Difícil acesso a crédito à habitação não se deve aos bancos
15 de out. de 2024, 14:46
— Lusa/AO Online
O presidente
da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Vítor Bento, falou com a Lusa a
propósito da conferência que assinala os 40 anos da APB (fundada
em outubro de 1984), dedicada ao papel da banca no desenvolvimento
económico e social, tendo o gestor destacando a importância da banca no
acesso à habitação própria em Portugal."Se
não fosse o crédito bancário, grande parte das famílias não tinha tido
acesso à habitação. Estimo que cerca de dois terços das famílias em
Portugal têm habitação da qual são proprietárias devido ao crédito
bancário", disse o presidente da APB, acrescentando que as taxas de juro
deste crédito em Portugal foram, nos últimos 20 anos, mais baixas do
que a média da zona euro.Sobre as
dificuldades sentidas por muitas famílias em acederem a crédito à
habitação, Vítor Bento disse que isso se deve a fatores exógenos (preço
das casas, rendimentos) e não por restrição dos bancos."O
acesso é até bastante fácil. As dificuldades que as pessoas sentem são
exteriores às condições do crédito, não têm dificuldade no acesso ao
crédito naquilo que depende dos bancos. É do interesse dos bancos
conceder o maior volume de crédito possível, desde que esse crédito seja
seguro", afirmou.Quanto à garantia
pública que o Estado prestará para jovens acederem ao crédito à
habitação, que deverá estar operacional no final do ano, Vítor Bento
considerou que a extensão do impacto da medida dependerá de várias
variáveis, designadamente da adesão.Sobre a
posição do Banco de Portugal sobre esta medida, que tem alertado para
cautela, disse compreender as duas perspetivas, a do Governo, que quer
apoiar essa população, e a do Banco de Portugal, que quer assegurar a
qualidade dos empréstimos e resiliência dos bancos, mas anteviu que
serão "reconciliáveis".Ainda à Lusa, Vítor
Bento rejeitou a ideia de que os bancos têm tido elevados lucros,
afirmando que não se pode olhar só para lucros em valor absoluto e que
"só em 2023 a rendibilidade do setor foi ligeiramente superior" à
rendibilidade média das grandes empresas dos setores não financeiros."Na
questão dos lucros, que é um tema muito falado, as coisas têm que ser
vistas em perspetiva. Quem fala dos lucros está a ver os valores
absolutos, mas não faz comparação com outros setores nem com o volume de
capital que é necessário para gerar esses lucros. O setor da banca é,
enquanto setor, o que mais capital tem aplicado na sua atividade, cerca
de 40 mil milhões de euros", referiu.Os
reguladores e supervisores bancários têm vindo a alertar os bancos para
usarem parte dos atuais lucros para aumentar as ‘almofadas de capital'
e, assim, estarem mais bem preparados para futuras crises. Questionado
sobre se os bancos estão a distribuir lucros acima do que deveriam,
Vítor Bento rejeitou essa ideia e recordou os elevados níveis de capital
dos bancos portugueses.Quanto à medida
recentemente tomada pelo Banco de Portugal de obrigar os bancos ao
reforço de 'almofadas de capital' (pela constituição de uma reserva
contracíclica em 2026), o presidente da APB disse que do "ponto de vista
estritamente financeiro é acomodável", mas que "quanto mais capital
ficar imobilizado nos bancos, mais os bancos precisam de ser mais
rentáveis para conseguir atrair capital de investidores", pelo que
defendeu um equilíbrio."É esse equilíbrio
que terá que ser procurado entre aquilo que é razoável na exigência dos
rácios de capital e quanto é que é a rendibilidade necessária para
assegurar essa sustentabilidade", disse.Vítor
Bento considerou ainda que a banca é um setor com "excesso de
fiscalidade", afirmando que com isso "os bancos que criam emprego em
Portugal têm desvantagem [competitiva] face aos bancos que criam emprego
lá fora" ainda que operem em Portugal.A
proposta do Orçamento do Estado para 2025 mantém a contribuição sobre o
setor bancário, estimando arrecadar 210 milhões de euros, e o imposto
adicional de solidariedade, mais 40,8 milhões de euros. Há duas semanas,
o Ministério Público pediu ao Tribunal Constitucional a declaração de
inconstitucionalidade deste imposto adicional, depois de três decisões
do Tribunal Constitucional nesse sentido. Para
Vítor Bento, as decisões do Tribunal Constitucional sustentam a posição
da APB "de que não há sustentação racional e razoável para a manutenção
desse adicional que foi criado num momento muito especial, quando
vivemos a pandemia".A proposta orçamental
inclui ainda uma descida da taxa do IRC (imposto sobre lucro das
empresas) dos atuais 21% para 20%, o que tem impacto sobretudo em
grandes empresas como bancos.A APB é a
associação que representa as empresas do setor bancário. Foi criada em
17 de outubro de 1984 para defender os interesses dos seus associados,
sendo seus sócios os principais bancos que operam em Portugal. Dos
bancos fundadores da APB, há 40 anos, vários já desapareceram, caso do
Banco Espírito Santo (BES), ou foram comprados e fundidos noutros, caso
do Banco Totta & Açores. Atualmente tem 26 sócios, incluindo Caixa
Geral de Depósitos, BCP, Novo Banco, Santander, BPI, Montepio, Crédito
Agrícola.A APB assinala os seus 40
anos com uma conferência em Lisboa sobre 'O papel da banca no
desenvolvimento económico-social', que conta com a presença do ministro
das Finanças, Miranda Sarmento.