Emmanuel Macron "fragilizado" na vitória pode perder maioria nas legislativas
26 de abr. de 2022, 10:56
— Lusa/AO Online
"Só
quatro em cada seis eleitores de Emmanuel Macron o escolheram por
convicção, o resto votou nele para fazer barreira a Marine Le Pen,
portanto há uma grande fragilidade no seio do apoio ao Presidente e vai
colocar problemas de legitimidade e adesão nos próximos meses e anos",
disse Benjamin Morel, constitucionalista na universidade Paris 2
Panthéon-Assas e politólogo, em declarações à Agência Lusa.Tendo
obtido 58,55% dos votos face a Marine Le Pen, Emmanuel Macron foi
ajudado nas urnas pela chamada 'frente republicana' que tem funcionado
desde 2002, primeira eleição em que a extrema-direita passou à segunda
volta. Esta frente republicana consiste nos eleitores dos outros
candidatos que ficaram pela primeira volta, neste caso, muitos eleitores
vindos da esquerda.O facto de nos últimos
cinco anos ter havido uma erosão dos apoiantes de Emmanuel Macron e de
ele ter agora uma dívida política para com outros eleitorados, pode
prejudicar as suas ambições nas legislativas, que se realizam já a 12 e
19 de junho, de manter uma maioria na Assembleia Nacional."Tendo
em vista as legislativas, se ele falar já muito ao eleitorado dos
extremos, pode perder os seus leitores de base, mais ao centro, que
constituem a sua força em termos de mobilização. A maioria está muito
mal implementada localmente, portanto, se concorrerem contra autarcas
bem implementados e houver muita abstenção, podem perder", indicou o
politólogo.Em 2017, logo após ganhar as
eleições presidenciais, Emmanuel Macron conseguiu também uma maioria na
Assembleia Nacional com o seu partido República em Marcha, trazendo para
a política novas caras. Se, por um lado,
esta maioria lhe deu uma margem de manobra confortável para levar a cabo
as reformas que considerou essenciais no país, essa vitória acabou por
não se traduzir nas eleições municipais de 2020, onde o partido não
ganhou nenhuma das grandes cidades em França. Jean-Luc
Mélenchon já veio chamar às legislativas "a terceira volta das
presidenciais", pedindo para ser eleito primeiro-ministro, mas há também
os socialistas à esquerda e os Republicanos à direita que esperam
aumentar o número de eleitos."Há uma
ameaça que vem dos partidos tradicionais que localmente estão bem
implementados e que podem ganhar mandatos nestas eleições", explicou
Benjamin Morel.A postura do Presidente nas
próximas semanas pode influenciar a eleição dos deputados, com Virginie
Martin, professora da Kedge Business School, a considerar que, por
enquanto, ainda não há grandes mudanças no que diz respeito ao mandato
anterior."Emmanuel Macron pode mudar, mas
por enquanto ainda não vimos sinais disso. Ele não faz grandes esforços,
com a sua equipa a defender que as pessoas aderiram ao seu projeto,
quando sabemos bem que muitos dos votos vêm da frente republicana e que
não é um cheque em branco. Pelas suas atitudes, parece que é isso que
ele pensa", disse a politóloga.Ouvir as
pessoas, integrar algumas medidas de mais participação democrática como
introduzir o referendos de iniciativa cidadã e encontrar-se mais com os
cidadãos são algumas das estratégias possíveis para os próximos cinco
anos, segundo Virginie Martin, de modo a atrair para o seu lado também
os eleitores de Marine Le Pen."Desde os
anos 90 que ninguém ao nível político ouve os pobres de França que votam
na extrema-direita. É mais fácil chamá-los de fascistas do que conhecer
os seus problemas de fundo. Emmanuel Macron pode ser mais empático com
as pessoas, mas há uma matriz tecno-liberal e europeísta que não encaixa
nesse eleitorado", declarou a académica.Neste
âmbito, a política levada a cabo por Marine Le Pen mostra-se cada vez
mais eficaz, já que mesmo perdendo, a candidata da extrema-direita
conseguiu a maior percentagem de sempre de votos para o seu partido."A
principal força de Marine Le Pen é que ela tem um esquema político que é
eficaz, uma ideologia social e identitária que fala a uma grande parte
do eleitorado e ela é uma das únicas figuras que possui isto. Jean-Luc
Meélenchon não tem esta questão identitária e Eric Zémmour não tem a
parte social, portanto ela tem um espaço político muito importante",
indicou Benjamin Morel.No entanto, tem também as suas limitações que podem ficar ainda mais visíveis durante as eleições legislativas."O
partido União Nacional é um partido fragilizado. Desde logo devido à
saída dos seus quadros mais qualificados para o partido de Eric Zémmour e
também por razões financeiras, onde não há dinheiro. Se fizer um mau
resultado nas legislativas, não vai conseguir continuar a financiar-se",
concluiu o politólogo.O centrista
Emmanuel Macron foi no domingo reeleito Presidente de França, obtendo
58,55% dos votos na segunda volta das eleições, contra 41,45% de Marine
Le Pen, a candidata de extrema-direita, segundo resultados oficiais
definitivos divulgados pelo Ministério do Interior francês.Em
2017, a primeira vez que os dois se enfrentaram nas eleições
presidenciais, Emmanuel Macron venceu com 66,10% dos votos, contra
33,90% de Marine Le Pen, ou seja com uma vantagem significativamente
mais clara do que nas eleições de domingo.