Defesa de lesados critica providência, advogados entre o apoio e o silêncio
BES/GES
23 de set. de 2022, 08:31
— Lusa/AO Online
Confrontado
com o documento que deu entrada no Supremo Tribunal de Justiça (STJ)
pela defesa dos cidadãos suíços Etienne Alexandre Cadosch e Michel
Charles Creton, o advogado de cerca de 1.600 lesados do BES criticou a
apresentação desta providência cautelar que visa o Conselho Superior da
Magistratura (CSM) e tem caráter urgente para a suspensão da eficácia
destes atos administrativos do órgão de gestão e disciplina dos juízes.“A
justiça não tem rosto nem tem nomes. As vítimas em nenhum momento
usaram a estratégia de pedir a substituição de quem quer que seja: desde
os procuradores, ao juiz Carlos Alexandre, ao juiz Ivo Rosa e agora ao
juiz Pedro Correia. Todos nós, cidadãos e profissionais da justiça,
temos de dignificar o sistema judicial porque, bom ou mau, é o que
temos”, afirmou à Lusa o advogado Nuno Silva Vieira. Por
sua vez, o advogado Raul Soares da Veiga, que representa o antigo
administrador financeiro do BES Amílcar Morais Pires, acusado de 25
crimes (associação criminosa, corrupção passiva, burla qualificada,
branqueamento, infidelidade, falsificação de documento e manipulação de
mercado), expressou à Lusa a sua concordância com a apresentação da
providência cautelar para tentar reverter a substituição de Ivo Rosa
pelo juiz Pedro Correia, sem querer fazer mais comentários.Já
o advogado Artur Marques, mandatário do ex-diretor da sucursal do BES
na Madeira João Silva, a quem são imputados dois crimes de falsificação
de documento, (em coautoria com Ricardo Salgado e Paulo Nacif Jorge),
manifestou a sua crença numa decisão sobre a providência cautelar num
prazo curto e que não ultrapassa os 15 dias.Segundo
Artur Marques, existe um incómodo perante a forma como se efetuou a
substituição do magistrado, por esta configurar uma aparente violação do
princípio do juiz natural, ao lembrar que este princípio está previsto e
consagrado na Constituição. Por isso, admitiu que a questão agora
levantada possa vir a dar origem a futuros recursos da defesa junto do
Tribunal Constitucional competente para apreciar tal matéria.A
Lusa contactou ainda os advogados Francisco Proença de Carvalho – que
representa Ricardo Salgado -, Rui Patrício – mandatário de José Espírito
Santo Silva – e Paulo Saragoça da Mata – que tem a seu cargo a defesa
de João Martins Pereira e Paulo Nacif Jorge -, mas todos não quiseram
comentar a providência cautelar assinada pelos colegas Tiago Rodrigues
Bastos, Filipa Elias e João Gaspar Simões.Em
causa estão as decisões do CSM no âmbito do movimento judicial
ordinário, efetivado este mês, que consagrou a promoção do juiz Ivo Rosa
à Relação de Lisboa - embora suspensa devido ao processo disciplinar -,
a afetação do lugar de Juiz 2 do Tribunal Central de Instrução Criminal
(TCIC) a Artur Cordeiro - que está em comissão de serviço como
presidente da Comarca de Lisboa - e, por fim, a substituição pelo juiz
Pedro Correia, um dos magistrados que entrou para o TCIC e que tem
quatro anos de experiência.“Os requerentes
pretendem, no caso concreto, que o lugar de Juiz 2 seja mantido pelo
Dr. Ivo Rosa, até que se resolva o processo disciplinar e, depois, a
questão da promoção”, indicaram os advogados, acrescentando: “O processo
mais mediático e complexo de Portugal beneficiará da continuação, sem
sobressalto e alarme, quanto à legitimidade do decisor”.Etienne
Cadosch é acusado de 18 crimes (entre os quais associação criminosa,
corrupção passiva no setor privado, burla qualificada, branqueamento,
falsificação de documento, infidelidade e manipulação de mercado),
enquanto Michel Creton responde por 17 crimes (associação criminosa,
burla qualificada, branqueamento, falsificação de documento,
infidelidade e manipulação de mercado).O
processo BES/GES contava inicialmente com 30 arguidos (23 pessoas e sete
empresas), mas restam agora 26 arguidos: 23 pessoas e três empresas. Considerado
um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, este caso
agrega no processo principal 242 inquéritos e queixas de mais de 300
pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no
estrangeiro. Segundo o Ministério Público, a derrocada do Grupo
Espírito Santo (GES), em 2014, terá causado prejuízos superiores a 11,8
mil milhões de euros.