Encenação de "Os Passos em Volta" de Herberto Helder pela primeira vez em palco
Sábado, dia 8 junho
7 de jun. de 2019, 19:15
— Lusa/AO Online
Com interpretação de João Lagarto, David
Pereira Bastos, Duarte Melo e Lara Guidetti ou Beatriz Godinho, a peça é
uma adaptação de João Garcia Miguel da obra “Os Passos em Volta”, de
Herberto Helder, em que os textos do poeta "são um pretexto para a
perceção de um eu que tem um corpo, que sente, que procura Deus, o amor,
que busca transcender-se”, lê-se na sinopse do espetáculo.À
agência Lusa, João Garcia Miguel admitiu que se pega num texto de
Herberto Helder “por necessidade de se falar sobre aquilo que é escrito
por outros portugueses, por gente que vive coisas parecidas", mas
também, “provavelmente, por alguma burrice, porque é um texto difícil”.“Escolhemos,
especificamente, 'Os Passos em Volta', por ser um texto que tem uma
dimensão teatral mais interessante e tem uma dimensão poética que me
interessa bastante, e nos obriga a nós, e ao público, a olhar para nós”,
esclareceu João Garcia Miguel.O encenador
assume o papel de “continuador” do trabalho do poeta, transpondo-o
“para a forma teatral, e pensando também que o teatro é uma forma de
poesia e que nos coloca em causa pela sua estranheza e pela sua
incompreensão”.Na preparação do espetáculo
foram feitos 'workshops', que permitiram “ir trabalhando o texto e ir
trabalhando 'o' Herberto com um conjunto muito alargado de pessoas”, num
esforço de agregar “outros agentes, intérpretes e atores”, dando a
conhecer, simultaneamente, o trabalho da companhia, explicou.“Neste
caso, os 'workshops'" sobre Herberto Helder "funcionaram sempre como
uma forma de perceber a dimensão poética do texto e as infinitas
possibilidades de o ler e de o perceber. Claro que não esgotámos os
sentidos do texto, mas ajudou-nos a ir percebendo, a ir antecipando e a
fazer um trabalho de relação com o universo da poesia que, depois, de
uma forma um pouco subtil e provavelmente não fechada, acaba por ser
trazida para o trabalho com os atores”.Este
é, também, “um espetáculo sobre o teatro e aqueles que dedicam a sua
vida à poesia feita através dos seus corpos”, deixa antever a descrição
da peça.“Nesta peça, o teatro, também ele,
é posto em causa, no sentido de não haver aquilo que é a ideia de um
personagem no sentido mais tradicional ou mais clássico, e de haver uma
relação com o espaço, com o tempo. O próprio personagem da Lara
[Guidetti], que é uma personagem que não tem texto, mas que, no fundo,
faz parte do imaginário da poética do Herberto… Ela vem como a ideia da
mulher, a mãe, a esposa, a prostituta, as várias mulheres, no sentido
dos arquétipos – a própria 'mitologia das pessoas', como ele próprio
[Herberto Helder] diz”, afirmou o encenador.Bailarina
de formação, mas com uma vasta experiência em teatro físico, Lara
Guidetti afirmou que é na “busca pela liberdade” que estabelece “uma
relação com a poesia” e que, ao “saltar para as palavras e para as
imagens”, por vezes, “está em sintonia com o texto”. O
trabalho corporal estende-se, contudo, a todo o elenco, “há uma coisa
que é transversal a tudo isto: seja qual for a linguagem pessoal de cada
um, há qualquer coisa que se procura, que tem a ver com uma
intensidade, normalmente, e com uma qualidade no trabalho do corpo, que
alimente uma linguagem cénica, que é plástica e é muito visual”,
conforme explicou David Pereira Bastos.O
ator adiantou ainda que, no esforço de tradução de um texto poético para
uma linguagem corporal, “procuram-se lógicas extra quotidianas, fora de
uma representação figurativa e realista”.“É
dentro de uma zona de representação mais, se calhar, expressionista e
não figurativa, muitas vezes abstrata, em que o corpo procura falar,
quer a partir dos conteúdos que estão no texto, quer no sentido de os
alimentar”, prosseguiu.A antestreia de
“Passos em Volta” acontece este sábado, às 21:30, no Arquipélago –
Centro de Artes Contemporâneas, na Ribeira Grande, numa encenação “que
parece ser muito inesperada, apropriada e dedicada a este espaço - toda
ela vai parecer ter um dimensão muito industrial ou tecnológica, mas
que, na verdade, é uma coisa muito relacionada com um certo despir, uma
certa simplicidade”, concretizou o encenador da peça.Para
as apresentações já agendadas para Lisboa, de 19 a 22 e de 26 a 29 de
junho, no Teatro Ibérico, “a peça tem uma cenografia diferente”, mas
mantém-se a poesia de Herberto Helder e a “mestria do trabalho deles
[atores], a capacidade de fazerem imaginar outras coisas”, disse ainda
João Garcia Miguel.