacional
francesa, Marine] Le Pen diz muito sobre o que nos espera", diz Fusani.Segundo
Costa, este é um "período delicado em que a Itália não pode dar-se ao
luxo de romper com a França e a Alemanha", mas existe um risco de o
próximo governo italiano derivar para rumos mais radicais. "Com
base no que sabemos de Giorgia Meloni, devemos esperar um governo muito
mais próximo de Orban e Le Pen, mas na campanha eleitoral vimos no PNR
[plano de reformas aprovado por Bruxelas], na Ucrânia, na
responsabilidade, a sua vontade de apresentar uma direção mais moderada
do que a história do seu partido”, adiantou Costa. Do
lado oposto, o resultado da coligação de centro-esquerda liderada pelo
Partido Democratico - apenas 19% dos votos, cerca de metade de Meloni e
aliados - revela a incapacidade do seu candidato, Enrico Letta, apelar
ao voto anti-direita.O Movimento 5
Estrelas (M5S) teve cerca de 15%, depois de ter sido o único a defender a
manutenção do "rendimento de cidadania", segundo sublinhou Costa.“Todas
as partes prometeram rever, modificar, cancelar [o rendimento mínimo]. O
único partido que no programa teve a intenção de deixá-lo como estava
foi o Movimento 5 Estrelas que ganhou muito no sul, demonstrando como
essa medida é considerada fundamental por grande parte da população",
apontou o analista. A Campania (a região
de Nápoles) é o território italiano onde há mais pessoas que recebem
este rendimento (850 mil pessoas de um total de 5,5 milhões de
habitantes, segundo dados oficiais), e aqui nalguns círculos eleitorais o
M5S chegou a ter 40% dos votos, "uma indicação clara do quanto a
questão do rendimento pesou principalmente entre as camadas mais
pobres", adiantou Costa.