Edição 9.5 do festival açoriano Walk & Talk arranca hoje
9 de jul. de 2020, 10:08
— LUSA/AO Online
Quando, em março, a pandemia de covid-19 pôs
um ponto de interrogação sobre a possibilidade de realização do Walk
& Talk, a equipa cedo se apercebeu que “não fazia sentido, quase dez
anos depois, ele deixar de existir”, explicou Jesse James, codiretor
artístico do festival de arte.E não fazia
sentido porque “o festival vem deste lugar de resiliência: começou, em
2011, num contexto de crise (…). Até por uma questão de responsabilidade
e de atitude, ele tinha que existir”, frisou o responsável.Com
quatro meses para encontrar soluções, e vendo que, numa “primeira
reação a este contexto”, a cultura reagiu com “uma digitalização dos
processos de programação”, começaram a preparação, num “espaço de
assembleia”, para o qual convocaram os artistas e toda a equipa que faz o
festival.“Sentimos necessidade de
encontrar equilíbrio entre essa necessidade de nos imaterializarmos e
virarmo-nos para o digital, com encontrar estratégias para nos mantermos
presentes no território, no espaço e de criarmos lógicas de relação
entre pessoas”, adiantou o organizador.Dessa
necessidade, surgiu a 9.5, edição que arranca hoje e ocupa, de maneira
diferente, o espaço físico de São Miguel, alastrando-se para uma
“não-geografia”, que consegue chegar a toda a gente”, afirma a
codiretora artística, Sofia Carolina Botelho.Para
isso, o festival que tinha como ‘casa’ o pavilhão W&T, serve-se
agora de uma plataforma (acessível em www.9.5.walktalkazores.org), que
reúne projetos, eventos e atividades artísticas, muitos deles
concretizados ‘on-site’ (no local), em São Miguel, e que dá também
acesso à “Rádio 9.5”, emitida em F.M. e 'online' a partir de Ponta
Delgada.Pensar este ‘site’ “é pensar no
pavilhão, para as dinâmicas de um pavilhão que é um ponto de encontro,
de troca, de discussão”, numa plataforma que “engloba isso tudo de certa
forma” e, em termos de dinâmica, “não deixa de ser interessante, na
medida em que abre possibilidades que chegam a outras geografias”,
considerou a responsável.“Estamos há dez
anos a falar sobre espaço público, a falar sobre como é que movemos
ideias entre geografias, como é que nos relacionamos enquanto geografia,
dita periférica, com outros contextos centrais, e estamos sempre a
reequacionar essas relações entre esses lugares”, concretizou Jesse
James.Para o responsável, a “plataforma é
ótima” porque cria um “espaço que agrega os trabalhos desses artistas,
mas que, ao mesmo tempo, funciona como um ponto de partida para um
entendimento desses mesmos projetos no ‘online’, mas com relação com o
‘on-site’, porque esses projetos estão no ‘online’, mas vão continuar,
vão-se estender na paisagem”.“Aqueles que
estão em São Miguel, neste caso, são os grandes privilegiados, porque
são os que conseguem ter acesso à obra completa, ou à extensão das
obras”, atirou.O codiretor artístico
lembra que nem “todas as pessoas têm computador e acesso à Internet” e
considera que “a questão do espaço público tem sempre essa vantagem: ser
um lugar que é, efetivamente, acessível a qualquer pessoa que se
desloca na cidade” de Ponta Delgada.Em
tempo de restrições, também no local foi preciso inovar nos formatos,
“brincar com os sentidos”, como apontou Sofia Carolina Botelho.“Essa
lógica de uma obra de arte no espaço altera-te a tua visão dele, a
forma como tu o lês, de alguma forma. Agora, o interesse é que essa
obra, que associamos, geralmente a uma coisa tridimensional, pode ser um
som, ou um cheiro”, referiu.Apesar do
formato híbrido, a direção optou por conservar a estrutura do festival,
mantendo, assim, o Circuito Performativo, onde se encontram projetos de
música, dança e performance, o Circuito Conhecimento, com conversas em
formato 'podcast' e a Escola de Verão para jovens da região, e o
Circuito Ilha, que terá a apresentação de instalações, 'performances',
exibição de vídeos e distribuição de 'mail art' em vários locais de São
Miguel.Num “ano de transição”, o “9.5 vai
servir para imaginar novas edições”, refere a direção, que espera
realizar a décima em 2021, com mais presença física, até porque “há
muitas coisas que começam a ganhar corpo este ano, mas que continuam
para o próximo ano”.Nos meses que
anteciparam o arranque do festival, foram vários os artistas com
projetos “que tinham começado a ser pensados numa perspetiva mais
digital, mas começaram a ganhar corpo e a existir mais ‘on-site’”,
contou Jesse James.Os projetos são
conceptualizados pelos artistas, mas executados pela equipa de cerca de
20 pessoas que o Walk & Talk tem em São Miguel.O
codiretor destacou a “relação de confiança que se reforça entre os
artistas e os produtores, os técnicos, equipas de comunicação, equipas
de projetos educativos”, entre outros.Já
Sofia Carolina Botelho salientou o desafio de pensar um projeto,
“enquanto artista, sabendo de antemão que não se vai pôr a mão nele”.“Confiança”
e “colaboração” estão no centro da realização desta edição híbrida, que
conta com nomes como Abbas Akhavan, Alice dos Reis, Atelier Brum +
Atelier Caldeiras, Diogo Lima, Margarida Fragueiro, Nádia Belerique,
Pedro Maia, Sofia Caetano e Elliot Sheedy, entre muitos outros.